Após 16 anos de hiato, The Cure volta fiel a suas velhas trilhas sonoras

"Épica e emocionante", na definição do "NME", o mais importante portal de música do Reino Unido. "Algo majestosamente envolto em sofrimento e desespero", assim descreveu o jornal britânico The Guardian. Essa foi a grandiosa recepção dada a "Alone", primeira canção lançada pela banda The Cure em 16 anos.

O mais importante na liberação digital do single, nesta semana, é que ela vem acompanhada da notícia de que o novo álbum da banda, "Songs of a Lost World", será lançado em 1º de novembro. O disco anterior do Cure é "4:13 Dream", que chegou às lojas em 27 de outubro de 2008.

Na verdade, "Alone" não chega a ser uma novidade. Ela é apresentada nos shows desde o final de 2022. Já esteve no setlist da banda em 90 concertos, inclusive na passagem do The Cure por São Paulo em 2023, no Primavera Sound, em 3 de dezembro. Robert Smith e seus colegas abriram com ela o show no autódromo de Interlagos.

Naquela noite, o público ficou surpreendido com a longa introdução musical da canção. Demorou alguns minutos para Smith começar a cantar a letra que fala de desolação, do fim de mundo, de solidão.

Agora, com o single disponível em várias plataformas, surpreende mais ainda ver que a performance paulistana não exibiu uma versão especial para a apresentação ao vivo. A música é assim mesmo na gravação de estúdio. "Alone" tem praticamente sete minutos e o vocalista demora três minutos e 28 segundos para abrir a boca.

Nesse show no Primavera, "Alone" e mais duas músicas foram anunciadas como parte do futuro álbum, na época chamado de "Lost World". São elas "And Nothing Is Forever" e "Endsong", esta escolhida para fechar a parte inicial daquele show, antes que a banda voltasse duas vezes para o bis, numa apresentação que por muito pouco não chegou a três horas de duração.

"Endsong" ainda vai mais fundo nessa estética de uma longa abertura instrumental. Em São Paulo, a música durou mais de dez minutos, e Smith ficou dedilhando a guitarra sem ir ao microfone pelos primeiros seis minutos.

Essas três canções que devem estar no álbum novo compartilham as letras melancólicas e o andamento arrastado e às vezes hipnótico da música. De certo modo, poderiam se encaixar no álbum "Desintegration", de 1989. Uma das obras-primas da banda, esse disco foi uma volta ao rock gótico do início da carreira, no final dos anos 1970, e também tem um punhado de faixas muito longas.

A extensão das músicas é uma discussão importante neste lançamento, porque nesses 16 anos de hiato fonográfico do Cure o cenário musical mudou completamente. A audição de álbuns inteiros foi abandonada pelos mais jovens, que optaram pelos singles em playlists e, o que é mais radical, pelo consumo de música no TikTok, que consegue contemplar apenas trechos de canções ou peças realmente muito curtas.

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The Cure é, definitivamente, uma banda de álbuns, alguns deles essenciais para entender os caminhos do rock britânico. Cada um deve ser consumido como uma proposta completa. Pode ser considerado exceção um período breve, na segunda metade dos anos 1980, quando a banda enfileirou hits com músicas de apelo pop, mais curtas e até mais alegres, como "The Caterpillar", "In Between Days", "Close to Me" e, já em 1992, a irresistível "Friday I'm in Love".

Além das três músicas mostradas no show em São Paulo, outras duas canções incluídas nas turnês recentes foram prometidas como faixas do novo álbum. "I Can Never Say Goodbye" se aproxima totalmente das outras, em frases instrumentais repetidas à exaustão, quase em looping, e mais uma letra de desencantamento. Mas "Another Happy Birthday", com pouco mais de três minutos, é mais uma canção solar de uma banda conhecida pelo mundo sombrio que habita.

Nos comentários em plataformas pelo mundo, os fãs, que comemoram loucamente o lançamento, destacam que a voz de Robert Smith está tão forte quanto há 40 anos. Pela audição do single, parece que sim. Mas com os recursos técnicos atuais de gravação é difícil saber se isso corresponde à realidade. Nos shows recentes, ele demonstrou alguma dificuldade para reproduzir o frescor vocal de outrora.

Num balanço final de tudo que "Alone" possa indicar, fica a certeza de que os fãs terão um Cure fiel a suas velhas trilhas sonoras em "Songs of a Lost World". Agora é esperar até novembro para ver se Robert Smith tem surpresas escondidas debaixo do casacão preto.

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