Tatuadoras ressignificam cicatrizes em série: 'Mudança de fora pra dentro'
A brasileira Raquel Gauthier e a russa Margarita Sultanova são especializadas em cobertura de cicatrizes com tatuagem. As profissionais, que também formam um casal, protagonizam a série documental "Sobre Essa Pele".
O programa mostra o processo criativo, os bastidores desses trabalhos e reconta as histórias traumáticas que geraram as cicatrizes dessas mulheres. Há histórias de acidentes, incêndios e automutilação.
Em entrevista a Splash, Raquel e Margarita falam das exigências emocionais e técnicas do trabalho exibido na série:
As duas se especializaram juntas na área, com o desejo de se conectar mais emocionalmente com a arte de tatuar. "Participamos de um projeto em São Paulo, no setembro amarelo, onde tatuamos pessoas que se automutilaram. Isso despertou o desejo de me especializar nessa área. Quando pesquisei, vi que não tinha tatuadores especializados, e não só em tatuar, mas em acolher a história, a dor das pessoas. Nos especializamos nisso a partir de um desejo emocional de trabalhar com isso", diz Raquel.
O trabalho não exige apenas técnica, mas um cuidado com a natureza delicada das histórias que as pessoas levam ao estúdio. "A questão principal no nosso trabalho é a empatia e saber ouvir. Às vezes, a pessoa está compartilhando uma história com você, desabafando, e ela não quer uma solução. Ela só quer ser ouvida. Às vezes, ela não contou apra ninguém essa história. Então, menos solução e mais empatia ao ouvir", diz Raquel.
Elas também precisam ficar atenta ao impacto que essas histórias têm nelas mesmas. "As histórias nos impactam sempre positivamente, porque estamos dando um novo significado para aquelas marcas. As histórias mais pesadas, precisamos aprender a ouvir, validar e acolher a cliente, mas não trazer muito para dentro, senão podemos ser influenciadas [negativamente]", completa Raquel.
Segundo a dupla, as cicatrizes mais complexas de tatuar são as de queimaduras. "A queimadura geralmente é uma cicatriz extensa", avalia Margarita. "A cicatriz de queimadura é irregular, então algumas partes são mais finas e outras mais grossas e rígidas. É preciso entender a cicatriz para ter segurança na hora de traçar", explica Raquel.
A dupla enxerga a tatuagem como uma ferramenta poderosa para a autoestima e para a mudança. "É uma mudança interna através do externo. Quando a gente faz terapia, é uma mudança interna, e depois vai mudando o nosso externo. Aqui, pelo contrário", explica Margarita.
A tatuagem é uma ferramenta extremamente poderosa para fazer essas mudanças emocionais, porque sempre baseamos o desenho nas referências da cliente, no que ela gosta, nos elementos que ela quer usar para ressignificar algo. Sempre vai ser algo no poder dela, da cabeça dela. Isso é muito poderoso. Margarita Sultanova
Raquel acredita que a tatuagem pode fazer com que as clientes se reconectem com partes do corpo esquecidas ou ignoradas. "É uma forma de autocuidado, de recuperar a autoestima, de trazer um novo significado para uma história que carrega tanta dor, tanto trauma. É uma oportunidade de a pessoa se reconectar com uma parte do corpo que às vezes ela deixou de lado, talvez não queria olhar", diz.
Margarita, que é russa, se apaixonou pelo Brasil e já se naturalizou brasileira. "[Quando vim pela primeira vez], fiquei apaixonada pelas pessoas, pelo acolhimento, pela mentalidade aqui. [...] Acabei de receber a minha naturalidade, estou muito orgulhosa. Sou brasileira e vou tatuar uma bandeira do Brasil porque amo esse país", conta.
A série "Sobre Essa Pele" será exibida no Discovery Home & Health e lançada nesta quinta-feira (24) na Max. Em 28 de novembro, outros seis episódios serão lançados. No Discovery, os dois primeiros episódios serão exibidos nesta quinta. Depois, toda quinta, será lançado um episódio por semana, sempre às 20h30.
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