É ritmo de festa!

SBT faz 40 anos reforçando marca popular e com pergunta de R$ 1 milhão: quem substituirá Silvio Santos?

Felipe Pinheiro e Lucas Pasin De Splash, em São Paulo e no Rio Arte de Carol Malavolta/UOL em foto de Lourival Ribeiro/SBT

19 de agosto de 1981. Eram 9h30 quando o SBT (Sistema Brasileiro de Televisão) entrou no ar, ao vivo. A primeira transmissão mostrava a cerimônia de assinatura do contrato de concessão do canal Senor Abravanel, mais conhecido como Silvio Santos, direto de Brasília.

Hoje o SBT completa 40 anos e tem, diante de si, um panorama que parece incerto: Silvio Santos chegou aos 90 anos, e a empresa se aproxima, cada vez mais, de um modelo familiar de negócios.

Qual será o futuro do SBT?

Caso Silvio decida se aposentar em breve —o que não parece ser um plano—, o mais provável é que uma de suas filhas assuma o comando da emissora. Para João Paulo Hergesel, professor de pós-graduação na PUC-Campinas, a responsabilidade possivelmente ficará com Patrícia Abravanel.

"Como uma família circense, em que o comando vai passando de geração para geração, o SBT é um circo eletrônico. De tal modo, é natural que Silvio passe seu bastão para uma de suas filhas, possivelmente a Patrícia", arrisca ele, que também é autor dos livros "A Telepoética nas Produções do SBT" e "Estilo SBT de Comunicar".

Colunista de TV da "Folha de S.Paulo", Cristina Padiglione é direta: "O SBT não tem ninguém à altura para substituir Silvio Santos. Na verdade, ninguém tem".

A TV brasileira preparou bons apresentadores de auditório, mas ninguém tem o dom de vendedor do Silvio. Ele tem um didatismo que chega à compreensão da massa como nenhum outro comunicador. Mesmo na Globo, há profissionais muito bons e mais antenados com a realidade, mas nenhum deles tem o talento do Silvio.

O SBT é o xodó do Silvio. E a maior estrela do canal é o próprio dono. Eu vejo uma dependência muito grande. Os dois se confundem, você não sabe o que é um e outro. Quando ele nos deixar, será bem difícil. Nunca se falou no Grupo Silvio Santos no pós-Silvio Santos. Nunca foi assunto de reunião. Um dia isso vai acontecer, porque ninguém é eterno. E, quando acontecer, o grupo vai tomar as providências. Vejo que a Renata [Abravanel] vai ter muito trabalho, mas tudo na vida se conserta, se ajusta.

Guilherme Stoliar, sobrinho de Silvio Santos e ex-presidente do Grupo Silvio Santos

Caro presidente...

Silvio Santos sempre flertou com a política, tentando, inclusive, ser candidato à Presidência da República em 1989. E não poderia ser diferente no SBT: a emissora esteve diversas vezes associada aos governos que passaram pelo país. Durante a gestão de João Figueiredo, na ditadura militar, o canal passou a exibir "A Semana do Presidente", um programa que servia para que o governo divulgasse seus feitos. E esse palanque político segue até os dias de hoje, com Jair Bolsonaro (sem partido).

O professor Luiz Fernando Santoro, da área de televisão e telejornalismo da Escola de Comunicação e Artes da USP, ressalta que a histórica aproximação do SBT com os presidentes do Brasil não é algo restrito à emissora de Silvio Santos. "Acontecia desde a época da Tupi, com Assis Chateaubriand e Juscelino Kubitschek, e da Globo com os governos militares. Agora é com o Bolsonaro".

Mas o relacionamento próximo que o SBT vem mantendo com o governo Bolsonaro pode ser um fator importante para o futuro. A emissora abre espaço frequente para que o presidente fale de suas ideias e seus feitos —em junho, foram três aparições do presidente.

Isso abriu uma oportunidade para os outros canais, como o SBT, conseguirem uma fatia maior de publicidade. No momento em que o governo corta a publicidade da Globo de forma violenta, as emissoras correm atrás para conseguir um pedaço desse bolo, oferecendo apoio em troca de recursos. Essas emissoras conseguiram respirar novamente por causa desse investimento. Luiz Fernando Santoro.

A ligação de Fábio Faria

No ano passado, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) recriou o Ministério das Comunicações e anunciou o deputado Fábio Faria (PSD-RN) para o posto de novo ministro da pasta. À época de sua nomeação, a notícia causou desconfiança nas redes sociais pela ligação de Faria com a família de Silvio Santos, de quem é genro por ser casado com Patrícia Abravanel.

