OBITUÁRIO-Camelô, comunicador e bilionário, Silvio Santos tem história que se confunde à da TV brasileira

Por Eduardo Simões

SÃO PAULO (Reuters) - Um dos principais comunicadores do Brasil, além de empresário e magnata da TV, Silvio Santos morreu neste sábado aos 93 anos, em decorrência de broncopneumonia após infecção por influenza.

Ele deixa um império empresarial que inclui a segunda emissora de TV mais importante do país e que, durante seu auge, foi capaz de incomodar a hegemonia da Rede Globo.

"Hoje o céu está alegre com a chegada do nosso amado Silvio Santos", afirmou a emissora SBT, em post na rede social X.

"Aquele sorriso largo e voz tão familiar será para sempre lembrada com muita gratidão. Descansa em Paz que você sempre será eterno em nossos corações."

Silvio Santos estava internado no Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, desde o início de agosto, após contrair H1N1.

Nascido no bairro da Lapa, região central do Rio de Janeiro, então capital federal, filho de imigrantes judeus vindos do extinto Império Otomano, Senor Abravanel, seu nome verdadeiro, descobriu seu tino para os negócios na adolescência, quando começou a ganhar dinheiro vendendo capas de plástico para títulos de eleitor em um Brasil que se redemocratizava após a ditadura de Getúlio Vargas no Estado Novo em 1946.

Foi nas ruas do Rio de Janeiro que sua voz chamou atenção e ele foi convidado a trabalhar no rádio, após ficar em primeiro lugar em um concurso de locutores da então Rádio Guanabara. A experiência foi curta, já que o que ganhava como vendedor ambulante era mais do que o salário na rádio, o que fez ele retornar ao comércio informal.

Aos 18 anos, Senor serviu o Exército na escola de paraquedismo em Deodoro e nessa mesma época também voltou ao rádio, atuando nas emissoras Tupi e Continental.

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Esta última tinha estúdios em Niterói, o que o obrigava a todos os dias pegar a barca que liga a cidade ao Rio e o levou a ter a ideia de seu primeiro empreendimento como empresário: instalou sistemas de alto-falantes nas barcas e comercializava propagandas, atuando como locutor. O negócio foi tão bem-sucedido que Senor decidiu deixar o emprego na rádio.

Na década de 1950, muda-se para São Paulo e retorna ao rádio, dessa vez na Rádio Nacional, atuando, em paralelo, como animador de circos. Em 1959 assume o Baú da Felicidade, que tornaria célebre ao longo dos anos e que fora criado por Manoel da Nóbrega, mas salvo de uma crise financeira por Silvio Santos, nome artístico que adotou ao participar de um programa de calouros no rádio. Sua mãe tinha dificuldade de pronunciar o nome Senor e o chamava de Silvio.

Seria a primeira empresa do que viria a se tornar o Grupo Silvio Santos, um conglomerado que inclui, além de sua emissora, o SBT, uma fabricante de cosmésticos, uma companhia de capitalização e interesses no setor imobiliário.

INÍCIO NA TV E SBT

Na década de 1960 começa na televisão, que vivia seus estágios embrionários no país. Atuou como apresentador na TV Paulista e na TV Tupi e, em 1963, iniciou o Programa Silvio Santos, até hoje no ar.

Em meados da década, a TV Paulista é comprada pela TV Globo e o apresentador passa a atuar pela principal emissora do país, tornando-se um dos campeões de audiência do canal.

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Ao sair da Globo em 1976, passou a apresentar seu programa na Record, na Tupi e na TVS Rio, cuja concessão havia conseguido.

Funda o SBT em 1981 e passa a ser o grande concorrente da Globo, inclusive contratando estrelas da concorrente, como Jô Soares, que apresentou seu talk show no SBT antes de retornar à Globo.

A emissora teve programas icônicos, como Topa Tudo por Dinheiro, Show do Milhão, o reality show Casa dos Artistas e Domingo Legal, apresentado por Gugu Liberato e que durante a década de 1990 disputava palmo a palmo a liderança na audiência com o Domingão do Faustão, comandado por Fausto Silva na Globo.

CANDIDATURA E SEQUESTRO

Em 1989, lança-se candidato a presidente da República pelo nanico Partido Municipalista Brasileiro, mas acaba tendo a candidatura cassada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) devido ao seu partido não ter atendido todas as exigência legais para obtenção de registro definitivo.

"Vocês vejam como é bom vivermos em um país democrático. Um garoto que era camelô, que começou vendendo carteirinhas para guardar o título de eleitor com 14 anos de idade hoje se lança candidato a presidente da República de um país como o nosso, o Brasil. Vejam como é bom viver na democracia, oportunidade igual para todos", disse à época em uma propaganda eleitoral na TV.

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Em 2001, a filha de Silvio Santos, Patrícia Abravanel, que sucederia o pai como apresentadora, é sequestrada na porta de sua casa, no Morumbi, bairro nobre da zona sul de São Paulo. É posteriormente libertada com pagamento de resgate, mas o sequestrador, após matar policiais em uma perseguição, invade a casa do apresentador e faz sua família refém, libertando posteriormente sua esposa e filhas e mantendo Silvio refém por sete horas.

O desfecho acontece somente após o então governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, comparecer ao local para garantir a segurança do sequestrador, que acabou se entregando. No ano seguinte, o sequestrador morreu sob custódia devido a uma infecção generalizada causada por um ferimento.

Em 2010, o Banco Central identificou um rombo nas contas no Banco Pan-Americano, então parte do Grupo Silvio Santos, fazendo com que o Fundo Garantidor de Crédito (FGC) socorresse a instituição em troca do conglomerado do apresentador assumir a responsabilidade pelo problema, dando empresas do grupo como garantia.

O caso foi investigado pela Polícia Federal e, no ano seguinte, o empresário vendeu o banco ao BTG Pactual, deixando de ser devedor do FGC e afastando risco da venda de outras empresas, incluindo o SBT. Em 2018 sete ex-executivos do banco foram condenados por fraude contábil.

Senor Abravanel deixa a esposa Íris e as filhas Cintia -- do primeiro casamento com Maria Aparecida, morta em 1977 --, Silvia -- adotada por ele durante o primeiro casamento --, Daniela, Patrícia, Rebeca e Renata -- do casamento com Íris.

(Reportagem de Eduardo Simões)

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