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Acusado de assédio e importunação sexual desde 2020, Marcius Melhem tenta provar que a relação com Dani Calabresa era consensual. Para isso, usa na estratégia de defesa cerca de 270 mensagens trocadas com a humorista pelo WhatsApp. Esta coluna teve acesso aos autos da investigação, em que estão os diálogos. As conversas mostram clima amistoso entre eles e indicam, inclusive, flertes recorrentes. Em uma delas, eles falam sobre beijos em uma festa. (veja na íntegra abaixo e no vídeo).
Ao menos 27 conversas entre o ex-diretor da Globo e a atriz, datadas de 2016 a 2019, constam dos autos da investigação. Além disso, pelo menos 12 testemunhas ouvidas pela Polícia Civil negam em depoimento que houve assédio de Melhem a Calabresa. Cerca de dez outras afirmam que sabiam que havia assédio, mas que nunca presenciaram.
A coluna acompanha o caso há 15 meses e decidiu publicar as mensagens após a obtenção dos autos da investigação, pois elas são fundamentais para ajudar a esclarecer o que houve. As conversas mostram a relação entre Melhem e Calabresa antes de a humorista procurar a Polícia Civil, em 2020. Desde o início das investigações, no entanto, estão em segredo de Justiça.
Em sua defesa, Calabresa diz que "fingia não perceber os excessos" e tinha "sentimentos de medo, receio e de ojeriza". Ela afirma que "fingia normalidade para preservar sua carreira" e também acusa Melhem de tê-la prejudicado na Globo. Em seus depoimentos, o ator admite que "deu em cima" de Calabresa após sua separação de Marcelo Adnet, em 2017, mas nega ter assediado ou feito algo de agressivo ou nocivo a ela. Melhem, que estava solteiro desde 2016, também alega que Calabresa retribuía com mensagens e atitudes positivas -como ter-lhe mostrado nudes e, muitas vezes, mandado textos de cunho erótico a ele. Essas conversas constam dos documentos.
As trocas de mensagens usadas por Melhem em sua defesa
Calabresa alega que desde que chegou à Globo, em 2015, Melhem "teve comportamento inadequado, usando a informalidade do meio artístico para agir de forma inapropriada com suas subordinadas", inclusive "não raro excedendo em toques, apertos, tentativas de beijos e comentários lascivos constrangedores".
Para se defender dessas acusações, ele utiliza conversas da época com o intuito de mostrar ter relação de intimidade com a atriz no período.
A primeira troca de mensagens à qual a coluna teve acesso é do dia 27 de novembro de 2016, às 21h59. Ela é utilizada pelo diretor
Calabresa: Obrigada, você me trouxe para trabalhar, mas vc não tem ideia de como sou feliz no Zorra. 2 anos de um trabalho feliz demais! OBRIGADA (emojis com beijinho e corações).
Melhem: Meu amor. Eu que agradeço a confiança. Fico feliz demais com a sua indicação. Tá só começando. Vamos juntos (emoji de coraçõezinhos)
Nudes no celular
Em uma troca de mensagens, em 1º de junho de 2017, à 0h00, ela escreve:
Calabresa: Obrigada mil vezes por lembrar de mim (emoji coração) melhor convite
Melhem: Te amo sem você me mandar um nude, olha que puro! É nosso! Eu sou eternamente grato por confiar em mim. E vou te fazer muito feliz. Ainda na globo. Tá só começando
Calabresa: Ahahahahaha mostrei sem vc pedjirrrr!!!! Agora vou ter de mandar pro Cinti, pra dá força.. caralho viu rs (emoji triste e coraçãozinho).
Melhem: Hahah pqp! Mostrou e eu lembro de cada detalhe? sofrendo com Cinti e mais gente querida (nota: eles se referem ao ator Claudio Cinti, demitido da Globo havia pouco tempo)
Calabresa: Te amo Marcius obrigada MIL VEZES!!!!!!! Beijo!!!!!!
