Fagner critica imediatismo no mercado: 'Não lembram da música no outro dia'
Fagner, 74, coleciona sucessos, shows lotados e muitas parcerias ao longo de 50 anos de carreira e 38 discos lançados — o mais novo, "Além Desse Futuro", foi divulgado na última semana. O cantor cearense se orgulha da qualidade do próprio trabalho, sem se render às pressões do mercado.
Dez anos depois
"Além Desse Futuro" (Universal Music) chega às plataformas de streaming dez anos após seu último álbum de inéditas. Ele explica que essa demora tem a ver com o mercado da música atual, que busca o "imediatismo" de resultados. Mas não significa ele que esteve parado ao longo desse período, pelo contrário: Fagner produziu um disco de Bossa Nova, um de forró pé de serra — que será divulgado em breve — e "Além Desse Amor". "Esse disco que já tá [pronto] há um ano".
Nós, artistas, não paramos. Quem param são as gravadoras por causa do imediatismo, dos interesses, do medo e da incompetência de alguns caras que estão dentro de gravadoras. A coisa mudou radicalmente, mas a criatividade brasileira tem que estar presente, é o respiro do nosso país. A nossa cultura não é essa música que bate no rádio e você não lembra no outro dia. Essa disputa de audiência mal qualificada. Tem que levar isso em consideração. Nesse caso, a Universal tem apostado e tem feito vários trabalhos bons no mercado.
Fagner
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Desde que começou sua carreira, a maneira de divulgar música mudou bastante, analisa Fagner. Conhecido pela MPB e romantismo, ele não é especialista no mercado de hoje, mas enxerga a força do forró, estilo essencialmente nordestino, em todo o país. "Weslley [Safadão], Xand [Avião], o meu amigo João Gomes, que é uma pessoa incrível e com tanto talento, é um menino puro... A música popular do sertanejo domina, o Nordeste e o Ceará dominam".
O que a gente reclama é que a música também está sempre sujeita à apelação. Muitas vezes você vê shows enormes e as letras induzindo para uma baixaria. Bem, ainda bem que nós não estamos nessa.
Fagner
Romantismo e parcerias
"Além Desse Futuro" reforça o romantismo do cancioneiro de Fagner. Além disso, traz parcerias de longa data, como o poeta cearense Fausto Nilo — que divide a composição da faixa-título — e o cantor maranhense Zeca Baleiro.
A gente [Fausto Nilo e eu] tem cuidado com as palavras, com o que passar. Com certeza, a gente se diferencia [desse mercado do imediatismo] e se une àqueles artistas que procuram qualidade no trabalho. Me sinto assim.
Fagner sobre a música 'Além Desse Futuro'
Zeca Baleiro, quem assina a produção do disco, ainda divide os vocais em "Noites do Leblon". Os dois trabalham juntos desde 2003, quando lançaram juntos um disco e um DVD. "É um cara muito cuidado. Foi importante estar a frente desse trabalho. Ele tem o conhecimento do mercado. ['Noites do Leblon'] Foi a primeira música que fiz para esse disco, cantei em um show em Brasília, tem uns dez anos."
Em "Amigo de Copo", quem divide os vocais com Fagner é o cantor Jorge Vercillo. A faixa flerta com o reggae e tem vocação pop para as rádios. "O Jorginho frequenta um bar que eu vou desde a minha adolescência, o Bar do Vaval. Essa música foi em homenagem às noitadas de segunda-feira que a gente tem. Ele virou sócio-participante, tanto que a gente se chama de 'papai'".
A regravação de "Onde Deus Possa Me Ouvir", clássico de Vander Lee, é a única faixa que não é composta por Fagner. É uma dívida antiga do cearense com o público e com Vander Lee, "um artista brilhante". "Tive oportunidade de estar com ele nos últimos momentos. Depois da pandemia, o primeiro show que fiz foi em Belo Horizonte, em homenagem a ele. Ninguém esquece essa música".
A resiliência do amor maduro marca presença em "Recomeçar", enquanto o amor romântico é destacado em "Ponta de Punhal" — parceria com Toninho Geraes e Chico Alves. "Mostra a diversidade do disco. Tem uma poesia com o Fausto Nilo, outra com Baleiro, Vercillo e tem uma poesia com o Toninho, que é muito popular, peito aberto... Quando a gente tá gravando, manda [a música] para um, para outro: essa chocava as pessoas, chega na sofrência e no sentimento mais popular que as outras."