O que se sabe é que o o SBT é uma das emissoras privilegiadas na distribuição de verbas de publicidade, conforme mostra relatório do Tribunal de Contas da União de novembro. Houve aumento nos destinos de recursos ao canal de Silvio Santos, como comentou o professor da USP, Luiz Fernando Santoro.

Pela proximidade do ministro Fabio Faria com a família Abravanel, o desafio aos órgãos de controle é de fiscalizar um possível conflito de interesses. Santoro, por exemplo, não acredita neste cenário:

Não consigo enxergar de forma evidente o papel de um ministro como Fabio Faria nesse favorecimento em relação ao SBT. É muito mais evidente o empenho que ele tem de levar adiante, de forma equilibrada, a questão do 5G.

Divulgação/João Batista da Silva/SBT

Brincando de fazer TV?

O programa que estreia hoje pode não estar no ar amanhã, ou na semana que vem, e, quem sabe, pode mudar de apresentador, cenário e tema. O telespectador do SBT está acostumado a ver Silvio Santos "brincar com o controle remoto", e essa é uma das marcas históricas que a emissora carrega.

São vários os programas que tiveram vida curta no SBT, sendo que muitos deles passaram por todas as faixas de horário da programação. O "Charme", de Adriane Galisteu, por exemplo, foi exibido à tarde, à noite e até de madrugada, antes de sair definitivamente do ar.

Nilton Travesso, diretor do "Charme", se lembra que, no auge do descontentamento, Galisteu entrou no palco de pijama.

Ela começou a brigar com o Silvio, dizendo que não era aquilo que ela queria. Que era injusto o que ele estava fazendo. Foi um ano de desencontro. Silvio bateu na tecla que era um programa de que ele precisava na programação e que ela, como profissional, estava ganhando o suficiente para fazer o programa que ele gostaria.

Até mesmo quem possui ligação familiar com Silvio Santos está sujeito às mudanças de última hora. Silvia Abravanel, por exemplo, aprendeu tudo o que sabe de TV com o pai. Uma das primeiras experiências em frente às câmeras, como apresentadora, foi no "Programa Cor de Rosa", que durou apenas três meses em 2004.

"Não concordei com o fim do programa porque era o meu trabalho. Mas, como funcionária, eu não tinha muito o que fazer. Com o término da atração, voltei a ser produtora e, mesmo triste, eu estava grata por ter vivenciado mais uma grande experiência na televisão."

Tem na TV, mas não no SBT

Mas não foi só mudando a programação em cima da hora que Silvio Santos garantiu o sucesso do SBT ao longo de quatro décadas. Ele sempre esteve atento às novidades e nunca teve medo de arriscar. Foi com essa ousadia que ele furou o olho da TV Globo e lançou o primeiro reality show da TV brasileira, o "Casa dos Artistas".

Sem nenhum aviso prévio, o programa entrou no ar justamente quando a emissora carioca se preparava para lançar o até então inédito "Big Brother Brother Brasil". O SBT perdeu um processo judicial por plágio, mas, ainda que não pudesse mais refazer o "Casa" do jeitinho que o público conheceu, deixou sua marca.

'Casa dos Artistas' (2001), o maior sucesso disparado dos 40 anos do SBT - João Batista da Silva / SBT - João Batista da Silva / SBT
'Casa dos Artistas' (2001), o maior sucesso disparado dos 40 anos do SBT
Imagem: João Batista da Silva / SBT

Agora, fica a questão: por que um formato de reality de confinamento —ainda hoje tão explorado por outras emissoras— não voltou a ser produzido pelo SBT?

Diretor de planejamento artístico do canal, Fernando Pelégio opina que o sucesso de "Casa dos Artistas" pode ter tido um efeito contrário.

Não há como negar que esses formatos têm apelo de audiência e comercial. ['BBB' e a 'A Fazenda'] Foram os maiores sucessos de 2020. 'Casa dos Artistas' fez tanto sucesso que qualquer outro formato em comparação a ela já sai perdendo. Por isso é difícil voltar com um reality desse gênero no SBT. Mas, quem sabe um dia? — Fernando Pelégio.

"Quem vive de passado é museu?"

"Se o formato continua a ser desejado pelo público, não importa se foi criado há um dia ou há 50 anos. O público é senhor da TV Aberta. Nenhuma emissora lançou mais programas novos do que o SBT. Os maiores sucessos de todas as emissoras abertas no ano passado não foram os novos, foram os já existentes."

Eles surgiram no SBT! Você lembra?

  • Otaviano Costa

    Antes de fazer novelas e comandar o "Video Show", e agora o Otalab, o apresentador fez participações no programa infantil "Casa da Angélica", exibido no SBT em 1993.

