Irmã de Helena de Grammont foi assassinada pelo ex-marido famoso em 1981
Era 30 de março de 1981 quando a cantora Eliane de Grammont foi morta a tiros pelo ex-marido enquanto cantava em uma boate de São Paulo. Ela era irmã da jornalista Helena de Grammont, que morreu ontem aos 74 anos.
Aos 26, ela tentava retomar a carreira de cantora de MPB após terminar um relacionamento abusivo com Lindomar Castilho, famoso cantor de serestas da década de 1970 e conhecido como "rei do bolero". Os dois tiveram uma filha, Liliane, quem tinha apenas 1 anos e 8 meses quando viu a mãe partir.
Naquela noite de outono, ela fazia show na boate Belle Époque, em São Paulo, ao lado do músico e violonista Carlos Randall. Eles performavam o clássico "João e Maria", de Chico Buarque, quando Lindomar entrou no salão descarregando um revólver calibre 38.
Agora era fatal que o faz de conta terminasse assim, pra lá do meu quintal, era uma noite que não tem mais fim, pois você fugiu no mundo sem me avisar e agora eu era um louco a perguntar.
Trecho de "João e Maria" cantado por Eliane antes de morrer
Eliane era filha da compositora Elena de Grammont. Seu pai morreu quando ela era bem pequena, vítima de uma condição cardíaca chamada miocardiopatia — que também afetou Eliane e seus irmãos. Com o apoio da mãe, ela começou a cantar profissionalmente. Teve até uma música na trilha sonora da novela "O Profeta" (Rádio Tupi, 1977), a música "Coisas Bobas".
Tudo mudou quando se apaixonou pelo cantor de boleros Lindomar Castilho em 1977 — ele já havia vendido quase um milhão de discos. Dois anos depois, quando Eliane já estava grávida de Liliane, os dois se casaram a contragosto dos familiares da cantora. E ela decidiu acatar a ordem do marido de parar de subir aos palcos.
O que aconteceu com Lindomar?
O artista goiano levou uma surra das pessoas que estavam no bar, quase foi linchado e preso em flagrante na sequência. No entanto, conseguiu sair da prisão e esperar o julgamento em liberdade por ser réu primário.
Em depoimento, segundo reportagem publicado pelo jornal O Globo na época, Lindomar acusou Eliane de ser péssima dona de casa, mãe negligente "que vivia com o pé na rua" e de manter um caso com Carlos Landall. Disse ainda que cantora foi morar em um apartamento dele após a separação e que dava festas frequentes no imóvel. Ele tentou desqualificar a vítima.
O julgamento durou quatro anos e ele foi condenado a 12 anos por ter acertado a cantora no peito. O caso gerou repercussão midiática e protestos feministas pelas ruas de São Paulo, incluindo passeatas mobilizadas pela irmã Helena.
"Órfã pelo feminicídio"
Hoje, Liliane cresceu, tem 44 anos e se tornou professora de dança. Em entrevista à Marie Claire em 2010, a filha de Eliane e Lindomar disse que se tornou "órfã de um feminicídio" e decidiu transformar a dor em força para defender as mulheres.
Perdeu o contato com o pai enquanto ele estava preso, mas, aos 17 anos, decidiu procurá-lo. Conversaram apenas uma vez sobre a noite do crime. Ele apresentou uma versão diferente e ela travou ao ouvi-lo.
Liliane perdoou o pai? "Falo que sim e não. Perdoei porque procurei uma reaproximação. Porque, depois de matar minha mãe, ele não saiu machucando ninguém, não insistiu no erro. É o típico machista brasileiro que tem verdades fixas. Mas percebo nele um arrependimento profundo, até porque ele não consegue conviver mais com ninguém, nem comigo. Como se a solidão fosse uma autopunição."
De jeito nenhum quero passar a mão na cabeça do meu pai, mas prefiro um diálogo para entender onde a gente pode conversar com os homens para fazer alguma diferença para a vida das mulheres.
Liliane em depoimento à revista Marie Claire
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