O que é ser judeu sefardita, como era Silvio Santos?
Colaboração para Splash
20/08/2024 05h30Atualizada em 20/08/2024 15h38
O apresentador Silvio Santos, que morreu no sábado (17) aos 93 anos devido a uma broncopneumonia causada por infecção por H1N1, se autoidentificava como judeu sefardita. Mas o que isso significa?
Os judeus sefarditas são "os judeus descendentes das antigas e tradicionais comunidades judaicas da Península Ibérica", segundo o Decreto-Lei nº 237-A/2006, publicado pelo Ministério da Justiça de Portugal, que regulamentou o direito à nacionalidade portuguesa.
Algumas dessas comunidades são mais antigas que a formação dos reinos cristãos dos próprios países — o que aconteceu no século 12, ainda segundo o governo português.
Em 1492, os reis católicos Isabel 1ª de Castela e Fernando 2º de Aragão assinaram o Decreto de Alhambra, expulsando os judeus — que já eram perseguidos pela Inquisição — da Espanha. Alguns deles se refugiaram inicialmente em Portugal, mas o rei Manuel 1º acabou os expulsando também do território português em 1496.
Há diferenças entre estes e outros judeus?
Documentos da Biblioteca Virtual Judaica, projeto da AICE (Empresa Cooperativa Americo-Israelense, na sigla original em inglês) — uma organização mantida pelos dois países que se autointitula apartidária e sem fundos lucrativos — situa a presença dos judeus na região da Espanha desde, pelo menos, o ano 305 d.C., quando a cidade de Toledo proibiu judeus de abençoarem plantações de não judeus. No entanto, há teorias de que os primeiros judeus já viviam na região desde os tempos do rei Salomão (entre 965-930 a.C.).
A mesma entidade também descreve os sefarditas como um grupo de mesmas crenças de outros judeus, mas com algumas diferenças nas práticas litúrgicas em relação aos asquenazes — membros de comunidades que se fixaram no Leste Europeu e na Alemanha. Entre elas estão diferentes pratos ou preferências por outras orações ou salmos em rituais específicos, como o casamento.
Antes da Inquisição, os sefarditas falavam o idioma ladino, uma mistura do hebraico com o espanhol. Esta linguagem teria sido levada pelos migrantes para a Grécia, Turquia, Bulgária, Romênia, França e para a América Latina, apesar de hoje estar presente também em Israel, através dos sefarditas que retornaram à região ao longo dos séculos.
O próprio Silvio revelou sua ascendência na tela do SBT na década de 1980:
O que contava Silvio sobre suas origens
De família judaica, Silvio contava ser descendente de Dom Isaac Abravanel, um dos responsáveis pelas finanças de Portugal e da Espanha, no século 15. "Meu nome é Senor Abravanel. É Senor porque o homem que me deu origem consertou as finanças de Portugal. Depois, foi chamado pelos reis católicos Isabel e Fernando, era o Dom Isaac Abravanel, consertou as finanças da Espanha", explicou Silvio em um de seus programas.
Após a Inquisição, Isaac Abravanel foi para a Grécia. Silvio é o primogênito de um casal de imigrantes judeus da região da Grécia. "Depois, quando chegou a Inquisição, os reis católicos disseram: "Você fica e o povo judeu vai". E ele falou: "Não, o povo judeu vai e eu vou junto". E foi para a Grécia, de lá então, meu pai e meu avô tiveram o título de Senor Dom Abravanel, e aqui no Brasil não existe Dom. O título que meus antepassados ganharam, no ano de 1490 e poucos, o Dom Isaac Abravanel, foi um dos que deu dinheiro para que Colombo viesse descobrir a América".
O pai de Silvio, Alberto Abravanel, optou por Senor, após dizerem que 'Dom' seria frescura. "Então, no Brasil, disseram para o meu pai: "Dom é frescura", então ele colocou Senor Abravanel. Senor quer dizer Dom Abravanel".
Assista ao relato de Silvio:
A jornada de Isaac Abravanel
O site do movimento chassídico Chabad-Lubavitch reconhece Isaac Abravanel como um judeu ilustre, que teria vivido entre 1437 e 1508. Nascido em Portugal, ele teria sido bem-educado e influente, mas se viu obrigado a fugir do país quando o rei João 2º começou a decapitar os nobres com poder durante o reinado de seu pai.
Na corte espanhola, ele se tornou uma espécie de tesoureiro e consultor financeiro até a expulsão em 1492. Sua primeira parada teria sido Nápoles, hoje na Itália, mas a captura do reino pelos franceses o obrigou a partir para a Sicília e, mais tarde, para a ilha de Corfu, na Grécia. Isaac teria perdido sua fortuna nas diversas fugas, mas mais tarde viria finalmente a estabelecer moradia em Veneza, onde ganhou prestígio entre os governantes até o fim de sua vida. Ele estaria enterrado em Pádua, também na Itália.
Não se conhece o restante da árvore de Isaac ou de Silvio, mas o apresentador teria sido descendente de Isaac e de outros Abravanel que se fixaram na Grécia. Seu pai era Alberto Abravanel, judeu sefardita nascido na cidade grega de Tessalônica, e sua mãe era Rebecca Caro, também judia sefardita nascida em Esmirna, hoje parte da Turquia.
Atualmente, o governo de Portugal reconhece a presença de sefarditas não só no Brasil, como nos Países Baixos, Turquia, Reino Unido, Norte da África, Argentina, México e EUA.
No entanto, a documentação oficial da República Portuguesa nota que os "cristãos-novos e judeus portugueses que conseguiram escapar" estabeleceram-se, no primeiro momento, no Mediterrâneo (Gibraltar, Marrocos, Sul de França, Itália, Croácia, Grécia, Turquia, Síria, Líbano, Israel, Jordânia, Egito, Líbia, Tunísia e Argélia), norte da Europa (Londres, Nantes, Paris, Antuérpia, Bruxelas, Roterdã e Amsterdã), Brasil, Antilhas e EUA, onde "criaram sinagogas notáveis", entre elas a Sinagoga Tzur Israel no Recife.