Baixista Peter Hook relembra 1ª vez do New Order no Brasil: 'Foi um choque'
Peter Hook nem lembra mais quantas vezes já veio ao Brasil. Esteve algumas vezes para se apresentar como DJ, outras como baixista do New Order, teve uma passagem como metade da dupla Revenge e outras com a banda The Light. Mas, ao ser questionado sobre as lembranças que tem do país, ele cita a primeira, em 1988, quando o New Order passou por Rio de Janeiro (no Maracanãzinho), Porto Alegre (Gigantinho) e São Paulo (Olympia e ginásio Ibirapuera).
Lembro bem que fomos ao Brasil e foi um choque. Um choque maravilhoso. Porque estávamos acostumados a tocar, na Inglaterra, para 600 pessoas, mil pessoas. E aí chegamos e fizemos shows para 5.000, 8.000 pessoas. Foi uma loucura. Parecia que éramos muito maiores aí do que na Inglaterra! Ainda me lembro disso até hoje. Peter Hook
Hook voltará ao país em 27 de agosto, para um show na Audio, em São Paulo. Com a banda The Light, ele tocará por inteiro os discos "Substance": tanto a versão do New Order como a de outra de sua banda, o Joy Division.
As duas versões de "Substance" que serão apresentadas tratam-se coletâneas. A do New Order foi lançada em 1987; a do Joy Division, no ano seguinte. Os primeiros shows do New Order no Brasil, portanto, tiveram as faixas de "Substance" como base: "Blue Monday", "Temptation", "Sub-Culture", "Ceremony", entre várias outras. E é "Substance" que traz Hook, 68, de volta ao país.
Sempre foi muito bom excursionar pelo Brasil. A única coisa que estragava tudo era o restante do New Order. Peter Hook
Peter Hook conversou com o UOL e falou bastante sobre o desentendimento que o levou à Justiça contra os outros integrantes do New Order (Bernard Sumner, vocalista e guitarrista; Gillian Gilbert, tecladista; Stephen Morris, baterista).
Você vai voltar ao Brasil para um show. Quais são as lembranças que tem do país?
Peter Hook - Lembro bem que fomos ao Brasil e foi um choque. Um choque maravilhoso. Porque estávamos acostumados a tocar, na Inglaterra, para 600 pessoas, mil pessoas. E aí chegamos e fizemos shows para 5.000, 8.000 pessoas. Foi uma loucura. Parecia que éramos muito maiores aí do que na Inglaterra! Ainda me lembro disso até hoje. Sempre foi muito bom excursionar pelo Brasil. A única coisa que estragava tudo era o restante do New Order.
Desta vez, você vem para tocar os dois discos "Substance", tanto do New Order como do Joy Division. Vão entrar a versão do CD ou do vinil (as versões em vinil são mais enxutas; em vinil, o "Substance" do New Order tem 12 faixas; já a versão em CD tem o dobro, com várias faixas menos conhecidas da banda)?
Hook - Bem, se fôssemos apresentar as versões dos CDs, teríamos que tocar a noite inteira e eu sairia exausto. Então tocamos a versão dos vinis e uma pequena seleção dos B-sides. Na parte do Joy Division, vamos tocar umas quatro músicas que não estão na coletânea, e depois as faixas de "Substance". Na parte do New Order a mesma coisa: tocaremos algumas faixas que não estão nesse disco e, então, vem o "Substance". É um formato interessante, são muitas canções, há muitas variações de ritmos.
Em relação ao New Order, você acha que o "Substance" é uma espécie de divisor de águas da banda, já que antes vocês pareciam estar mais em uma linha pós-punk e, depois do "Substance", veio o disco "Technique" e uma fase mais dance?
Hook - Até gostaria de que tivesse sido, mas acho que não. Pelo menos não de uma maneira intencional. O que aconteceu foi que o Tony Wilson (apresentador de TV e amigo dos integrantes do New Order; Wilson cofundou a gravadora Factory Records e o clube Haçienda) certa vez me perguntou que carro ele deveria comprar. Eu brinquei e disse para ele comprar um Jaguar XJ6, que via na série de TV "Os Vingadores". E ele comprou!
O carro veio com um tocador de CD, e na época ainda não havia muitos CDs. Tony perguntou se poderia juntar os singles do New Order em um único disco, para ele poder ouvir no carro. Então lançamos a coletânea, e Tony colocou em CD e passava os dias ouvindo no carro. "Substance" virou o nosso disco mais vendido. E não tinha nos custado nada para gravar. Nos EUA vendemos 3 milhões de cópias. Era um absurdo naquela época. Então até hoje agradeço por ter falado para o Tony ter comprado aquele carro!
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Quero receberMas depois desse disco vocês passaram a fazer uma música mais calcada na dance music e na house, não?
Hook - Bem, acho que a partir dali, principalmente o Bernard passou a se importar mais com a dance music. Ele não queria mais fazer uma música que combinasse rock e dance, queria fazer especificamente dance. E aí começaram muitas brigas entre a gente. Eu queria algo mais rock, ele queria algo mais dance. Foi aí que começamos a nos desentender seriamente. Porque houve momentos em que ele chegou para mim e disse: "Acho que nesta música você não precisa tocar". E eu respondia: "Eu faço parte da banda, como é que não vou tocar em uma música?".
