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Por que Indiana Jones é o maior herói de ação da história

Harrison Ford em "Indiana Jones e a Relíquia do Destino" - Lucasfilm
Harrison Ford em 'Indiana Jones e a Relíquia do Destino' Imagem: Lucasfilm

Colunista do UOL

22/06/2023 04h00

"Indiana Jones é irrelevante." A piada foi popularizada na série "The Big Bang Theory", quando teorizaram que "Os Caçadores da Arca Perdida" veria os nazistas encontrarem seu destino mortal mesmo se o arqueólogo jamais estivesse na história. Essa turma não poderia estar mais errada.

"Caçadores", que Steven Spielberg dirigiu em 1981, nunca foi sobre procurar um tesouro. Nunca foi sobre locações exóticas ou mesmo sobre a noção banhada em cinza da luta do bem contra o mal. O centro da trama é a jornada de Indiana Jones. Não o caminho do ponto A ao ponto B, mas como ele, mesmo nas situações mais fantásticas, se manteve por demasiado humano.

A construção de um herói da ficção precisa ter uma âncora na realidade para que, do lado de cá, a plateia tenha onde se conectar. Em meio a histórias extraordinárias, Indiana Jones manteve sua tenacidade, sua curiosidade e seu charme. Mesmo quando encarava um cenário maior do que a vida, ele reagia como um de nós: com os pés no chão.

Indiana Jones é, claro, uma criação coletiva. Ele saiu da mente do produtor e roteirista George Lucas, que imaginou um herói como os que povoavam as aventuras das matinês de sábado nos cinemas. Desse ponto de partida, ele foi lapidado no texto de Philip Kaufman, na arte conceitual de Jim Steranko, no roteiro de Lawrence Kasdan e, claro, na direção de Steven Spielberg.

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'Os Caçadores da Arca Perdida'
Imagem: Lucasfilm

Um herói, contudo, é inerte sem ter um rosto com o qual todos pudessem se identificar. Harrison Ford não era a primeira escolha de Lucas, que trabalhara com ele em "Loucuras de Verão" e, claro, em "Guerra nas Estrelas". A escolha do produtor era Tom Selleck, que então tinha um compromisso com a série de TV "Magnum P.I.". Spielberg, por sua vez, sabia que Harrison e Indy, mesmo antes de as câmeras rodarem, eram inseparáveis.

Ambientado em 1936, "Os Caçadores da Arca Perdida" logo estabeleceu Indiana como seus "contemporâneos", aventureiros da Era de Ouro de Hollywood como John Wayne em "No Tempo das Diligências", Cary Grant em "Gunga Din" ou Humphey Bogart em "O Tesouro de Sierra Madre". Exemplos de masculinidade que estimulavam as fantasias masculinas em ser como eles, e também o desejo feminino de estar com eles.

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'Indiana Jones e o Templo da Perdição'
Imagem: Lucasfilm

Na superfície, Indiana Jones parece forjado no mesmo molde. Ele enfrenta tudo que surge em seu caminho, ameaças forjadas pelo homem, encontradas na natureza ou materializadas pelo sobrenatural. Ao contrário de suas inspirações, porém, Indy hesita, comete erros. Ele pode ignorar os sinais de perigo e seguir os próprios instintos, mas entende quando a inação é o melhor caminho e percebe que, muitas vezes, é preciso simplesmente ter fé.

Essa humanização o faz descer de um pedestal de fantasia e caminhar conosco, o sujeito comum. Indy compartilha de nossos sonhos, mas também de nossas frustrações. A Arca da Aliança nunca é estudada como ele; as Pedras de Sankara nunca deixam seu local sagrado; o Santo Graal mostra-se um artefato irremovível; a Caveira de Cristal volta para casa no espaço entre os espaços. Suas vitórias são morais em vez de factuais.

Na década de 1980, quando surgiu a figura do "exército de um homem só", os heróis de ação eram praticamente invencíveis, representando um ideal bélico ou de um homem da Lei. Indy nunca seguiu esse caminho, nunca foi conduzido pelo conflito: seu impulso sempre foi pela curiosidade, pela descoberta. Pelo fascínio do desconhecido, que nos fez atravessar os oceanos e ir à lua.

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'Indiana Jones e a Última Cruzada'
Imagem: Lucasfilm

Em cada novo filme, essa jornada refletia os anseios não só de seus criadores, mas era também uma resposta à brutalidade do mundo real — e do espelho que o gênero por vezes se tornava. Indy sempre representou o escapismo, o desejo de ver um mundo melhor. Foi assim em "Os Caçadores da Arca Perdida", provavelmente o modelo mais perfeito do cinema de aventura.

"Indiana Jones e o Templo da Perdição" seguiu uma rota mais sombria, talvez por ser produzido em uma fase complicada na vida pessoal de George Lucas. "Indiana Jones e a Última Cruzada" foi um verdadeiro evento familiar em que descobrimos a raiz do ímpeto do herói. "Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal" encostava na ficção científica como alegoria para a Guerra Fria — adequado a um filme ambientado em 1957.

As aventuras produziram um efeito curioso, com Indiana Jones envelhecendo com seu público, tornando-se mais sábio e cauteloso, sem nunca virar as costas para a ação. Ele não tem superpoderes, não depende de engenhocas tecnológicas, não é especialista em combate. É um professor, um arqueólogo, um sujeito comum que encara situações incomuns.

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'Indiana Jones e o Reino da Caveira de Cristal'
Imagem: Lucasfilm

A chegada de "Indiana Jones e a Relíquia do Destino", que estreia no dia 29 de junho, consolida o herói interpretado por Harrison Ford como o mais humano, mais surpreendente, mais confiável e mais sensacional dos heróis de ação. Ao interpretar sua idade, Harrison Ford também lhe confere uma insuspeita mortalidade, o que o aproxima ainda mais de mim e de você. De todos nós.

"The Big Bang Theory" quis que acreditássemos que Indiana Jones seria irrelevante. A piada teve efeito contrário: ressaltou que, sem ele, estaríamos vivendo em um mundo mais árido e menos surpreendente. Um mundo sem Jack Sparrow e John McClane, sem Jack Burton e Martin Riggs. Um mundo sem heróis falíveis que não entendem o que é desistir. Ao materializar nossas fantasias, Indiana Jones compartilhou o maior dos tesouros: o chamado à aventura!