'Após coma, reaprendi a andar e desfilei no Miss Brasil': conheça a Miss RO
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Há um mês, a modelo e dentista de formação Cris Leite, 51, desfilou no palco do Miss Universe Brasil 2025 fazendo história: foi a primeira mulher com mais de 50 anos candidata na disputa. Ela não conseguiu classificação, mas isso não diminui a importância da sua participação. Após ficar em coma em 2018 devido a uma queda, ela se recuperou, reaprendeu a andar e agora levanta suas bandeiras no mundo da moda.
Convite direto
Cris fez parte do grupo de candidatas do Miss Brasil que representou estados que não eram os seus de origem. A regra é permitida porque não houve concursos estaduais. Nesse caso, ela nasceu em São Paulo e representou Rondônia na disputa nacional, que aconteceu em 13 de fevereiro. Gabriela Lacerda, do Piauí, uma das mais jovens da competição, foi a vencedora.
A dentista recebeu convite diretamente da organização para participar do concurso. Segundo ela, a decisão de se tornar miss aconteceu recentemente, quando viu a oportunidade de levantar bandeiras sobre etarismo e representatividade. "É uma plataforma grande. Eu fui chamada por eles, para poder representar o estado de Rondônia. Eu fui convidada", contou para Splash.

Apesar da representação, Cris não possui nenhum laço com Rondônia nem nunca viajou para o estado. Contudo, ela não esconde a vontade de visitá-lo. "Já morei no Nordeste, em Fortaleza, mas não conheci Rondônia [no Norte]. Acredito que foi uma escolha deles mesmo. Tive que estudar bastante sobre o estado para o concurso".
Ainda que a vontade de ser miss nasceu apenas agora, quando o Miss Universo retirou o limite de idade de 28 anos e permitiu mães, mulheres casadas e divorciadas, Cris já teve uma miss na família. A mãe dela, Maria José de Souza, foi Miss Turismo na cidade de Itatiba, município próximo de Campinas, no interior paulista.
Apesar de ser convidada para representar o estado de Rondônia, Cris pagou os custos de inscrição e materiais. Ficaram a cargo dela os pagamentos de itens como faixa e coroa de miss, reservas de hotel, vestido e maquiagem, totalizando cerca de R$ 30 mil.

Renascimento
Nascida em São Paulo, Cris foi morar em Campinas com 12 anos com a família. Em 1998 se formou em odontologia na PUC-Campinas e morou 4 anos em Fortaleza. Hoje, ela é divorciada e mãe de três filhas: Isabella, 19, e as gêmeas Gabriela e Manuela, de 13.
Quando as filhas mais novas tinham 7 anos, ela sofreu um acidente, que mudou sua vida. Ela sofreu uma queda durante um passeio em um shopping e sofreu fratura no crânio e em outras 11 partes do corpo.
Em outubro de 2018, eu estava passeando em um shopping em São Paulo, aguardando uma amiga minha da época da faculdade. Um homem atrás de mim tropeçou e caiu em cima de mim. Eu não tive como segurar no corrimão nem nada, eu estava descendo a escada rolante do shopping e eu caí de frente com o rosto [no piso]... acabei fraturando o meu crânio e tive 11 fraturas em 11 partes. Foi um processo muito difícil.

Foram dez dias em coma até voltar para casa. A mãe cuidou dela e das filhas: "Cheguei de cadeira de rodas na casa da minha mãe. Foi um processo muito difícil voltar a andar, porque eu andava de muleta, de bengala, depois eu tinha que apoiar no ombro de alguém. Eu perdi totalmente a referência do equilíbrio".
Cris acumulou sequelas: fraturas no lado direito afetando o equilíbrio, desenvolveu hiposmia (perda parcial do olfato), tem o lado esquerdo "anestesiado" e reaprendeu a andar. "Passei por esse processo de recuperação por um ano. (...) Foi quando eu voltei a recobrar a consciência e a entender [o que passei após ficar] em coma uns 10 dias no hospital. Reaprendi a andar. Na verdade, eu voltei a entender o que eu era".

Após o acidente, ela fechou a clínica odontológica que comandava, e já não conseguia trabalhar como dentista. "[Toda] vez que eu entrava no consultório, sentia uma depressão muito grande, não fazia mais sentido. Eu pensava: 'eu sou um milagre e estou levando a mesma vida de ficar dentro do consultório?'. Eu não via mais sentido. Fiquei feliz que vivi, grata por reviver, mas como eu vou renascer e viver a mesma coisa?", questionou-se.
Cris viu, então, que precisava voltar ao começo e buscou retomar sua primeira profissão, a de modelo. "Eu nunca deixei a arte fugir da minha vida. Durante minha adolescência, eu fazia aulas de teatro, gostava de tirar foto, tive banda de música. Só que eu não pude continuar porque o meu pai não deixava. Ele falava: 'não, você não vai ser modelo, vai fazer odontologia'. Eu fui obedecer ao meu pai".
Não posso esquecer que a odontologia me deu um grande respaldo financeiro. Eu cresci dentro da odontologia, cresci financeiramente, construí minha casa. Quando quis voltar a ser modelo, comecei a perceber que o mercado estava mais inclusivo com mulheres grisalhas. Foi muito rápido. Eu entrei em uma agência aqui em Campinas, fiz uma propaganda, imediatamente já fui para São Paulo, a Ford Models me chamou, eu fiz muitas e muitas propagandas em São Paulo.
Cris Leite, modelo, dentista e Miss Universe Rondônia 2025

Bandeira de vida
Cris encontrou um problema em ver modelos jovens fazendo trabalhos direcionados para um público mais velho. "Quando a mulher mais velha olha uma mulher mais nova fazendo um produto que ela vai usar, ela fica vendo aquilo e fala assim: 'mas eu não sou assim, eu não tenho essa pele'. Comecei a observar que, no Brasil e no mundo, havia falta de representatividade desse público 50+"
Atualmente, ela está na agência 40 Graus Models. Foi em meio a reintrodução no mercado como modelo que ela aceitou participar do Miss Brasil. "Tenho como missão trazer a representatividade para o mundo da moda e publicidade e transformar esse trabalho das mulheres 50+, que são extremamente pontuais, como no Dia das Mães por exemplo, e levar para o trabalho diário, porque a mulher 50+ consome todo dia e continua existindo".

A participação — e desfile no Miss Brasil — foi vista como oportunidade. "O concurso é uma plataforma mundial. Eu vi ali um local muito importante para falar sobre etarismo, poder falar sobre representatividade. Achei isso maravilhoso. (...) Tive comentários do público me valorizando, agradecendo por eu estar ali. O público se sentindo representado."
Apesar de ter feito história e do engajamento, Cris Leite não fez parte do grupo de candidatas classificadas para as etapas seguintes do concurso, mesmo com empate que transformou o Top 13 em Top 14. "Eu realmente fiquei triste, muito triste, porque eu tinha certeza que poderia ir muito mais longe. Era um mix de sentimentos muito grande".
Agora, a luta não para: enquanto as 50+ não tiverem representação nesse gigante [mercado] do nosso país, não tem como parar essa luta. É muito bom, porque eu estou sendo chamada em campanha para todo o Brasil. Muitas marcas já estão acordando, mas eu preciso que isso não seja passageiro. Quero o trabalho para todas as modelos 50+.
Cris Leite, modelo, dentista e Miss Universe Rondônia 2025

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