Efeito 'O Gambito da Rainha': como série levou a explosão de interesse pelo xadrez
As medidas de confinamento pela covid-19 e a minissérie "O Gambito da Rainha", da Netflix, geraram um entusiasmo "espetacular" pelo xadrez on-line, afirmou à AFP o grande mestre indiano Vishwanathan Anand.
Ao contrário de muitos esportes, que sofreram as consequências do confinamento neste ano, o xadrez experimentou um boom fenomenal, de acordo com a plataforma Chess.com, que teve 2,5 milhões de novos registros apenas em novembro.
A paixão por este esporte cerebral foi acentuada em outubro com o lançamento de "O Gambito da Rainha" na Netflix, que teve "um efeito espetacular", diz Anand, elogiando "a qualidade do tratamento" de sua modalidade na série.
A história é uma adaptação do romance homônimo de Walter Tevis, publicado em 1983 e inspirado na carreira do campeão americano Bobby Fischer.
A ação se passa nos anos 1950-1960 e narra a ascensão meteórica de uma órfã de Kentucky, Beth Harmon, propensa a vícios, no mundo do xadrez, então quase exclusivamente masculino.
Graças a esta série de sete episódios, algumas pessoas, "sentadas no sofá de sua casa, descobriram o xadrez", celebra Anand, falando por telefone de Chennai (ou Madras, no sul da Índia), onde reside.
O xadrez já havia feito sucesso durante o confinamento. "Agora, mais de 13 milhões de pessoas jogam on-line", afirma o jogador de 51 anos, atualmente 16º no ranking mundial, terceiro na Ásia e primeiro na Índia. Em sua carreira, ele ganhou cinco campeonatos mundiais.
'Federer ou Maradona na sua sala'
Melhor jogador de xadrez da história da Índia, ele teve o privilégio de enfrentar os maiores, como os famosos russos Garry Kasparov e Vladimir Kramnik, e o israelense-bielo-russo Boris Gelfand.
Para ele, a internet permitiu tornar o xadrez universal. "Qualquer pessoa, mesmo quem não conhece as regras, pode jogar on-line", afirma Anand, garantindo que "é uma experiência adaptável a todos os públicos".
Aos 30 anos, o grande mestre conquistou seu primeiro título mundial sênior, em 2000, três anos depois da derrota histórica do supercomputador Deep Blue para o campeão mundial Kasparov.
"Eu estava em uma geração de confluência. Quanto tinha 17 anos, apareceu a primeira base de dados de xadrez. E, desde então até hoje, sempre trabalhei consideravelmente com computadores", conta.
"Mudaram a forma como estudamos o jogo. Qualquer indivíduo, mesmo que seja um jogador ruim e esteja isolado, está sentado diante do melhor enxadrista mundial, sempre disposto a responder a qualquer dúvida", explica.
"É um pouco como ter Roger Federer, ou Diego Maradona, na sua sala dizendo 'vou te ensinar o que você quiser'. O impacto dos programas de xadrez é equivalente", compara.
Durante o confinamento, Anand ficou três meses preso na Alemanha, onde disputava um torneio, muito longe de sua casa, à espera de um voo de volta para a Índia.
Neste ano em particular, ele se deu conta dos limites da tecnologia e da total necessidade da troca humana. Nada será capaz de reproduzir, e muito menos de substituir, a sensação e o clima de um torneio ao vivo, a experiência e a intensidade do confronto cara a cara.
"Para jogar de verdade, você tem que conhecer a impressão de estar sentado em uma sala, sentindo toda tensão que tem nela", ressalta. "Preciso me lembrar de tudo isso. Foi uma pausa muito, muito longa. Nunca antes a atividade mundial havia sido reduzida a este ponto".
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