Com jazz complexo, Jakob Bro mostra no C6 que arte não é entretenimento
Diferentemente do que podem pensar algumas mentes mais elitistas, é impossível ser um bom músico no universo do hip hop sem ser profundamente apaixonado pelos gêneros que conceberam o hip hop.
Todos eles estão presentes no C6 Fest. A soul music, o R&B, o funk, o blues e, se é impossível imaginar, o hip hop sem a improvisação com palavras, isso é culpa e mérito do jazz e de seus improvisos. Coltrane, Gillespie, Monk, todos eles presentes na festa, como pais e referências.
Na sexta, dia 17, eu vim ao Ibirapuera para um show de jazz, o último da noite, do guitarrista e compositor Jakob Bro.
Jakob Bro é um jazzista dinamarquês aclamado e multi-premiado. Com fortes influências do jazz norte-americano, Bro construiu desde 2003 sua carreira entre Nova York e Copenhague, se tornando um dos mais aclamados músicos no jazz europeu.
O guitarrista apresentou o show de "Uma Elmo", álbum que gravou em trio, com o trompetista norueguês Arve Henriksen e o baterista espanhol Jorge Rossy, que tocaram com ele aqui.
Diferentemente de outros artistas no jazz experimental, gênero marcado pelo virtuosismo de seus executores, o trio de Jakob Bro se destaca por suas composições complexas, porém altamente intimistas e narrativas. Mas não se engane, o virtuosismo está lá, totalmente a serviço da narrativa.
Acompanhar a apresentação do trio é como acompanhar uma história complexa sendo contada, uma peça de teatro cujos personagens por sua vez são as nossas próprias sensações, as quais os acordes melancólicos e profundos fazem questão de trazer para fora.
Sci-fi, terror, suspense, drama, romance. Está tudo ali sendo contado e recontado nas composições do dinamarquês.
O uso de sintetizadores, efeitos, reverbs, delays e pads e até sons de animais, rios, pedras e outras ambiências ajudam a compor o clima etéreo do concerto que usa o eletrônico para se aproximar o máximo possível do orgânico.
Ora deliberadamente para causar desconforto, ora para colocar todos em transe quase como em um culto.
Algumas pessoas ficaram fascinadas do começo ao fim com a imprevisibilidade da apresentação. Quando o músico quis causar desconforto, algumas pessoas não resistiram à desorientação e deixaram a plateia no meio do show. Uma tristeza pra eles. Poucos momentos depois a intenção era emocionar. E muita gente foi às lágrimas.
O crítico PH Santos vive repetindo que arte não é entretenimento. Pois bem, Jakob Bro executou sua arte com a intenção de fazer sentir, pensar, observar, olhar para dentro, mas sem a mínima intenção de entreter ninguém.
Eu, que sou do hip hop, adorei.
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