Responsável por 'Thriller' e 'We Are The World': quem foi Quincy Jones
Colaboração para Splash
04/11/2024 12h21
Morreu neste domingo (3), aos 91 anos, o músico e lendário produtor Quincy Jones, responsável por enormes sucessos como o álbum "Thriller", de Michael Jackson, além de parcerias com Milton Nascimento e Frank Sinatra. Ele teria morrido em casa, mas a causa da morte não foi revelada, segundo o jornal The New York Times.
Quem foi Quincy Jones?
Nascido em Chicago em 1933, Jones fez seu primeiro contato musical aos 14 anos quando conheceu Ray Charles. O pianista tinha 16 anos quando Quincy o viu tocar pela primeira vez em um clube e se tornou a principal inspiração no início da carreira do produtor — especialmente como ele superava limitações por causa de sua cegueira para se aprimorar.
Jones estudou na prestigiada Berklee College of Music, em Boston. Ele acreditava que a falta de formação musical era o principal problema de músicos da atualidade. Em entrevista a Vulture, em 2018, relembrou como John Coltrane era obcecado por um livro de teoria musical, o "Thesaurus of Scales and Melodic Patterns" e o carregava a todo lugar, sempre estudando novas formas de composições e melodias.
Início com Elvis. Um dos primeiros trabalhos profissionais de Quincy Jones, ainda nos anos 50, foi como membro da banda de Elvis Presley durante suas primeiras aparições musicais na tevê. Ele tocava o segundo trompete, mas acabou caindo na estrada com outro trompetista, o gigante do jazz Dizzy Gillespie. Como diretor musical e instrumentista da turnê, ele veio parar na América do Sul.
O produtor construiu boa parte de sua carreira trabalhando com músicos de jazz e realizando trilhas sonoras de filmes. Ele alcançou sucesso nos anos 60 fazendo arranjos para Ella Fitzgerald, Peggy Lee, Aretha Franklin, Frank Sinatra, Sarah Vaughan, Duke Ellington, entre outros. Teria sido ele o responsável a trazer o "swing" para o relançamento de "Fly Me To The Moon", antiga valsa de Sinatra.
Frank Sinatra me levou a um novo planeta. Trabalhei com ele até sua morte em 98. Ele me deixou o anel dele. Nunca tiro. Agora, quando vou à Sicília, não preciso de passaporte, apenas mostro meu anel. Quincy Jones, em entrevista ao jornal Las Vegas Review-Journal, em 2013
Na mesma década, começou o caso de amor de Jones com a música brasileira. Em 1962, ele lançou o álbum "Big Band Bossa Nova", com suas versões para canções de Tom Jobim, Vinicius de Moraes, Ronaldo Bôscoli, Carlos Lyra, entre outros, combinados a composições e arranjos de jazz. Entre as faixas do lançamento estavam clássicos da Bossa Nova como "Chega de Saudade", "Desafinado" e "Samba de Uma Nota Só". Ele ainda compôs a sua própria versão para o nosso estilo com a canção "Soul Bossa Nova".
Desde 1967, Quincy e Milton Nascimento eram grandes amigos. Bituca lamentou a morte do produtor nas redes nesta segunda (4) e disse que "a saudade será eterna". "Quincy foi um grande admirador e disseminador da música brasileira pelo mundo, e produziu muitos dos discos mais emblemáticos e importantes da história da indústria musical. [...] Descanse em paz, querido irmão", escreveu.
Gilberto Gil e Caetano Veloso são os reis [da música brasileira]! Sabe, eu visito as favelas todo ano. Aqueles filhos da p*ta têm uma vida dura. Mas são fortes, apesar de tudo. Você acha que a nossa m*rda na América é ruim? É pior lá. Quincy Jones, em entrevista a Vulture, em 2018
Quincy Jones ainda tocou e produziu música com outros brasileiros. Entre seus nomes favoritos estavam Simone — que considerava "uma das maiores cantoras do mundo", segundo o programa Flash (Band) de 2006 —, o ícone da Bossa Nova Sérgio Mendes, o percussionista Paulinho da Costa e o cantor e pianista Ivan Lins, com quem trabalhou na canção "Dinorah, Dinorah", lançada por George Benson.
