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Termina amanhã a validade das cinco concessões de televisão do Grupo Globo: São Paulo, Rio, Distrito Federal, Recife e Belo Horizonte.
A Globo pediu ao governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) a renovação da concessão por mais 15 anos. No passado, Bolsonaro ameaçou criar obstáculos à continuidade das transmissões da empresa, mas a decisão caberá ao Congresso Nacional.
Até que haja uma resposta sobre a solicitação, a Globo continua no ar, beneficiada por uma lei aprovada em 2017 que permite que as emissoras sigam operando com a concessão vencida, desde que tenham feito o pedido de renovação.
É a lei também que dita o rito a partir de agora e o que Bolsonaro pode fazer caso realmente pretenda impor obstáculos à renovação. Neste momento, o Ministério das Comunicações, a quem foi direcionado o pedido, avalia a documentação apresentada pelo Grupo Globo e envia um parecer ao Palácio do Planalto.
O presidente da República toma uma decisão com base nessa análise e propõe ao Congresso Nacional o que acredita que deva ser feito com o pedido - renovar, ou não, por mais 15 anos a concessão. Deputados e senadores votam a proposta.
O processo no Congresso é relativamente simples. Tanto na Câmara quanto no Senado, a aprovação pode ocorrer sem que nem sequer haja uma votação no plenário, apenas em comissões.
Só haverá uma votação entre todos os 513 deputados se o presidente recomendar a não renovação - ou se indicar a renovação, mas uma das comissões da Câmara que trata do tema (Constituição e Justiça e Ciência e Tecnologia) votar pela negativa do pedido.
Aprovado na Câmara, o pedido de renovação vai ao Senado, onde é votado na Comissão de Ciência e Tecnologia em caráter terminativo - sem a necessidade de votação em plenário.
É possível que, caso seja reeleito no dia 30 e com uma bancada reforçada a partir de fevereiro, o presidente Jair Bolsonaro leve adiante o plano de propor ao Congresso o veto à Globo. Não é impossível. Mas não é algo fácil, simples e nem provável que ocorra por alguns motivos.
O que se sabe com certeza é que, amanhã, a Globo e suas afiliadas vão continuar no ar exatamente como estão hoje.
Entre os motivos para essa afirmação estão:
Motivo 1: a lei
As regras que orientam a concessão federal de rádio e TV foram instituídas em 1962 e são válidas para todas as emissoras, não são maleáveis para um tratamento caso a caso.
A primeira garantia é que a Globo não sai do ar na amanhã. A lei de 2017 simplificou a renovação da das concessões de rádio e TV instituiu o direito de continuar funcionando "em caráter precário" até que a renovação seja aprovada oficialmente.
A Constituição prevê um prazo de 45 dias para a Câmara e 45 dias para o Senado. Na prática, o tempo de tramitação usualmente é maior do que esse e, em alguns casos, chega a anos.
As concessões de rádios são renovadas a cada 10 anos. As das TVs, a cada 15 anos.
Motivo 2: os critérios
Bolsonaro certamente vai seguir jogando para sua "plateia" anti-Globo, mas, repetindo: hoje o chefe do Executivo não tem poder algum de decidir sozinho sobre a renovação ou não de um canal.
Para uma emissora obter a renovação ela tem de cumprir certas obrigações e requisitos legais: ter "idoneidade técnica, financeira e moral, (bem como ter) atendido o interesse público."
Até prova em contrário, a Globo se enquadra.
Motivo 3: as famílias poderosas e o lobby
Há resistência dentro do próprio Congresso Nacional a um veto à Globo.
Há vários congressistas, ex-congressistas, caciques e ex-caciques, além de empresários, que são "sócios", donos de afiliadas com interesses regionais na Globo.
Inclusive alguns são ferrenhos bolsonaristas, como Collor de Mello (que não se elegeu governador do Alagoas), cuja família é dona da afiliada da Globo naquele Estado.
Outra família influente, a Sarney, é dona da Globo Maranhão. Já no Ceará, a afiliada pertence ao influente grupo Queiroz. No Rio Grande do Sul, ao grupo Sirotsky.
Esses grupos jamais iriam querer o fechamento da Globo e sua substituição por outro grupo, exceto um conglomerado internacional, talvez. No Brasil não há nenhum grupo hoje capaz de substituir a Globo e seu padrão.
Isso sem falar na reação que dezenas de milhões de telespectadores fiéis da emissora teriam. Não seria fácil.
Os negócios da Globo
Há ainda outro importante "detalhe". Algo que o Grupo Globo fez com competência nos últimos 15 anos (coincidentemente, desde a última renovação da concessão).
Embora a TV aberta ainda seja sua maior fonte de receitas (mais de R$ 10 bilhões do total de R$ 14 bi faturados no ano passado), o Grupo Globo já se expandiu para muitos outros setores lucrativos da economia.
Por exemplo, em 2017 virou uma das donas da Órama, uma enorme e bem-sucedida empresa de investimentos.
Ela também está iniciando a participação em investimentos internacionais (inclusive e também no sistema financeiro).
O grupo tem ainda a maior rede de canais pagos e o maior serviço de streaming do Brasil. Sem falar em um megaportal, rádios e editora.
São setores que não podem sofrer nenhuma intervenção numa democracia e no livre mercado. A Globo também começou a vender série de ativos valiosíssimos nos últimos anos, inclusive sua sede em São Paulo.
Como esta coluna publicou com exclusividade em junho, há também fortes rumores no mercado financeiro de que possa vender também o chamado Projac, no Rio (o grupo nega).
Enfim, ao contrário dos demais grupos de comunicação, aos poucos a Globo está deixando de depender exclusivamente da TV aberta.
Ela está obtendo consideráveis receitas levando seus anunciantes para a internet, faturando com assinaturas (e publicidade também) no streaming e com o mercado financeiro.
Nova lei de telecomunicações vem aí?
Por fim, a Globo está liderando um poderoso lobby em andamento para que o Congresso aprove no próximo ano uma nova lei de telecomunicações.
O desejo de quase todas as emissoras é que, em vez de 30%, conglomerados internacionais possam comprar até 100% dos veículos brasileiros de mídia. Todas as TVs são favoráveis, exceto a RecordTV (falarei sobre isso em outra coluna).
Podem imaginar grupos como Paramount, NBC ou Disney donos de um canal aberto no Brasil, e a programação que fariam?
Seria uma nova era: o fim da TV aberta (cambaleante) como a conhecemos
Pela lógica, independentemente de quem for o próximo presidente, com ou sem a sonhada "regulação da mídia" petista, com ou sem o ódio bolsonarista, o Grupo Globo provavelmente continuará forte, saudável e independente por uns bons anos.
Seja com a TV aberta ou não.
Ricardo Feltrin no Twitter, Facebook, Instagram, site Ooops e YouTube
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