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Por onde andam os músicos que passaram pelo secos & molhados?

Leonardo Catto e Mateus de Albuquerque, especiais para AE

06/08/2023 09h00

O álbum de estreia do Secos & Molhados, com a icônica capa da mesa de jantar e a música Sangue Latino na faixa de abertura, completa 50 anos em agosto de 2023. Os rostos de Ney Matogrosso, João Ricardo, Gerson Conrad e Marcelo Frias, servidos em bandejas, formam uma das principais imagens no imaginário do fã de rock brasileiro. Porém, nesse banquete já foram servidas outras cabeças ao longo da história do grupo.

Claro que os integrantes de 1973, especialmente Ney Matogrosso e João Ricardo, sempre tiveram muito o que falar sobre a história de uma das bandas mais importantes do Brasil. Eles foram, sem dúvida, os ingredientes principais, bastante ouvidos e apreciados. Mas e os acompanhamentos nas outras formações da mesa?

PARADEIRO. A discografia da banda seguiu por anos depois, sempre sob o comando de João Ricardo, e sem Ney Matogrosso, com integrantes menos conhecidos e que tiveram trajetórias distintas.

Nesta reportagem, o Estadão mapeia o paradeiro de alguns músicos dos álbuns de 1978, 1980 e 1988, entre quem seguiu na música e quem ficou desconhecido. Duas mortes no anonimato, sobre as quais pouco se sabiam, estão nos relatos.

Integrantes tentaram novos projetos, desistiram de outros e se desiludiram

Em 1977, na casa da irmã de João Ricardo, estava reunida o que seria a nova formação do Secos & Molhados, quatro anos após o primeiro álbum. O baixista João Ascensão e o guitarrista Wander Taffo haviam tocado com João no disco solo Da Boca Pra Fora (1976). Eles indicaram o baterista Gelson Fernandes, da banda Os Incríveis.

Já o vocalista Norival Rodrigues, alto e com vocal similar ao de Ney Matogrosso, tinha vindo de uma banda de Campinas, a Pedra de Sal. Marcos Maynard, na época produtor da Polygram, teve contato com a Pedra e achou interessante fazer a ponte entre a banda e João Ricardo, mirando a volta do Secos. Do conjunto, aproveitou-se somente Norival. Na conversa, entrosaram-se todos. Alguns ganharam apelidos, de autoria do próprio João Ricardo: Norival virou Lili; Gelson, Gel.

O álbum em nada lembrava a atmosfera soturna do Secos pregressos, acenando para a febre disco. O baterista faltou à sessão fotográfica, pois estava em turnê com Os Incríveis. A gravadora, preocupada com o fato de que o encarte teria a foto de um quarteto, enquanto a banda seria um quinteto, limou Gel dos créditos, e o colocou como "músico convidado".

Um clipe foi gravado para o que seria o hit do álbum, Que Fim Levaram Todas as Flores?. O vídeo foi exibido no Fantástico, da TV Globo, anunciando a volta do grupo. João Ricardo chegou a dizer que agora era uma banda "mais consistente". De Mim para Você seria outro sucesso do álbum, parte da trilha sonora da novela Te Contei?.

O FIM. A projeção midiática não se traduziu em espetáculos. "Estourou a música, foi tudo legal, mas poderia ter tido mais se a gente tivesse shows", conta Gel. Segundo a versão de Ascensão, o fim começou com um plano de internacionalização do grupo, a partir de uma versão em espanhol de Que Fim Levaram Todas as Flores?.

Lili, então, organizou com os demais integrantes a participação nos lucros da banda. Todos recebiam só cachês. João Ricardo recusou e a banda se desfez. Já Beto Rodrigues, amigo de Lili dos tempos da Pedra de Sal e que o acompanhou durante a sua passagem pelo Secos, conta que a principal questão foi artística: o grupo queria participar mais nas composições.

O histórico de João Ricardo é coerente com o relato de Gel e Beto. Para João, o Secos & Molhados é um projeto pessoal, idealizado ainda antes da formação com Gerson e Ney. Todos os músicos, para ele, eram auxiliares à sua visão.

Gel Fernandes, João Ascensão, Lili Rodrigues e Wander Taffo montaram o um novo projeto, contando com o apoio de Beto Rodrigues, nas letras, a Sobrinhos da Rainha. Uma brincadeira com a postura imperial de João Ricardo, conta Beto. O grupo grava um fonograma de 11 faixas, mas não cativa interessados em transformar aquilo em álbum. Sem shows, frustrados e quebrados, a banda minguou, e o material foi perdido.

Mais tarde, João Ascensão desembarcou. Não queria mais saber de música e retomou a faculdade de Engenharia Elétrica, profissão que exerce hoje. Ele desmontou o baixo com o qual gravou o groove de De Mim Pra Você e o jogou fora. Wander Taffo e Gel Fernandes foram chamados para a banda de Rita Lee. Os dois fundaram, mais tarde, o Rádio Táxi. Wander morreu em 2008, de mal súbito. Gel Fernandes está até hoje na banda.

O paradeiro de Lili Rodrigues era um grande mistério. O jornalista Alberto Villas tentou localizá-lo, sem sucesso, para o Fantástico, em 2003. A última aparição pública de Lili foi em uma nota do Estadão, em 1982, sobre uma apresentação do cantor na Praça da Sé. Beto era grande amigo de Lili.

Segundo ele, após o insucesso dos Sobrinhos, Lili se desencantou. Depois, afundou-se em uma jornada autodestrutiva com drogas. Beto o acompanhou por um tempo, mas afastou-se. "Escapei desse turbilhão e segui minha vida", lembra. Algum contato foi mantido, especialmente nas ligações de madrugada que Lili fazia.

Lili ainda tentou montar alguns negócios, como uma loja de roupas, e trabalhou em bares de Campinas como cantor, diz João, sobrinho de Lili que esta reportagem conseguiu localizar. Em 2010, o músico morreu de cirrose, em decorrência do uso intenso de álcool e drogas, quando João tinha 18 anos. "Eu quis me afastar tanto que acabei me afastando da minha própria memória. Eu não me conformo", arrepende-se Beto. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.