Melhem: (emoji de coração e beijinho)
Ainda sobre as acusações de comportamento inadequado, Calabresa conta que, durante uma festa na casa do diretor Maurício Farias, em 17 de abril de 2017, Melhem "arrancou" o celular de sua mão quando soube que ela tinha nudes. A atriz diz que ficou constrangida porque ele começou a olhar as fotos e fazer comentários "lascivos". Duas testemunhas negaram em depoimento que Melhem tenha "arrancado" ou pegado o celular da mão dela. Declararam que Calabresa estava mostrando as fotos - e demonstrava alegria ao fazê-lo.
Em sua mais grave acusação, Calabresa diz que, em 4 de novembro de 2017, numa festa da equipe do "Zorra", no Rio, Melhem tentou forçá-la a entrar num banheiro com ele. E que os atores Luis Miranda e George Sauma correram para protegê-la. Sauma negou em depoimento que isso tenha ocorrido. Afirmou, ainda, que só soube da "história de assédio" pela revista Piauí. Miranda ainda não depôs. Duas pessoas que estavam no local e foram ouvidas pela reportagem dizem ter visto a cena e que tudo parecia consensual. Calabresa nega.
Melhem se defende utilizando o diálogo abaixo, no dia seguinte à festa, e afirma que ele e a humorista chegaram a se beijar de forma consensual.
Melhem: Ei, Dani! Se você lembra o que a gente falou ontem? rsrs ?esse recado prova que a gente trocadia mensagens no dia seguinte (coraçãozinho). Adorei toda maluquice da festa de ontem (emoji de um dançarino e de uma placa 'proibido para menores de 18). O que você não lembrar eu te conto (piscadinha). Beijo, Marcius (o que não é nada frio).
Calabresa: Meu Deus bom dia rs (emojis de macaquinhos tampando os olhos). Não lembro o que a gente "falou", só dos 7 GINS que eu tomei? E de alguns beijos (macaquinho, coração, gotinhas)
Melhem: Hahah bom dia. Eu, como não bebo, lembro de mais um pouquinho. Dos beijos e de algumas coisinhas mais. Adorei toda a loucura de ontem. Entendeu por que não fico nas festas? Eu fico bêbado junto. Manda beijo pra Maíra. Pessoal tava combinando uma festinha/videokê lá em casa sábado que vem, dia 11. Bora? (emojis de piscadinha e beijinho)
Calabresa: Tô saindo do Zorra (macaquinho) ahahah. Mas embalo minha amiga Maira num plástico bolha e mando pra sua casa (piscadinha)"
Os dois se referem à executiva Maira Perazzo, amiga de Calabresa, que também beijou Melhem naquela noite. Ela foi embora com a atriz quando a festa acabou e depois voltou para São Paulo, onde mora. No mês seguinte, voltou ao Rio e ficou na casa do ator. Em seu depoimento, Perazzo afirmou que não viu assédio e que Calabresa não comentou nada com ela naquela madrugada. Disse que a atriz "poderia ter bloqueado" (as memórias), pois "só falou coisas boas".
Quase um mês depois, no dia 2 de dezembro, Melhem e Calabresa voltam a falar sobre o assunto:
Calabresa: Vamo fazer TESTE (emoji de festa) ahah pra ver quem consegue beijar Clarinha, me pegar no colo com cauda de sereia e ajudar no parto do Magdão ahahah
Melhem: Moleza pra mim #emalgumaencarnaçãojáfuigalã
Calabresa: Ahahahah Deus te deu vários dons (emojis de berinjela, uma loira e gotinhas azuis)... Desculpa, o emoji certo era esse (microfone) Ahaha
Melhem: HHahhaaha não era não. Assume o elogio, pô!
Como estão as investigações
A Globo investigou internamente a denúncia de assédio feita em dezembro de 2019 por Dani Calabresa contra Marcius Melhem, seu então chefe. As investigações foram feitas pelo DAA (Departamento de Desenvolvimento e Acompanhamento Artístico), que não constatou provas e encerrou o caso no início de 2020.
Ao saber da decisão, Calabresa procurou a Polícia Civil e recorreu ao compliance da emissora - o departamento assegura que as regras internas sejam cumpridas pelos funcionários. Após meses ouvindo testemunhas pró-Calabresa e pró-Melhem, o setor também arquivou o procedimento, como esta coluna publicou em janeiro deste ano.
