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Mão suada, choro e show do momento: na aba do fenômeno Ana Castela

Com o microfone na mão e chapéu branco na cabeça, Ana Castela não disfarça o nervosismo antes de começar a gravação do seu segundo DVD.

As mãos da cantora mais ouvida do Brasil não param de suar, mas ela tem uma tirada na ponta da língua para enfrentar a situação: "Meu sovaco tá suando, meu rego tá suando".

Amigos e familiares riem e a apoiam: "Ana, vai dar tudo certo".

A cena aconteceu em 8 de abril, no rancho de Ana Castela em Londrina (PR), e é reveladora: a artista de 20 anos ainda está se acostumando com o status que tem.

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Imagem: Sergio Ranalli/UOL

Com apenas três anos de carreira, Ana já tem o show do momento no Brasil e disputa os cachês mais caros do alto escalão do sertanejo, com Gusttavo Lima, Jorge e Mateus e Henrique e Juliano.

Foram 240 shows entre 2023 e maio deste ano. O valor por apresentação pulou de R$ 60 mil em 2022 para R$ 750 mil. E deve subir.

A boiadeira está há 25 semanas no topo da parada da Billboard Brasil. São 9 músicas entre as cem mais tocadas. A faixa "Nosso Quadro" teve o clipe mais assistido do ano no YouTube, com 350 milhões de visualizações.

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Imagem: Sergio Ranalli/UOL

Com ela, a sofrência eternizada por Marília Mendonça e outras cantoras do feminejo ficou em segundo plano.

Ana Castela mistura funk, eletrônico e reggaeton. Versos salientes e letras mais românticas convivem em harmonia.

Essa receita pop fez o sertanejo invadir lugares inéditos, como o Rock in Rio (onde Ana se apresenta em setembro) e baladas LGBTQIA+ -- é de Ana o hit "Pipoco".

A voz, o carisma e o jeitão espontâneo de menina da roça completam o combo de uma artista não tem vergonha de se revelar vulnerável e insegura. Ainda está aprendendo.

"Tem muita criançada que leva a avó no show e aí começam a gostar de mim. Estou numa vibe mais tranquila, não quero usar tanto palavreado na música, mas não quero ficar só num nicho", diz Ana. "É nicho que fala?"

É assim toda vez que dá entrevista, assume. Com o UOL não foi diferente.

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Imagem: Sergio Ranalli/UOL
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Imagem: Sergio Ranalli/UOL

Choro e jeans sujo

Até o começo de 2021, Ana Castela era apenas Ana Flávia, uma adolescente de Sete Quedas (MS), cidade de 11 mil habitantes na fronteira com o Paraguai onde "só tinha pracinha, farmácia e posto", lembra a cantora.

Eu chorava muito na escola, era ruim em matemática, mas era boa nas partes artísticas. Acho que só passei de ano por isso e porque a minha mãe ia lá xingar.
Ana Castela

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Imagem: Sergio Ranalli/UOL

Os choros continuaram no colégio. Pensava em ser médica, mas a mãe, Michelle, 44, sugeriu odontologia, pela grana e facilidade.

Mas, àquela altura, Ana já tinha gravado "Boiadeira". "Não podia deixar ela parada, esperando que ficasse famosa. E se não ficasse?", diz Michelle. "Hoje eu vi que faculdade não era para ela."

Ana chegou a fazer um semestre do curso até "Boiadeira" chamar atenção — e o sucesso escolher, por ela, qual seria sua profissão.

Versos como "o cabelo chanel deu lugar pro chapéu / Tá cheia de terra a unha de gel" ajudam a explicar o carisma da jovem, que só reduzia a ansiedade quando passava semanas na fazenda do avô e do pai na cidade de Corpus Christi, do lado paraguaio.

Ana ajudava a vacinar o gado e cuidar da plantação de milho e soja. Andava descabelada, de botina, chapelão e jeans sujo. "Meu avô me dava 250 reais pelo trabalho bem realizado", lembra a cantora.

Hoje, além do rancho, Ana tem a própria fazenda, uma caminhonete e uma polpuda conta corrente administrada pela mãe.

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Imagem: Sergio Ranalli/UOL

Ela ainda assim mantém o costume adolescente de comprar quinquilharias na Shein. A última aquisição foi um copo Stanley falso, revestido de pedrinhas brilhantes.

