Além do Prêmio Multishow: por que Globo aumenta aceno aos evangélicos?

Pela primeira vez, o Prêmio Multishow foi transmitido na TV aberta pela Globo. Mas as novidades da 30ª edição não pararam por aí. Também foi a primeira vez que a premiação de música abriu as portas para o mundo gospel. A cantora Aline Barros e o grupo Preto No Branco levaram louvores ao palco do evento, justamente quando a emissora entrou ao vivo com o prêmio.

Além disso, eles premiaram a música "Deus Cuida de Mim", parceria entre Pastor Kleber Lucas e Caetano Veloso, como a canção cristã do ano. Ela concorria com faixas de Maria Marçal, Gabriela Rocha, Clovis & Ton Carfi e Sarah Beatriz.

É mais uma ação da Globo para se aproximar do público evangélico. Recentemente, a emissora promoveu o reality gospel Altas Promessas no Altas Horas e exibiu a novela "Vai na Fé" — trama que tinha uma protagonista evangélica, a Sol, vivida por Sheron Menezzes, que caiu nas graças do público. Em breve, a emissora também deve anunciar um documentário sobre a população evangélica no país.

A aproximação da Globo com o público evangélico pode ser explicada pela debandada desta audiência nas últimas décadas, sendo ela uma parcela que cresce consideravelmente na população, explica a pesquisadora Jacqueline Moraes Teixeira*.

"Globo teve perda a cada ano em relação à audiência dos evangélicos, o que acirrou ainda mais com o governo Bolsonaro. A gente vai perceber que parte desse público vai deixando as novelas da Globo e se conectando às narrativas bíblicas da Record. Enquanto recusa as narrativas produzidas pela Globo, vê a Record como lugar de representatividade."

Em 2020, uma pesquisa do Datafolha indicou que 31% da população brasileira se declarava evangélica. Estima-se que, até o final da década de 2030, este será o maior grupo religioso no Brasil, ultrapassando a quantidade de católicos.

Essa aproximação é encabeçada por Amauri Soares, ex-marido de Patricia Poeta e atual diretor dos Estúdios Globo, homem considerado o número 1 do entretenimento no canal. Mas por quê?

É interessante para Globo financeiramente atrair uma faixa expressiva da população à sua grade, seja em novelas ou programas de entretenimento. Isso aumenta audiência e, consequentemente, publicidade. Além disso, nos últimos anos, faz parte da política da emissora nos ampliar o leque de diversidade e trazer mais representatividade para as telas, seja na dramaturgia, nos programas de auditório ou produções jornalísticas.

Tentativa passada

Não é a primeira vez que a Globo tenta se aproximar do público evangélico. A partir de 2009, os temas começam aos poucos a serem inseridos a partir de personagens de novelas, como em "Avenida Brasil" e em "Cheias de Charme", a novela das empreguetes.

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"Foi um período que a emissora se abriu para falar com lideranças religiosas e do campo gospel, criando alguns programas musicais gospel. Só que a recepção das personagens pelos evangélicos foi ruim, elas foram vistas como estereotipadas. Como consequência, faz o público se interessar e migrar para novelas bíblicas da Record, principalmente em 2015 com 'Os Dez Mandamentos'", diz Jacqueline.

Qual era o cenário da TV em 2015 em relação aos evangélicos?

  • A Globo exibia "Babilônia", novela líder de audiência, mas que rendeu os menores índices da história para a emissora, trazendo debates sobre racismo e a pauta LGBT -- tema sensível a grupos evangélicos.
  • Já a Record exibia "Os Dez Mandamentos", sucesso bíblico que deu um salto na audiência da teledramaturgia da Record.
  • "Nessa relação entre as duas novelas, uma progressista, que tratava de temas centrais de direitos humanos, e outra bíblica, que remontava o imaginário do antigo testamento, a segunda opção venceu e levou o público evangélico. A sensação é que parte desse público não volta para as novelas da Globo, seja em narrativas bíblicas, ou em tramas não bíblicas, mas que tem sexo, historias LGBTs", diz Jacqueline.

*Jacqueline Moraes Teixeira é antropóloga e professora do Departamento de Sociologia da UnB (Universidade de Brasília). Ela pesquisa assuntos ligados à religião, gênero e mídia de massa. E concedeu entrevista à Splash em janeiro deste ano sobre o tema.

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