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Advogados veem racismo recreativo em fala de Bruna e cobram ação da Globo

BBB 23: Bruna Griphao foi acusada de racismo por fala - Reprodução/Globoplay
BBB 23: Bruna Griphao foi acusada de racismo por fala Imagem: Reprodução/Globoplay

João Vieira

Colaboração para Splash, em São Paulo

06/04/2023 13h20Atualizada em 06/04/2023 19h59

As falas de Bruna Griphao pouco antes do Jogo da Discórdia desta segunda (3) reacenderam o debate sobre racismo no BBB 23 (Globo). Nas redes, parte do público acusa a atriz de ter feito rimas preconceituosas contra Sarah Aline, com quem Griphao teria um embate na dinâmica daquela mesma noite. A polêmica fez com que a equipe da psicóloga se posicionasse e investigasse o caso.

Splash procurou, na tarde desta quarta-feira (5), o advogado criminal Patrick Berriel, representante de Bruna, pedindo posicionamento sobre o caso. Ele enviou texto que, na noite do mesmo dia, foi publicado por Kakau Orphao, pai da atriz, nas redes sociais, e republicado nesta tarde. (leia a íntegra ao final da nota).

As frases pronunciadas pela participante Bruna Griphao na segunda-feira, dia 03/04, deixaram claro tratar-se de rimas, sendo certo que foram ditas sem conotação racista e muito menos apontando a qualquer um dos jogadores do reality. Distante de qualquer ofensa discriminatória.
Equipe de Bruna Griphao

Tanto no Jogo da Discórdia, quanto em outros momentos durante a última semana, Bruna se referiu à Sarah como a participante que teria o jogo mais confortável da casa. Na fala criticada, a atriz diz que "aqui, se você tá confortável, come uma banana. Quando tá desconfortável, todo mundo espana". Outra parte do público, porém, afirmou que Bruna não falava sobre Sarah (ela não diz o nome da psicóloga), mas sim sobre Ricardo, que também é negro.

Splash ouviu o advogado e presidente da Associação Nacional de Advocacia Negra (ANAN) Estevão Silva, que apontou que as falas de Bruna podem ser enquadradas como racismo recreativo. A prática passou a ser considerada criminosa a partir de 13 de janeiro deste ano, quando o presidente Lula sancionou a Lei 14.532.

"Bem resumidamente, racismo recreativo ocorre quando alguém usa de termos em atos recreativos como piadas, gestos, desenhos e outras formas de recreação, contendo elementos racistas ou discriminatórios. O professor Adilson Moreira explica muito bem em seu livro da seguinte forma: 'Os argumentos mencionados anteriormente estão baseados na noção de que as mensagens em questão expressam uma intenção cômica e que o humor não pode ser interpretado como racismo, porque tem um caráter recreativo. Eles alegam que o incidente não deve ser classificado como racista porque o agente teve apenas a intenção de dizer algo engraçado ou produzir um efeito cômico, o que não revela hostilidade em relação a membros de minorias raciais'", diz ele.

A atitude da BBB Bruna Griphao é inaceitável, há muito tempo o movimento negro vem defendendo a criminalização das falas racistas mesmo que em caráter de brincadeira, porque brincadeiras também ofendem e machucam, sendo assim não é um assunto novo em debate
Estevão Silva

O advogado explica que Bruna pode ser responsabilizada pelas falas, inclusive por espectadores do programa, uma vez que a rima pode ferir a dignidade de um coletivo.

"É preciso entender a quem a sra. Bruna dirigiu a ofensa (brincadeira). Em um primeiro momento, a pessoa a quem foi dirigida a ofensa é a primeira vítima, sendo assim detentora dos direitos indenizatórios pela ofensa sofrida. Mas nada impede que outras pessoas que também se sentiram ofendidas ingressem com demandas coletivas. Quando ocorre uma agressão aos direitos difusos e/ou coletivos, é possível que entidades representantes do povo ingressem com ações desta natureza, a Educafro e outras instituições de representação do movimento negro têm ingressado bastante com esses tipos ações pedindo a punição das agressões a direitos difusos e coletivos", explica.

Na mesma linha, a advogada Driele Floriano, também ouvida pela reportagem, acredita que a problemática das falas de Bruna não pode ser enxergada de maneira isolada.

"No Brasil até 1888 os negros eram escravizados e considerados inferiores, sem nenhuma ação positiva quando houve abolição para reparar essa barbárie e construir uma sociedade igualitária para toda a população. Assim, manifestações como a da Bruna se revelam em frases racistas sim, em razão do enraizamento de atitudes de discriminação contra a população preta brasileira, mesmo quando não houve a intenção de ofender ou reduzir em razão da sua cor", diz ela.

Em uma análise mais aguçada, vale dizer que a ofensa não agride apenas a pessoa em si, mas toda a coletividade que se identifica como preta, que na hipótese não caberia a interpretação de atos, como tentou fazer a equipe da Bruna, frise-se uma mulher branca que não tem lugar de fala quando o assunto é sentir-se ofendido ou não.
Driele Floriano

Driele concorda que o uso recreativo de um termo potencialmente preconceituoso não afasta sua associação ao racismo.