Antes, sempre pergunta à mãe se há dinheiro suficiente na conta.

Ela não tem noção de que é famosa. Só sente quando vão atrás dela na rua. A Ana acha que ninguém fará nada contra ela. De vez em quando sai com o próprio carro, sem segurança. Fico de cabelo em pé.
Michelle Castela mãe de Ana

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Imagem: Sergio Ranalli/UOL

No rancho fundo

O DVD "Herança Boiadeira", gravado em abril, resgata os "modões" que ela cresceu ouvindo entre Mato Grosso do Sul e Paraguai.

Pelos camarins circulam as participações especiais: Gino & Geno, Rionegro & Solimões, Gian & Giovani, Matogrosso & Mathias, Perla Paraguaia, Jayne e Trio Parada Dura.

Paula Fernandes, uma das mulheres a estourar a bolha de um gênero muito masculino, nos anos 2000, era uma delas. Estava vestida como a anfitriã da festa: de bota e chapéu.

Por isso simpatizei com ela de cara. Na minha época, me tiraram o chapéu e eu fiquei frustrada. Diziam: 'Isso vai limitar sua carreira, vai ficar muito rodeio'. Que bom que a Ana chegou.
Paula Fernandes

Com figurino country, mas sempre com brilho e cortes modernos, Ana circula entre os camarins. E entra na roda de compadres com facilidade: "Eu quero que vocês se sintam em casa", dizia para todos.

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Imagem: Sergio Ranalli/UOL

Naquela noite, a plateia era de apenas 200 pessoas, entre artistas, família, amigos próximos e integrantes de um fã-clube escolhido a dedo.

A situação era bem diferente de quando gravou o primeiro DVD da carreira, há um ano, num grande palco erguido na tríplice fronteira, em Santa Terezinha de Itaipu, no Paraná.

Tinha 19 anos e uma plateia de 70 mil pessoas à frente.

A gravação se estendeu até a madrugada fria, o que prejudicou o canto. "Minha voz não aquecia. Fiquei bastante nervosa, foi muito complicado."

Ana Castela com a cantora Perla Paraguaia
Ana Castela com a cantora Perla Paraguaia Imagem: Sergio Ranalli/UOL

Meses depois, no festival Caldas Country, Ana chorou no meio do show.

Estava, em suas palavras, "ruim da cabeça". Disse que fazia aulas de canto e que pensava em desistir da carreira recém-conquistada devido ao "hate" que sofria.

[Estava com o] corpo cansado e eu queria só voltar para minha casa e chorar. Mas, naquela hora não dava, então eu chorei onde mais me sentia confortável, em cima do palco.
Ana Castela

A cantora agora bloqueia fofocas na internet para não esbarrar nas críticas, que julgam de sua performance à aparência.

Na manhã da gravação do DVD, no entanto, chorou novamente. "Tava achando minha voz fraca", confidenciou.

Ao lado de uma preparadora vocal, aproveitou o tempo de maquiagem para aquecer a voz repetidas vezes no camarim.

O treinamento para por aí. O tal "media training", muito usado no meio artístico para ensinar celebridades a se comunicar em entrevistas, foi descartado pela equipe logo no início da carreira.

"Senão não é ela", diz uma assessora.

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Imagem: Sergio Ranalli/UOL

Clã Castela

A família da Ana Castela chega em peso ao rancho. Tios, tias, avós, a irmã de oito anos e primos pequenos com chapéus maiores que a cabeça descem de duas caminhonetes.

"Olha, quem são vocês? Nem parece minha família", ela brinca ao ver todos "na estica".

Na hora da gravação, Ana soltou a voz e recebeu a família no palco.

O primo Luiz Gustavo, peão de fazenda, subiu para dançar com a artista. A avó e a tia gritaram e invadiram o cenário na hora em que Eduardo Costa entrou como convidado, para tascar um beijo no ídolo.

A mãe Michelle e o pai Rodrigo com Ana Castela
A mãe Michelle e o pai Rodrigo com Ana Castela Imagem: Sergio Ranalli/UOL

A única ausência é a do avô paraguaio, André, antigo vereador de Sete Quedas, que morreu em 2008. Seu retrato está pendurado no palco montado. Foi ele quem introduziu o sonho da música no clã.

