'É tesão ou é amor': como música brasileira virou a mais ouvida na Ucrânia?

A Ucrânia não sai do noticiário, mas, ainda que a população local sofra com a guerra com a Rússia, a música segue como um combustível para dias melhores. O curioso é que o topo da lista das mais ouvidas do Spotify ucraniano é de uma brasileira: Biby Babydoll e seu hit "Automotivo Bibi Fogosa", que totaliza 10 milhões de audições na plataforma.

Mas não é só. A curitibana de 24 anos alcançou também o topo do ranking viral global do Spotify — uma playlist com 1,8 milhão de seguidores mundo afora — à frente de Sinéad O'Connor e uma música do filme "Barbie".

O que explica isso? O sucesso de um estilo que vem aquecendo as pistas brasileiras e que tem um paralelo com a Europa: o brazilian phonk. Mas a gente chega lá daqui a um pouquinho.

Primeiro, quem é Bibi?

Bibi é Beatriz, que ainda em Curitiba descobriu sua paixão por performar. Em casa, a garota já criava maquiagens e looks, posava em cenários feitos por ela mesma e postava suas fotos online. Quando começou a ir a festas, a adolescente descobriu que aquele mundinho estava pequeno para ela.

"Um dia fui a uma balada com performances, e dois caras fizeram uma cena de Halloween, meio macabra. Eu falei: 'É o que faço na internet, mas num palco. Eu quero fazer isso'", contou Bibi, a Splash.

O sonho de virar performer começou bem. Mas aquela sensação de que faltava algo voltou. "Eu fazia uma make [maquiagem], um look massa, mas vi que o mais importante era a música. Então fui fazer aula de produção musical." Primeiro surgiu a Bibi produtora, lançando músicas eletrônicas.

O passo seguinte foi lançar a Bibi cantora, que se inspirou em Lady Gaga e os alemães do Rammstein, famosos pela pirotecnia em seus shows, para criar um show cheio de performances. Seu carro-chefe é usar faíscas para "hipnotizar" o público — como se vê na capa do hit "automotivo".

O hit

A primeira música de Bibi na fase cantora foi "Pirigótika", em 2021. Já em São Paulo, ela conta que passou a compor em casa, de forma simples, pegando beats no YouTube. Com a ideia em mãos, ela mandava para produtores com quem gostaria de trabalhar.

Foi com este método que surgiu a parceria com DJ Brunin XM. "Automotivo Bibi Perigosa" traz na melodia uma menção a "Can You Feel My Heart", hit da banda de metalcore Bring me the Horizon, mas com uma pegada phonk, misturando funk e eletrônico.

Conexão Brasil - Ucrânia (e o mundo)

O funk já ultrapassou as barreiras brasileiras há muito tempo, mas um detalhe no brazilian phonk faz a coisa ficar ainda mais interessante para os europeus: a batida (ainda) mais dançante, com elementos eletrônicos.

Ainda que poucos ucranianos devam ter alguma noção do que Bibi canta no seu hit, com frases como "é tesão ou é amor?" e "xoxota tá pegando fogo", a Europa é um dos maiores palcos de música eletrônica, o que faz ser compreensível que o brazilian phonk caia no gosto dos jovens e jovens adultos de lá.

O cenário europeu foi uma das inspirações de Bibi, que agora brilha por lá.

"Eu sempre gostei muito de música europeia, de industrial, porque na Europa eles são mais receptivos à música eletrônica. Muita coisa que eu gosto saiu de lá. O 'Automotivo' é similar ao phonk, que está estourado na Europa e no TikTok, por ter um beat contínuo e dançante. Acho que vai ser tendência aqui, depois de já ter estourado lá. E o phonk ainda tem um toque brasileiro, do funk, que está estourando na gringa, principalmente depois que a Rihanna usou no Super Bowl", explica Bibi.

Agora, a curitibana quer aproveitar para estruturar sua carreira.

"Eu sempre tive o pé no chão, sempre estudei sobre a indústria musical, então não dá para se deslumbrar com qualquer coisa. Esse hit mudou minha vida, vai me dar um bom dinheiro e me trouxe pessoas interessadas no meu trabalho, que vão me ajudar. Agora vou começar a viver meu sonho de fato. Meu sonho não era estourar só uma música. Quando estourou, eu fiquei muito estressada, porque tinha de lidar com tudo sozinha. Agora vou poder ter uma equipe para crescer."

Essa música mexeu na minha carreira de toda forma possível. Como diria Jojo Toddynho: 'Um hit é um hit'. Bibi Babydoll

(Brazilian) phonk, não funk

O estilo é derivado do phonk — que por sua vez veio como um novo subgênero do rap nos Estados Unidos. O prefixo "brazilian" surgiu porque as músicas trazem elementos do funk mandelão aliados aos beats dançantes, toques de música eletrônica e vocais de rap/trap.

O phonk é um estilo novo, mas com timbres que o funk usa muito, principalmente o mandelão. O beat muda um pouco, é mais contínuo, com um lado eletrônico que combina com baile, balada, com o TikTok. Ele é fácil de fazer passinho de dança em cima e chega num público jovem e jovem adulto, tanto para ouvir jogando, quanto para ir para a balada. Bibi

E não pense que isso é coisa só de brasileiro. Como o sucesso de Bibi mostra, muito do potencial de crescimento está na gringa. Exemplo disso é o fato de um dos maiores artistas do estilo, Kordhell — que curiosamente tem uma carreira no black metal —, ter se aliado a brasileiros.

Primeiro foram os Dragon Boys, dupla de São Mateus, na zona leste de São Paulo. O produtor inglês notou que os brasileiros haviam passado a apostar no brazilian phonk, principalmente com o disco "Baile do Brazil".

O resultado foi "Vuk Vuk", que está chegando a 10 milhões de audições no Spotify:

Maior ainda é o sucesso de "Brazilian Dança Phonk", de 6YNTHMANE e RXDXVIL, que conseguiram 25 milhões de plays na mesma plataforma — e ganharam um remix recente de Kordhell.

A lista de músicas com milhões de ouvintes só cresce e o phonk ainda está engatinhando quando se fala em shows e eventos próprios. Mas basta ver o sucesso na Ucrânia para enxergar o potencial do estilo.