'Caça-níqueis' e horas de trabalho: o que revela o doc do Balão Mágico
As memórias afetivas do Balão Mágico estão bem presentes no documentário "A Superfantástica História do Balão", lançamento em três episódios do Star+, mas para a grande maioria não são o ponto mais importante dessa narrativa.
Afinal, falamos não apenas do grupo infantil mais importante do Brasil, mas de um fenômeno que atravessa gerações e deixou traumas não apenas para aquele momento há cerca de 40 anos, mas para a forma como, até hoje, entendemos a televisão e a vida artística.
O projeto idealizado por Tatiana Issa reúne os quatro integrantes originais do grupo para um reencontro com direito a lavação de roupa suja e nostalgia. Simony, Tob, Mike e Jairzinho relembram como chegaram ao grupo, quais momentos mais marcaram e como aconteceu a derrocada final.
Eles, é claro, não são os únicos a dar depoimento. O documentário também coloca diante das câmeras empresários como Boni e Marcos Maynard, este da antiga gravadora CBS, além do diretor Nilton Travesso, que comandava o programa do Balão Mágico) e familiares do quarteto para entender o que acontecia nos bastidores.
Traumas, muitas horas de trabalho e uma máquina de dinheiro
Marcos Maynard até diz que muitas coisas sobre a história do Balão ele não será capaz de contar, mas também não poupa detalhes que mostram que havia uma máquina de dinheiro rolando por trás das cortinas. A ideia de um grupo infantil, importada de sucessos semelhantes mundo afora, foi comandada pela CBS, que emplacou um disco atrás do outro e conseguiu parcerias simbólicas com artistas como Djavan e Fábio Junior.
A contrapartida é que, tudo isso em cima de quatro crianças trabalhando em excesso, resultou em uma rotina que eles lembram com um misto de carinho e dor. O excesso de shows fazia com que passassem muito tempo na estrada e fossem extremamente assediados por fãs por onde quer que fossem.
Neste sentido, fica evidente que Tob e Mike são os que mais sentiram o baque. Tímido, Tob conta com uma voz singela que fazer parte do grupo significava não conseguir fazer amigos fora daquele meio, e ser alvo de bullying quando conseguiu frequentar uma escola após ser retirado do grupo.
Mike, filho do ladrão britânico Ronald Biggs, veste a ironia como uma máscara e não poupa palavras ao contar sua realidade: perdeu a virgindade e fumou pela primeira vez aos 11 anos, raspou a cabeça quando o grupo acabou para poder andar pelas ruas livremente, gastou boa parte do dinheiro com o pai e se tornou o sustento da família.
O excesso de trabalho daqueles quatro também é notado por Luciana Mello, irmã de Jair Oliveira, o Jairzinho. Em determinados momentos do auge do grupo, eles chegavam a fazer dois ou três shows por dia — o que Mike, por exemplo, descreve como "Shows caça-níqueis" —, e ainda havia a gravação do programa e dos especiais da Globo.
Mike recorda que, em uma ocasião, gravando um especial, os quatro ficaram em um teatro das 8h da manhã até as 3h da madrugada. Eles só foram embora quando seus pais, um a um, resolveram tomar as rédeas e decidir que seus filhos não ficariam ali por nem mais um minuto.
Quem controlava o dinheiro?
Maricleuza Benelli, mãe de Simony, é uma figura que aparece com bastante destaque no documentário. Há acusações de que a família de Maricleuza teria recebido a maior parte dos lucros do conjunto, o que a mulher nega ter acontecido.
Ainda assim, fica exposto que os Benelli tinham maior participação no projeto e na organização do shows que os outros familiares. Maricleuza chega a argumentar que, por vir de uma família de circenses, todos eles tinham conhecimento de como funcionava a produção artística. "Quase a família toda ficou empregada. Ela conseguiu tirar todo mundo do circo", fala sobre a filha.
Ainda assim, ela argumenta que Simony não ganhava nem um tostão a mais que as outras crianças, enquanto Mike declara, sem citar nomes, que "rolou muita grana, roubou-se muito dinheiro", enquanto também é contextualizado que nenhuma outra família tinha tanta voz quanto a de Simony.
O que dizem os empresários?
Há um jogo de empurra entre as figuras que dão depoimento, todas parcialmente se eximindo da culpa dos traumas e do excesso de trabalho daquelas crianças. No entanto, há um argumento de que aquilo não é algo fora do comum para o que acontecia na época, de modo a tentar "normalizar" a rotina de shows e gravações.
A maneira como cada um deles lidou com o pós também é contextualizada. Ao crescer diante das câmeras, Simony depois é exposta a um machismo que ela mesma parece tentar diminuir. Para Tob, retirado do grupo quando entrou na puberdade, a gravação de um disco solo que a gravadora mal divulgou foi uma espécie de prêmio de consolo descrita de forma cruel por Maynard.
Ainda assim, vale salientar, o clima entre os quatro jamais se torna hostil, o que demostra que, apesar de inúmeros desentendimentos e momentos difíceis, eles enxergam que o problema vinha de fora. Embora Simony seja quem mais tenta preservar a memória afetiva e não entrar em polêmicas, nem ela consegue esconder que no Balão também cabem muitas dores.
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