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Brasileira estreia como diretora em Cannes com documentário sobre yanomamis

Cena do filme 'A Queda do Céu', de Eryk Rocha e Gabriela Carneiro da Cunha Imagem: Reprodução/YouTube

Natália Eiras

Colaboração a Splash, de Cannes (França)

27/05/2024 12h01

A atriz, produtora e cineasta Gabriela Carneiro da Cunha já trabalhava há mais de 10 anos fazendo a escuta dos rios amazônicos quando "trombou", durante suas pesquisas, em 2017, com o livro "A Queda do Céu", escrito pelo antropólogo francês Bruce Albert em parceria com o xamã yanomami Davi Kopenawa. "Ele mudou completamente a minha cabeça. Comecei a olhar para nós, as pessoas brancas, de uma maneira diferente. Minha cabeça se reconstruiu, porque Davi faz uma contra-antropologia, ele usa sua perspectiva xamânica para falar para a gente quem somos nós", diz a profissional. Por conta desse impacto, Gabriela e seu sócio, Eryk Rocha, decidiram transformar o texto em um documentário homônimo, selecionado para a Quinzena dos Cineastas, mostra paralela do Festival de Cannes 2024.

Não é a primeira vez que a atriz e produtora Gabriela Carneiro da Cunha participa de mostras relacionadas ao Festival de Cannes. Porém, até então, só tinha vindo como parte da equipe técnica da nossa produtora", fala. Este ano foi a estreia da profissional no papel de diretora de um filme selecionado pelo evento, um dos mais importantes do cinema mundial. O que tornou ainda mais especial o fato dela ter sido uma das convidadas do Prêmio L'Oréal Lights on Women's Worth, que aconteceu na última sexta-feira (24). O evento premia diretoras de curtas-metragens da seleção oficial do Festival de Cannes e busca apoiar o ecossistema para que mais mulheres possam assumir posições de liderança na indústria do cinema.

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"Diante de uma história de centenas de anos de apagamento da história, do trabalho das mulheres, toda iniciativa que surge para iluminar essas existências, esses nomes, não são apenas bem-vindos, como fundamentais para o mercado cinematográfico", fala Gabriela Carneiro da Cunha.

Principalmente a possibilidade de não só iluminar cada caminho individual, mas abrir o espaço para a colaboração. A minha trajetória, por exemplo, é fruto de muitas alianças, de muitas amizades com outras mulheres. Gabriela Carneiro da Cunha

Colaboração em dois caminhos

Há sete anos, a dupla encontrou o xamã Davi Kopenawa com a ideia de transformar "A Queda do Céu" em filme. "Ele abraçou demais a ideia porque sempre quis que mais pessoas soubessem dessa história". Desde então, eles mergulharam em pesquisas e textos para botar o projeto em pé. Até que o sogro de Davi, uma pessoa muito importante na vida do xamã, acabou falecendo e Gabriela e Eryk foram convidados a gravar o Reahu, ritual funerário e mais importante celebração yanomami que dura semanas.

Da "cidade", a produtora levou uma equipe enxuta, apenas 5 pessoas, incluindo a Gabriela. Mas, no local, contou com o apoio e o conhecimento de profissionais indígenas. "Já que não queríamos trazer apenas o nosso olhar sobre o povo Yanomami, mas principalmente o olhar deles sobre a gente"- Aconteceu, assim, um intercâmbio de conhecimento: "Enquanto eles nos ajudavam a fazer o documentário, também produzimos curtas-metragens deles". Um dos produtos dessa parceria foi o curta-metragem "Mãri hi - A Árvore do Sonho (2023)", de Morzaniel Iramari, que foi premiado no festival "É Tudo Verdade" do ano passado.

Para Gabriela, é importante falarmos da perspectiva dos povos originários sobre a terra, principalmente em um momento em que as mudanças climáticas estão ficando cada vez mais evidentes. "O Davi fala uma coisa muito profunda sobre a gente: que somos um povo que dorme muito, mas que sempre sonha apenas com nós mesmos", pontua a cineasta.

Além de "A Queda do Céu", Gabriela continua seu trabalho com a escuta dos rios amazônicos. Para isso, conta com o apoio e orientação de mulheres ativistas para contar histórias que, muitas vezes, homens não veem com atenção. "Atualmente estou trabalhando com os Tapajós sobre a contaminação das águas pelo mercúrio do garimpo ilegal". Este é um aspecto que atinge principalmente as mulheres indígenas gestantes, já que o problema "contamina" seus úteros e leite materno. "É uma parceria de muita mulheridade para trazer à tona essas vozes que costumam ser silenciadas. É uma luta pelo território, pelos filhos e pelo útero das tapajós".

Da esquerda para a direita: Eryk Rocha, Bruce Albert, Davi Kopenawa e Gabriela Carneiro da Cunha no tapete vermelho de "A Queda do Céu" em Cannes Imagem: Sameer Al-Doumy / AFP

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