Coringou? Conheci Joaquin Phoenix e até agora não sei se era um personagem
"Oi, pessoal. Tem chiclete no meu sapato." Essas são as primeiras palavras que ouço de Joaquin Phoenix quando ele entra na suíte do hotel onde faríamos uma entrevista sobre "Coringa: Delírio a Dois" —eu, ele e mais três jornalistas. "Ah, não é chiclete. É fita crepe", continua o ator, retirando o adesivo da sola de seu All Star preto novíssimo.
A primeira coisa que eu penso é que ele é mais baixo do que eu imaginava. Com meu 1,70 m e uma sandália plataforma de 5 cm, sou definitivamente mais alta que ele. A segunda é que preciso quebrar o gelo com uma piadinha: "Fita crepe é melhor que chiclete", sorrio. Ele não ri, só dá início à entrevista: "O que vocês têm para mim?"
Estamos todos sentados em torno de uma mesa redonda no 14º andar de um hotel de luxo em Beverly Hills. A sala não é muito maior que a mesa, mas a claridade de uma enorme janela faz o ambiente parecer mais amplo do que realmente é. Encarregada da primeira pergunta, questiono o ator sobre a relação do Coringa com a música e com o público de Gotham. Sua reação me surpreende: talvez por saber que não há câmeras ligadas, ele deixa escapar um suspiro cansado de quem já passou a manhã fazendo outra rodada de entrevistas.
"Essa é uma boa pergunta. Vejamos... Não sei responder isso agora. Vou só começar a falar, vamos ver no que vai dar", diz, passando a mão pelo rosto. É aí que percebo: ele ainda está segurando o pedaço de fita crepe que estava no sapato. Curioso. Phoenix explica que, no primeiro filme, seu personagem foi do isolamento completo à euforia da fama. No segundo filme, o encontramos na ressaca de tudo isso, mas ainda não sabemos como afetou a mente do palhaço.
"É aí que ele conhece a personagem Lee, interpretada pela... Como é o nome dela, mesmo?", ele brinca. Damos risada, mas ele fica em silêncio por tanto tempo que começo a questionar se era brincadeira mesmo. Quando alguém diz "Lady Gaga", ele sorri e continua: "Interpretada pela Stefani [Germanotta]. Aí ele realmente ganha vida e, literalmente, reencontra sua voz". Só mais tarde, na entrevista com a atriz e cantora, percebo que citar o nome real de Gaga foi a forma de Joaquin chamar atenção para as semelhanças da colega com seu personagem.
A entrevista continua. Estou sentada ao lado do ator e, passada a adrenalina da minha vez de perguntar, começo a reparar nos detalhes: além do tênis que virou sua marca registrada, ele veste calça jeans e um moletom meio desgastado, ambos pretos. Consigo ver a famosa cicatriz em seu lábio superior, que tanto chama atenção nos filmes. Na vida real, no entanto, o que chama a minha atenção mesmo é o pedaço de fita crepe que continua em sua mão esquerda.
Às vezes, quando faço um filme, quase não quero que seja lançado. Ou quero que seja lançado com condições: posso explicar para eles? Posso assistir com eles e explicar por que cada coisa acontece? Joaquin Phoenix
Com o fim da primeira rodada de perguntas, chega minha vez novamente. Decido arriscar e perguntar sobre o final do filme. De forma muito educada, ainda que incisiva, ele se recusa a comentar o spoiler: "Ainda não vi o filme, então não sei o que acontece. Gravamos sete versões, não sei a qual você assistiu". Novamente, sem saber o que é brincadeira ou não, rio e tento elaborar, mas ele corta o assunto com contato visual intenso: "Vou precisar deixar essa de lado. Mas você pode fazer outra pergunta".
Pergunto sobre os fãs que passaram a idolatrar sua versão do Coringa após o primeiro filme, e se isso afetou sua interpretação no segundo. Ele começa a explicar que tenta não deixar o amor dos fãs mudar sua relação com o personagem, mas logo para de falar e se levanta da cadeira. "Vamos apagar essa luz. Estamos desperdiçando energia. Ninguém quer isso, não entendo por que isso acontece", se irrita o ator, desligando todos os abajures e luminárias da sala —que, em defesa dele, não faziam muita diferença no ambiente iluminado pelo sol da janela.
Um contexto dos bastidores: entrevistas de divulgação de filmes costumam ser ambientes extremamente controlados e cronometrados. Joaquin interromper os minutos contados de conversa para apagar as luzes da sala é o suficiente para desorientar todo mundo, sinal que ele interpreta como uma deixa para encerrar a entrevista: "Pessoal, vocês são ótimos. Muito obrigado. Com quem vocês vão falar depois de mim?". Nesse momento, uma pessoa da produção entra na sala e avisa que ainda temos oito minutos. Como se fosse uma resposta normal, o ator aponta para a fita crepe em sua mão: "Não era chiclete, era fita adesiva!".
Um pouco achando tudo engraçado e um pouco com medo de sermos xingados por não o deixarmos ir embora, continuamos a entrevista até o fim do tempo. Se fica irritado, o ator não deixa transparecer. Ele explica por que a sequência é um musical e diz que se sentiu intimidado ao assumir um papel com tantos grandes intérpretes.
Ao final dos 20 minutos reservados para esta entrevista, se despede novamente, dessa vez de uma forma inusitada: ele cruza o pé sobre o joelho, cola novamente a fita crepe na sola do All Star, agradece a todos e vai embora.
* A repórter viajou a convite da Warner Bros. Pictures
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