    Imagem: Reprodução
  • Paolla Oliveira

    Muito antes de conquistar jurados e público da "Super Dança dos Famosos", na Globo, a atriz teve seus dias de assistente de palco no SBT e ajudava o apresentador Celso Portiolli no "Passa ou Repassa" em 1999.

    Imagem: Reprodução/Instagram
  • Bárbara Paz

    Após ganhar a primeira edição de "Casa dos Artistas", a atriz viveu a protagonista de "Marisol", em 2002. Ela ainda esteve em mais outras duas novelas da casa, "Cristal" (2006) e "Maria Esperança" (2007).

    Imagem: Reprodução/SBT
  • Bruno Gagliasso

    O ator fez muito sucesso ao participar de "Chiquititas" no papel de Rodrigo. Logo depois, em 2001, assinou com a Globo e integrou o elenco de "As Filhas da Mãe".

    Imagem: Divulgação
  • Tânia Mara

    Ela começou a carreira como dançarina e depois se tornou apresentadora do "Fantasia", no SBT.

    Imagem: Reprodução
  • Fernanda Vasconcellos

    Foi dançarina dos programas "Domingo Legal" e "Fantasia" antes de integrar o elenco de "Malhação", na Globo.

    Imagem: Reprodução/Instagram
  • Kayky Brito e Stefhany Brito

    Os irmãos estiveram juntos na telinha em "Chiquititas", no final da década de 90.

    Imagem: Divulgação - Reprodução/Instagram Kayky Brito
  • Mariana Ximenes

    A primeira novela da atriz foi "Fascinação", na tela do SBT.

    Imagem: Reprodução/Instagram @marixioficial
  • Ana Paula Arósio

    Estreou em "Éramos Seis", em 1994. Depois, ainda fez "Razão de Viver" e "Ossos do Barão".

    Imagem: Ana Ottoni/Folha Imagem
  • Gabriel Braga Nunes

    Ator fez sua estreia na novela "Razão de Viver", na década de 90, no SBT.

    Imagem: Globo/Ellen Soares

É gol do SBT

Com a produção parada durante a pandemia, o SBT foi um do canais que mais usaram reprises. Agora, na intenção de inovar, decidiu se voltar para o esporte e comprou os direitos de transmissão de campeonatos como a Copa América, a Liga Europa, a Libertadores da América e a Liga dos Campeões.

Será este o novo caminho da emissora de Silvio Santos?

Muitos podem não se lembrar, mas o SBT já marcou golaços em transmissões, com cobertura de Copas do Mundo e campeonatos nacionais. João Palomino, comunicador esportivo, ex-vice presidente de jornalismo da ESPN Brasil, foi repórter no time da emissora paulista e relembra.

A Copa do Brasil ganhou outra dimensão quando o SBT teve os direitos de transmissão na década de 90. Grandes jogos, times de camisa, tradicionais e de imensa torcida garantiram na época a atenção para a emissora. Equipe forte e bem informada. Corinthians e Grêmio na final marcaram 52 pontos de audiência (jogo foi disputado em 1995). No entanto, ainda que tenha sido sucesso de público, o futebol não era uma das prioridades da emissora. Talvez por isso e pelo altíssimo custo dos direitos e de produção, houve este enorme hiato.

E como fazer essa paixão nacional ser associada novamente ao SBT?

"O hábito e a conexão vêm muito rápido, porque o consumidor hoje circula pelos canais em que o time dele joga, independentemente de plataforma. Portanto, ter eventos, times e equipes gigantes, algo que o SBT conseguiu, se transforma naturalmente em sucesso", completa Palomino.

40 anos de SBT em 40 fotos

ROGÉRIO PALLATTA/ARQUIVO REVISTA CARAS

SBT seguirá como "emissora da família"

Nos últimos anos, a emissora buscou como campanha de marketing uma aproximação do público pelo afeto. O slogan "a emissora da família" faz sentido com os resultados de audiência do SBT, que, segundo uma pesquisa do Ibope em 2019, mostra que o canal é assistido de forma equilibrada por públicos de todas as faixas etárias.

De acordo com Fernando Pelégio, esta estratégia deve se manter para os próximos anos. E, por trás dela, está a família de Silvio Santos:

Não tem porque mudar. Criamos o tripé família, diversão e informação há uma década, Essa escolha passa muito sobre o que dona Iris [Abravanel, mulher de Silvio Santos] e as meninas pensam. Aliás, essa proposta partiu delas, principalmente da Daniela Beyruti [filha número 3 de Silvio e atualmente conselheira do Grupo Silvio Santos]. Foi um acerto, e elas serão o futuro do SBT.

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