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Antes de virar TchaKa Drag Queen, Valder passou pela Igreja e pelo Exército

TchaKa Drag Queen em construção Imagem: Micaela Wernicke/UOL

Alexandre de Melo

Colaboração para Splash, em São Paulo

30/06/2024 04h00Atualizada em 30/06/2024 12h14

TchaKa é a apresentadora oficial da Parada LGBT+ de São Paulo há 11 anos. A artista recebeu Splash para um bate papo enquanto se montava para compromissos do Dia Internacional do Orgulho LGBTQIAPN+, na última sexta (28).

No aconchegante e colorido apartamento na rua Augusta, centro de São Paulo, TchaKa ofereceu castanha temperada, feita pelo marido, Carlos Alberto — o Chef Carlito —, mostrou sua coleção de perucas e seu arsenal de maquiagem.

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O Carlito é professor de filosofia e chef, ou seja, versátil igual a mim. Ele me apoia em tudo, conta TchaKa com brilho nos olhos que expressam a admiração pelo companheiro

O smartphone que estava na frente do espelho de maquiagem transmitia uma live em seu TikTok para quem quisesse aprender o passo a passo da montagem drag queen. Quem assistia ouviu a peculiar história de como Valder Bastos Santos criou a personagem TchaKa.

TchaKa Drag Queen Imagem: Micaela Wernicke/UOL

No fim do mundo, nasce uma TchaKa na praia

"Tinha aquela história que o Nostradamus anunciou o fim do mundo na virada de 1999 para 2000, sabe? Aí eu e cinco amigos fomos ver o mundo acabar de frente ao mar de São Vicente", relembra.

Para incentivar o talentoso e "pintoso" ator Valder a se soltar ainda mais, os amigos decidiram que iriam montá-lo como drag queen naquela virada de ano. Jogaram pó na barba e pasta de dente para maquiar.

"Fiquei horrível e odiei o nome", conta. Os amigos me apelidaram de TchaKa em homenagem ao macaquinho feio da série "O Elo Perdido". Como todo apelido, quando é rejeitado, pega. "Eu queria ser chamada de Samantha, Gisele, Deidiane, algo mais drag, sabe?", conta aos risos.

TchaKa Drag Queen Imagem: Micaela Wernicke/UOL

O mundo não acabou e segui com os meus bicos de panfletagem nas boates, mas vestido de menino. Aí um diretor me disse: 'Se você fizer a panfletagem vestida de drag queen, eu aumento o seu cachê.

A partir daí, a recém-nascida TchaKa Drag queen começou a se apresentar em points como as casas noturnas Nostromondo, Salvation, Blue Space, Túnel do Tempo e outras.

Drag queen ganha dinheiro?

"Drag queen em um chá revelação? Sim. Tem aos montes. Cafoníssimo! A gente faz porque a profissão traz dinheiro de muitas formas, além de dar a grande recompensa da nossa arte que é fazer as pessoas mais felizes", explica.

Não é só amor. Tem muito profissionalismo: preparo de voz, de atuação, estudo do evento, preparação de figurino, de maquiagem, das músicas adequadas. Antes e depois é ralação, entende? Gostoso é no palco. Estar no palco é melhor que gozar. TchaKa Drag Queen

Além dos quase 5.000 trabalhos que TchaKa já fez nos 24 anos da personagem, ela criou a Agência de Animação Tchaka Eventos. A empresa oferece palestras e organização de festas com um elenco de go-go boys e outras drags.

Perucas usadas pela TchaKa Drag Queen Imagem: Micaela Wernicke/UOL

O cotidiano da agência foi um pouco a inspiração do seu último personagem, interpretado no filme "De Repente Drag", da diretora Rafaela Gonçalves e estrelado por Silvero Pereira. TchaKa fez Clarice, justamente a dona de uma agência de drags.

O filme entrou no catálogo da Globoplay recentemente.

