Planet Hemp bate em Bolsonaro e crava: 'Queremos ser a banda das décadas'
Entre o primeiro e o segundo turnos das eleições presidenciais do ano passado, em um Brasil dos mais efervescentes politicamente dos tempos recentes, o Planet Hemp fez seu retorno triunfal. O grupo lançou naquela ocasião o disco "Jardineiros", primeiro de inéditas em 22 anos. Agora, pouco menos de um ano depois, eles chegam com "Jardineiros - A Colheita", versão deluxe do mesmo álbum, com quatro músicas novas.
"A gente tinha muita rejeição ao fato de gravar um disco novo. Fazemos show pra caramba de greatest hits, é uma posição bem cômoda", confessa BNegão, que divide as vozes com Marcelo D2, em entrevista a Splash, sobre as duas décadas de hiato.
"Essa pressão de fora teve uma importância, mas quase nenhuma, até o fato de o Brasil entrar em um fascismo tropical", completa D2. "A gente queria participar dessa discussão enquanto banda. Participávamos enquanto cidadãos, entrei em discussões no Twitter até com a família Bolsonaro, e o Bernardo teve show em que prenderam gente, tiraram ele do palco. Fomos percebendo que tínhamos que participar disso, era quase uma missão nossa."
De lá para cá, algumas coisas mudaram. Se a presidência de Bolsonaro e a continuidade da pandemia de covid-19 foram alguns dos motivos que levaram o Planet Hemp ao retorno, a transição de governo em 2023 até aponta para um lado mais afim com o que a banda prega, mas eles mesmos dizem que isso está longe de ser a solução final.
Não queria que continuasse essa desgraça, desgraceira desse governo fascista bizarro. Mais quatro anos disso aí e acabava o Brasil.
BNegão, sobre o Planet Hemp lançar 'Jardineiros' antes do segundo turno das eleições presidenciais em 2022
"A gente se meteu nessa conscientemente, mas o Brasil é uma treta de séculos que não vai ser resolvida em três, quatro meses. Nem em quatro anos, nem em dez anos", continua. "O negócio é sempre caminhar, devagarinho, no meio da confusão toda."
A ideia original de começar o disco era uma pessoa que foi dormir na época que a gente lançou o último disco, em 2000, acordando em 2022 e falando: 'Caralho, que porra é essa?'
Marcelo D2, sobre o disco 'Jardineiros' e o hiato do Planet Hemp
"É uma coisa tipo aqueles joguinhos. Avance 20 casas, volte 180 mil casas e fique esperando quatro anos", completa BNegão, exemplificando o sentimento que tomou conta durante o governo Bolsonaro.
Para o lançamento de "A Colheita", ainda que poucos meses depois de "Jardineiros", D2 explica que foi necessário ter o tempo da banda. As novas composições são algumas das que não ficaram prontas a tempo no ano passado. Havia um tempo necessário para elas crescerem, amadurecerem e serem colhidas.
"A gente quer fazer as coisas do jeito que a gente acha que tem que ser feita, bem direitinho", justifica Marcelo.
A gente tem que trabalhar com uma gravadora que entende isso, que está do nosso lado, apoiando a gente. Ao invés de ser a banda do verão, a gente quer ser a banda das décadas.
Marcelo D2
Das rádios ao TikTok, a lógica pouco muda
Em 3 décadas de estrada, o Planet Hemp presenciou grandes mudanças no mercado fonográfico, agora enfrenta a lógica de algoritmos e trends de vídeos curtos do TikTok. Diante dessa nova métrica da comercialização, D2 e BNegão não se intimidam —e também não se deixam levar pelas tendências.
"Na lógica do mercado é a mesma coisa: saber trabalhar", reflete D2 sobre a transição das rádios às redes sociais. "Tem dois lados disso tudo, entretenimento e arte. No nosso caso, gostamos de ter equilíbrio. Tem gente que só quer arte e tem outras que só querem entretenimento."
Para ele, a lógica das redes sociais tem suas vantagens. "Antigamente, você tinha que furar uma bolha muito maior. Na época do punch rap do primeiro disco, a gente tinha que tocar com a Daniela Mercury, que é do axé, e eram coisas completamente diferentes, Hoje, acredito que dentro desses nichos a gente consegue alcançar um público que é nosso."
BNegão vai além ao contar que o Planet Hemp sofreu muita resistência, mas os momentos têm seus prós e contras.
As rádios não queriam tocar porque estavam apavoradas com o conteúdo das letras e o som pesado. E a MTV, que era a grande saída fora das rádios, só tocava depois da meia-noite.
BNegão sobre a trajetória do Planet Hemp
"Já teve um monte de treta. A parada antes acabava sendo mais artística, a gente viajava no videoclipe e, hoje, não há mais a cultura do videoclipe tão forte. Mas a gente vai metendo bronca. Estamos nessa missão de fazer um lance consistente, que fique, mesmo no meio dessa confusão de tiktokers e afins", completa.
"Cada geração tem a sua parada, e essas ferramentas são superválidas para o momento. É diferente tocar na rádio e tocar no videoclipe e, hoje, com TikTok, Reels, tudo é válido e vai muito da criatividade", finaliza D2.