Atualmente, há uma investigação de assédio e importunação sexual em andamento na Deam (Delegacia Especial de Atendimento à Mulher) no Rio; uma ação cível (movida por Melhem contra Calabresa, por danos morais e materiais); e outra ação movida por Calabresa contra o ex-diretor por ele ter divulgado mensagens trocadas entre ambos. Os três processos correm em segredo de Justiça e não foi definido prazo para que sejam finalizados.
Desde 2020, foram ouvidas cerca de 30 pessoas, tanto de acusação como da defesa, pelas autoridades. Entre elas, além de Dani Calabresa, outras seis mulheres acusam Melhem de assédio e importunação sexual, relação abusiva, abuso de poder, comportamento impróprio e constrangimento.
Pelo menos 12 pessoas negam em depoimento que houve assédio de Melhem a Calabresa ou às outras mulheres que o acusam. Cerca de dez outras afirmam que sabiam que havia assédio, mas que não viram. Todas trabalham ou trabalharam na Globo. Ainda há mais testemunhas a depor dos dois lados.
A pena para assédio sexual varia de um a dois anos de detenção, enquanto a de importunação sexual prevê de um a cinco anos de reclusão, por vítima. Na ação que move contra Calabresa, Melhem pede R$ 200 mil de indenização por danos morais, calúnia e difamação. Já o processo que ela move contra ele prevê multa e até prisão caso Melhem exponha publicamente mensagens trocadas entre os dois. Essa medida cautelar - que assegura à Calabresa que seus direitos ameaçados sejam preservados até que o julgamento ocorra - também vale para as outras mulheres.
Outro lado
Procurado pela coluna, o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, que representa Calabresa, afirmou que não se manifestaria "porque o processo segue em segredo de Justiça". O profissional ainda informou que falava em nome das outras acusadoras, cuja defesa conta ainda com as advogadas Beatriz Rizzo e Mayra Cotta.
Posteriormente, foi enviada a seguinte nota:
Marcius Melhem foi denunciado por assédio sexual e moral, perante a Ouvidoria Nacional da Mulher do Ministério Público, por 8 mulheres que eram suas subordinadas.
Por iniciativa do próprio Ministério Público as denúncias geraram uma investigação criminal e uma ação civil pública. As denúncias são respaldadas por depoimentos e provas sólidas. O sigilo dos autos protege provas que envolvem, inclusive, a intimidade de terceiros.
Atacar as vítimas e tentar desqualificá-las é, infelizmente, uma estratégia comum de acusados de assédio, para silenciá-las e desencorajar novas denúncias. Uma repetição da violência, agora como ataque à reputação de quem fez as denúncias.
Nada justifica o assédio.
Almeida Castro, Castro & Turbay Advogados Associados
Battaglia & Vidilli Sociedade de Advogados
Davi Tangerino Advogados
Dias Rizzo Sociedade Individual de Advocacia
Zylbersztajn & Cotta Advogados
Os escritórios Oliveira Lima & Dall Acqua Advogados e Técio Lins e Silva, Ilidio Moura & Advogados Associados informou que "Marcius Melhem segue afirmando que o sigilo não o favorece, e que por ele tudo seria aberto, às claras e transparente. Mas, enquanto houver sigilo, ele será respeitado".
Em nota, a Globo informou que não tolera qualquer forma de assédio. "A Globo tem um código de ética, que deve ser seguido por todos os colaboradores e igualmente por todas as áreas da empresa - e em nenhuma delas é tolerada qualquer forma de assédio. Da mesma forma, tem uma ouvidoria pronta para receber quaisquer relatos de violação, que são apurados criteriosamente, usando todas as evidências a que o compliance tem acesso. Não podemos detalhar nossos processos de apuração, pois são internos e porque, pelo mesmo código, assumimos o compromisso de sigilo a todos os colaboradores, assim como o de investigar, não fazer comentários sobre as apurações e tomar as medidas cabíveis".
Ricardo Feltrin no Twitter, Facebook, Instagram e site Ooops
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