"Eu entendo que a militância tem o intuito não só de evitar a prática do racismo individual e suas consequências, mas que haja uma sociedade de fato igualitária, onde com a utilização de verbetes culturalmente utilizados como zombaria, humilhação e etc., de forma recreativa não afasta a sua associação com a continuidade de perpetuação de frases racistas e a conotação de inferioridade que a mesma se reveste", diz ela.

"Contudo, não é só compreender a questão e impacto social que o racismo tem, mas sim de apropriar-se de uma cultura avessa, que busca extirpar totalmente sua pratica em todos os níveis e como ele se apresenta, incluindo as brincadeiras que ressoam muitas vezes como não lesivas, mas que tem o condão de permanecer viva sua natureza, em termos, não basta não ser racista é indispensável ser antirracista, ou seja, fiscalizar cada ato, atitude velada que externada contribuí com continuidade da desigualdade em função da cor da pele".

Globo não pode se omitir

Para Estevão, a Globo, responsável por produzir e veicular o BBB 23, não pode se omitir sobre o caso, correndo o risco de ser responsabilizada. A emissora não transmitiu as falas de Bruna no programa da TV aberta, nem comentou o caso.

"A emissora Globo pode ser responder objetivamente, independente da culpa, pelos crimes ocorridos nas dependências de seu estabelecimento. Ao não se posicionar, punir os autores, a rede Globo assume ainda mais uma posição de partícipe no crime. Infelizmente, o movimento negro ainda não tem tanta força a ponto de exigir que a lei seja cumprida como o ocorreu com os dois participantes que foram 'expulsos'. Como demonstrado, o crime cometido pela participante é inconteste, existe uma farta doutrina, legislação que, ao ser aplicada, exige a punição da participante. Desconheço o contrato dos participantes, o que pode e o que não pode, mas a participante precisa ser repreendida", afirma.

Driele concorda e acredita que a empresa deveria alertar Bruna sobre sua prática. "A Globo como um veículo de comunicação de alcance elevado, tem por obrigação fazer parte da cultura antirracista, assim, compreendo e julgo necessário que seja reforçada a questão do racismo recreativo aos participantes, alertando a Bruna da sua prática", afirma.

"A inércia compactua com a parcela da população que ainda não compreendeu a necessidade de ações antirracistas para a busca da igualdade para todos, independentemente de raça. Além disso, acredito que é significativo uma reparação, que poderia ser um esclarecimento da problemática do racismo recreativo, transmitido durante o programa do BBB, com intuito de informar e esclarecer a sua prática contumaz e seu reflexo sobre a continuidade velada de sua prática", completa.

Enquanto não houver a normalização de exigir que atos como estes devam ser punidos, ou retratados imediatamente, continuamos alimentando uma cultura racista, segregatícia que no resultado é menos oportunidade, mais violência e a distância da evolução enquanto sociedade igualitária
Driele Floriano

A reportagem procurou a Globo pedindo posicionamento e aguarda retorno.

Posicionamento do pai e advogados de Bruna também é problemático

Para Estevão, os posicionamentos divulgados por advogados e pelo pai de Bruna Griphao, onde ameaçam processar por calúnia quem acusar a sister de racismo, também são equivocados, uma vez que se trata de um caso público que cabe interpretação popular.

"Compreendo que não estamos — e dificilmente alguém conseguiria fazer esta 'imputação passível de punição' — porque é um fato público e notório, o que estamos fazendo — e qualquer pessoa do povo tem liberdade de fazê-lo — é interpretar um caso público, que está na média. O crime de calúnia segue outras diretrizes. Todas as pessoas, cidadãos, devem se sentir livres para expressar seu pensamento, logicamente que sem ofender ninguém, mas expressar ou interpretar determinada situação, em um estado democrático de direito, jamais poderá ser interpretado como crime".

Outro lado

O texto publicado nas redes de Bruna é assinado por Patrick Berriel e pelo advogado civil Luis Gustavo Trotta, e diz o seguinte:

As frases pronunciadas pela participante Bruna Griphao na segunda-feira, dia 03/04, deixaram claro tratar-se de rimas, sendo certo que foram ditas sem conotação racista e muito menos apontando a qualquer um dos jogadores do reality. Distante de qualquer ofensa discriminatória.

Não há qualquer crime nas palavras ditas por Bruna Griphao. Lembrando que todos aqueles que, através de suas redes sociais ou qualquer outro meio, imputarem à participante a odiosa conduta de prática de racismo, poderão responder criminalmente pelo crime de calúnia de acordo com o código penal, e responder civilmente pela reparação dos danos causados à participante.

Estamos com uma equipe vigilante analisando todas as postagens e mídias, e todos aqueles que venham praticar tais atitudes serão devidamente identificados e processados.

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