Então as nossas diferenças começaram a emergir. Se você ouvir "Technique", a maior parte do disco é uma combinação de rock e dance. Claro, há "Fine Time", que é completamente dance. Mas mesmo em "Fine Time" eu dei um jeito de tocar, para a irritação dele, hahaha. Se você está em uma banda, é muito importante a química entre todos que estão ali. Você não pode chegar ao baterista e falar: "Hey, você não vai tocar nesta música". Uma banda não funciona assim. Mas Bernard não se importava, queria fazer apenas o que gostava. Aí as coisas começaram a ruir.
As músicas do Joy Division e New Order têm um som muito específico de baixo. Como você conseguiu criar uma marca tão única nesse instrumento?
Hook - Bem, quando começamos a tocar, éramos meio punks, e o Bernard tinha um excelente amplificador, um Vox UD30. Os Beatles costumavam usar, era meio raro e soava muito bem. Eu tinha um bem barato, que soava muito mal, eu não conseguia me ouvir direito. Então tinha que tocar muito alto e ficava até meio distorcido. O Ian (Curtis, falecido vocalista do Joy Division) adorava e pedia para seguir ainda mais alto. E foi assim que continuei a tocar. Foi desse jeito que toquei em "She's Lost Control", "Isolation", "Twenty Four Hours", "Insight", com o Ian me incentivando a tocar bem alto. E o Bernard querendo o contrário.
E olha a ironia: Bernard costumava morar perto de uma loja de instrumentos de música em Manchester que sempre tinha coisas muito legais: pedais, amplificadores. O Bernard me incentivava a ir à loja, porque eles tinham baixos incríveis, com seis cordas, e pedais que combinariam com o jeito que eu tocava. Ele me encorajou a comprar esse tipo de equipamento, aí anos depois vem me falar para não tocar em algumas músicas! Foda-se ele.
Li em uma entrevista que você afirma já ter encarado vários lutos: o da morte de Ian Curtis foi um deles, outro é o luto pelo New Order. Como é lidar com o luto de uma banda da qual você fez parte e que ainda existe (os três integrantes do New Order continuam excursionando pelo mundo)?
Hook - Quando nos separamos em 2007, foi quase um alívio, porque ninguém estava feliz. Fizemos um show para milhares de pessoas em Buenos Aires, foi incrível, mas nos odiávamos, então era até melhor nos separarmos ali. Aí comecei a tocar faixas do New Order e do Joy Division em 2010. E então os caras resolveram voltar como New Order, sem me avisar! Desvalorizaram a marca New Order. E me deram apenas 1% do que passaram a ganhar. Um por cento! Isso não era certo, então parti para a luta. Mas não é fácil uma luta de um contra três. Não consegui sustentar aquilo, financeiramente e psicologicamente.
Quando o Andy Rourke (ex-baixista dos Smiths) me disse que a pior coisa que havia acontecido a ele foi ter brigado na justiça com Morrissey (então vocalista dos Smiths) e Johnny Marr (guitarrista dos Smiths), eu achei que ele estava sendo dramático. Não é possível que isso tenha sido a pior coisa que aconteceu a ele. Mas quando eu estava brigando na justiça contra aqueles idiotas, entendi o que Andy tinha passado. Foi a pior coisa pela qual já passei. Foi muito frustrante e ridículo e sempre vou odiá-los por isso. Foi algo desprezível. Sei no fundo que eles não são o New Order. Eles tocam músicas do New Order, mas não são o New Order. Acho isso péssimo para os nossos fãs.
Como vê hoje o New Order e o Joy Division? Acha que tem bastante banda por aí que foi influenciada por vocês?
Hook - Sim, e acho maravilhoso. Quando começamos com o Joy Division, eu queria ser os Sex Pistols. Depois o Clash. Quando o Ian Curtis colocou para tocar um disco dos Doors, eu queria ser como eles. E depois como Lou Reed. Queríamos soar como todos eles. Mas tivemos sorte, porque soubemos usar esses caras como inspiração, mudar algumas coisas e criar uma música própria.
Olha que coisa: há poucos dias, me pediram autorização para o uso de "Atmosphere" na trilha de um filme com grande orçamento, um desses filmes de Hollywood. Vão nos pagar uma grana ótima. Aí eu lembro que em 1978 nós demos essa música de graça para o Sordide Sentimental (um selo francês). E fizemos isso apenas porque eles tinham lançado Throbbing Gristle, de quem éramos fãs.
Na época não nos importávamos muito, porque sabíamos que conseguiríamos compor músicas boas quase que diariamente. Éramos muito prolíficos. Foi assim até quando o Ian morreu. Lembro que nesse período da morte dele (em maio de 1980) tínhamos acabado de fazer "Ceremony", "ICB" e "In a Lonely Place". Estávamos a caminho de gravar um terceiro disco. Mas, bem, hoje não estamos mais naquela situação. Hoje nos pedem autorização e nos oferecem uma grana boa. Nesse sentido, as coisas melhoraram, né?
Peter Hook & The Light
Quando: terça, 27/8, às 22h
Onde: Audio (av. Francisco Matarazzo, 694, São Paulo, SP)
Quanto: a partir de R$ 250
Classificação: 18 anos
Ingressos à venda pelo site da Ticket 360 ou na bilheteria do Audio.
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