TchaKa, claro, não perde a chance de contar uma fofoquinha dos bastidores: "Foi babado gravar com tanta gente talentosa no calor de São Luís do Maranhão. Para não perder o ar-condicionado do meu quarto, meu amigo Silvero teve que dormir de conchinha comigo. Ui!".

Dar pinta na igreja e no Exército

Antes de existir a TchaKa, o jovem Valder viveu duas experiências que foram fundamentais para a sua veia militante.

"Eu me percebi gay com 14, 15 anos. Não tem o 'filhinho de papai'? Eu era a 'bichinha de papai', sempre jogando frescobol lá no Rio de Janeiro. De tanto frescobol, repeti de ano e fui enviado para a casa do meu irmão pastor, em Mogi das Cruzes (SP)". Depois disso, alistou-se no Exército e começou a frequentar a igreja Brasil para Cristo.

TchaKa Drag Queen Imagem: Micaela Wernicke/UOL

No Exército, era conhecido pela habilidade com armas de fogo. "Meu único arrependimento dessa época é não ter pego ninguém naqueles plantões de 24 horas na chuva, no frio", conta.

Eu vivia pensando que estava em pecado e brigando com os meus desejos. Eu gosto da reunião e do acolhimento da igreja, mas depois eu encontrei outras possibilidades de praticar essas coisas no boteco.

Anos mais tarde, TchaKa se formou bacharel em Direito. No entanto, ela realmente se encontrou no tripé "business, militância e arte", que o universo drag queen trouxe para a sua vida.

Montagem da TchaKa Drag Queen Imagem: Micaela Wernicke/UOL

A força das Paradas LGBT+

TchaKa apresenta Paradas LGBT+ em todo o Brasil, com público de mil a 3 milhões de pessoas.

"Eu vi, muitas vezes, pessoas em êxtase por ver a Sandra de Sá, a Daniela Mercury, as Spice Girls, as drags. Artistas que nem sempre os gays, as travestis tinham dinheiro para ver o show. Além disso, na Parada, as pessoas sentem a liberdade de andar de mãos dadas, de beijar e expressar o seu amor", analisa.

"Já enfrentamos momentos e momentos. Às vezes está chovendo, às vezes existe ameaça de bomba, protesto anti-parada. A extrema-direita é covarde e criminosa."

TchaKa reforça a missão das Paradas LGBT+: "Quando a mãezinha da travesti Laura Vermont, assassinada apenas por ser quem é, sobe no trio para dar seu depoimento, a gente não fica preso no tempo que cada um tem para falar e lembra que aquele momento existe para acolher e para exigir respeito".

TchaKa Drag Queen Imagem: Micaela Wernicke/UOL

Inspiração, deboches e rebolados

Como alguém decide trabalhar como drag queen? É uma resposta complexa hoje, para uma criança dos anos 1970, 1980, era ainda mais difícil.

"Eu tive muitas inspirações. Eu pirei com a audácia do Dzi Croquettes, no rebolado da Rita Cadillac, da Gretchen, do Ney Matogrosso, queria imitar tudo da Elke Maravilha e adorava o deboche da Emília, do Sítio do Pica Pau Amarelo", diz. "Eu sempre quis chegar perto do glamour das drag queens tradicionais, as artistas clássicas."

Ela defende que todo mundo pode fazer a arte drag queen: PcD, indígenas, héteros. "Quando uma criança olha para a TchaKa, ela olha para o lúdico. Olha para o que brilha. Olha para a liberdade e olha para a alegria. É nesse momento que a TchaKa pode inspirar", conclui.

Maquiagens da TchaKa Drag Queen Imagem: Micaela Wernicke/UOL
TchaKa Drag Queen se maquia Imagem: Micaela Wernicke/UOL
Mesa de maquiagem com espelho da TchaKa Drag Queen Imagem: Micaela Wernicke/UOL
TchaKa Drag Queen com a faixa de Rainha das Festas Imagem: Micaela Wernicke/UOL

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