André levava a filha Michelle para cantar em comícios. Foi vendo a mãe cantarolar em casa — e o pai, Rodrigo, pedir sempre para a filha cantar Trio Parada Dura — que Ana começou a soltar a voz, mesmo envergonhada.

Michelle desistiu de continuar na música quando Ana nasceu, mas segue a filha em compromissos publicitários. "Se alguém responde meio torto para ela, eu já entro na frente."

A autoridade da matriarca é traduzida com um apelido dado pela equipe de Ana: "capa dourada". Naquela noite, mãe e filha ainda fariam um dueto pela primeira vez ao vivo.

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Imagem: Sergio Ranalli/UOL

Ostentação da roça

Ana foi descoberta pelo cantor sertanejo Rodolfo Lessi, 36, por meio de um vídeo postado nas redes sociais.

Nele, ela cavalgava ao lado do primo e dos funcionários da fazenda do avô paraguaio cantando "Vaqueiro Apaixonado".

Rodolfo tinha uma dupla de "estilo bruto" — sertanejo muito popular no Paraná, que usa o imaginário da agropecuária — e viu na garota carisma e vocal cativantes.

"Em poucos segundos eu visualizei tudo isso que ela é hoje, mas não nessa proporção", diz.

Tem espaço muito grande para isso no Brasil. Não só Ana, mas com artistas que vieram dessa geração com chapéu e bota. Falei: isso vai 'dar bom' e hoje a gente vê Louis Vuitton, Prada e a Beyoncé com chapéu e bota. Vira moda.
Rodolfo Lessi

A moda nas roupas e nas letras fez explodir no Brasil o chamado agronejo.

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Imagem: Sergio Ranalli/UOL

Parte do público associou as referências a uma espécie de propaganda ideológica. Ele nega.

"Os funkeiros falam dos bens, da ostentação deles. A nossa galera queria escutar a ostentação da roça. É só trocar a Ferrari pelo cavalo e mostrar que aqui no campo tem coisas legais", explica Rodolfo, hoje empresário e um dos compositores de Ana.

Quem domina o agronejo é o escritório Agroplay, que surgiu da necessidade de Rodolfo gerir a ascensão de Ana.

O escritório lidera as paradas com sucessos de Ana Castela, Luan Pereira e MC Chris no Beat.

Também avança na corrida por novos negócios com um time de influenciadores da vida no campo — entre eles, Odorico Reis, o "agro gay", um dos amigos próximos de Ana.

Caindo a ficha

Ana é sócia da empresa, que é patrocinadora master do time do Londrina. Compraram junto o rancho circundado por palmeiras imperiais e dependências simples do interior.

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Imagem: Sergio Ranalli/UOL

Com isso, a cantora se mudou para Londrina. Hoje, a música sertaneja é mais um ativo valioso na região, entre tantas outras atividades do agronegócio. A safra mais importante vem de Ana. Ela tem um dos shows mais procurados e vendidos do país.

Para que a voz mais ouvida do Brasil também possa ser uma garota de 20 anos, a ordem na Agroplay é privilegiar as folgas semanais de segunda e terça-feira.

"Ontem mesmo ela passou o tempo todo dentro de casa, aquela coisa de moça arrumando o quarto", diz a mãe.

Agora ela tem tempo para namorar. Em abril, voltou a sair com o cantor Gustavo Miotto, com quem namorou por breve período.

Seu sogro, Marcos Miotto, um dos principais bookers de shows sertanejos, agencia suas apresentações.

A família torcia pela volta e vê com bons olhos a presença do cantor, como alguém mais experiente na vida artística.

A preocupação familiar agora é com o próximo passo desejado pela cantora, comum a quem fez 20 anos há não muito tempo: morar sozinha pela primeira vez.

"A Ana não tem essa coisa de ser 'a cantora mais isso, a cantora mais aquilo'. Outro dia ela me disse: 'Eu só quero cantar e comprar minhas coisinhas'", conta a mãe.

Antes de entrar no camarim para se arrumar para a gravação, a cantora reflete sobre isso.

Se a gente for pensar demais, a gente surta. A ficha não caiu, nem quero que caia. Deixa assim desse jeitinho que eu estou bem feliz.
Ana Castela

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Imagem: Sergio Ranalli/UOL

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