Nos anos 80, Jones, Paulinho e Ivan se viram em um imbróglio. O produtor convidou os dois brasileiros para participarem do álbum "Thriller", de Michael Jackson, um dos principais sucessos comerciais da carreira de Jones. Eles haviam criado a canção "Novo Tempo" para o disco, mas a colaboração não foi adiante porque o contrato foi considerado ruim para os músicos. "Tomamos um porre para não assinar", relembrou em entrevista a Pedro Bial em 2021.
Aqueles contratos padrões, que eles mandam primeiro pra ver se cola, 'estão doidos pra ficar com a gente, não vão nem ler', cabeça de advogado. Vítor [Martins, compositor e parceiro de Ivan] leu, Paulinho leu, decidimos beber pra não assinar". [No telefone com Quincy], 'Paulinho explicou que o contrato era absurdo, maldoso. Aquilo era uma maldade'. Ivan Lins no 'Conversa com o Bial' (Globo) em 2021
Anos mais tarde, Quincy Jones reclamou que Michael Jackson não costumava pagar de maneira justa seus colaboradores. "Ganancioso, cara. [Ele era] ganancioso. 'Don't Stop 'Til You Get Enough' — [o tecladista] Greg Phillinganes escreveu a seção c. Michael deveria ter dado a ele 10% da música. Mas não aceitava", relembrou ainda a Vulture em 2018. Ele ainda revelou que o Rei do Pop costumava "roubar" músicas ou trechos de outros artistas. "Ele era tão maquiavélico quanto qualquer outro".
Mesmo assim, Michael Jackson e Quincy Jones voltaram a trabalhar juntos três anos depois. Em 1985, Quincy atuou como regente e produtor na canção "We Are The World", uma faixa beneficente em álbum do mesmo nome lançada pelo supergrupo USA for Africa, com grandes nomes da música como Steve Wonder, Tina Turner, Paul Simon, Diana Ross, Bruce Springsteen, Cyndi Lauper, Bob Dylan e Ray Charles, entre outros. Considerada a oitava música que mais rendeu dividendos da história, a composição de Jackson e Lionel Ritchie levantou fundos para a erradicação da fome na Etiópia.
Também em 1985, Jones deixou de apenas realizar trilhas para atuar como produtor de cinema. Ele compôs toda a música do clássico "A Cor Púrpura", de Steven Spielberg. Teria sido ele o responsável por "estourar" a carreira de Whoopi Goldberg. Nos anos 70, ele já havia trazido Paulinho da Costa para colaborar em outra trilha icônica, a do musical "O Feiticeiro", com Diana Ross e Michael Jackson.
Ele também ficou conhecido pelo jeito irreverente e afirmações polêmicas ao longo dos anos. Segundo Jones, o presidente americano John F. Kennedy foi assassinado pelo mafioso Giancana — as investigações concluíram que Lee Harvey Oswald agiu sozinho — e os Beatles eram péssimos músicos. De acordo com ele, Cyndi Lauper deu trabalho nas gravações de "We Are The World" porque suas pulseiras causavam ruídos no microfone, Paul Allen (co-fundador da Microsoft) sabe tocar e cantar como Jimi Hendrix e Marlon Brando teria transado com os músicos James Baldwin e Marvin Gaye.
Ao longo de sete décadas de carreira, Jones acumulou 28 prêmios Grammy e 80 indicações. Ele é o terceiro maior vencedor e o segundo em nomeações, apenas atrás de Beyoncé, com 88. Outras conquistas curiosas de sua carreira incluem a produção da série "Um Maluco no Pedaço", que lançou Will Smith e sua participação no Carnaval do Rio, desfilando pela Portela em 2006.
O produtor deixa sete filhos, entre eles a atriz Rashida Jones e a modelo Kenya Kinski-Jones. Casado três vezes, ele foi pai com cinco mulheres diferentes. Rashida é filha de sua terceira esposa, Peggy Lipton; já Kenya é fruto de seu namoro com Nastassjia Kinski. Ele também dizia ter namorado Ivanka Trump, filha de Donald Trump, quando ela tinha 24 anos.