De Splash, em São Paulo
A profissão pode até te sustentar, mas é cercada por problemas.
Para cada multimilionário no YouTube, muitos trabalham de domingo a domingo, sem folga, para pagar as contas.
Pressão por números, despreparo psicológico e rotina exaustiva os esgotam na casa dos 20 e poucos anos.
Quer ganhar dinheiro "fácil"?
Mas se é tão fácil, vem fazer. Se é tão fácil, por que não é todo o mundo que faz? - Malena, youtuber com 6 milhões de inscritos e 25 anos, conversou com Splash.
Ela começou aos 16 anos, publicou livro, deu palestra e cumpriu todo o script de um youtuber jovem... Mas não está bem.
Muitas vezes, o sorriso nos vídeos é forçado. É montanha-russa.
Se eu gravar com cara de c..., não vai ser bom. Preciso parecer alegre. Meu amor, faz um vídeo após algo traumático na sua vida. Você chorou a manhã inteira, cara inchada, voz trêmula... - Malena
Em agosto de 2020, Malena publicou esse vídeo no YouTube e assustou todo o mundo.
Ela abriu o coração sobre ter passado por problemas na vida pessoal, chorou e pediu desculpa por não ter conseguido trabalhar tão bem quanto gostaria.
O psicológico desmoronou:
É impossível ter um canal e uma vida saudável ao mesmo tempo. Se você mantém um canal ativo, dificilmente tem vida social e um psicológico pleníssimo - Malena
A vida muda muito rápido: de repente, jovens —munidos só de câmeras e ideias— deixam o anonimato e passam a ter uma responsabilidade sobre a qual seus pais não conseguem ensinar.
Ver seu canal explodindo é empolgante e assustador:
É difícil falar sobre isso porque o sucesso no YouTube é visto como um sonho. Como alguém poderia reclamar disso? É difícil alguém sentir empatia - Casey Neistat, famoso youtuber dos Estados Unidos
Quer "salário"? Torça para o vídeo ir bem: é trabalheira de quase 24 horas e pode dar prejuízo.
Malena não dorme sem ver as métricas e, quando o vídeo vai mal, fica tentando corrigir.
A internet não dorme, então você também não dorme. Não tem como fazer isso bem sem surtar. É visceral. Se eu quiser descansar, preciso trabalhar o quádruplo para tirar uma semana. - Malena
Haja energia física, emocional e criativa para lidar com tudo isso.
São cálculos do YouTube que fazem com que os vídeos sejam notados —ou não.
Você não sabe quando o algoritmo vai diminuir seu alcance. Você ama a plataforma e odeia não saber o que vai acontecer amanhã - Patriota, youtuber com mais de 1 milhão de inscritos
O brasileiro Davy Jones, do "GameplayRJ", publicava sete vídeos (ou mais) todos os dias; pelo menos 49 por semana. Para ele, funcionou bem.
Mas outros, como o "Mitico Jovem", dizem que o público passou a exigir mais do que conseguiam entregar.
É fundamental se exercitar e dormir direito —isso é o que vai deixar seus vídeos melhores.
Não seja essa pessoa:
Alguns editam vídeo às 4h da madrugada e tomam medicação para dormir à tarde. O sistema fica bagunçado - Luiz Scocca, psiquiatra
Enxaqueca, cólica ou dor de barriga? Nenhum desses três me coloca de molho. Precisa ser algo que me paralise. Se você para, não recebe. Se você some, some do algoritmo - Gabi Xavier, que tem 600 mil inscritos
Se você ainda acha fácil ser youtuber, ouça o que Gabi Xavier tem a dizer:
Jovens astros da internet têm muito trabalho, competitividade, disputa por like, emoções, glamour e nem sempre dinheiro. Na verdade, são exceções os que ganham algum - Luiz Scocca, psiquiatra
Não precisa ser um expert em psicologia para saber que toda essa instabilidade não deve fazer bem para a saúde mental, né?
A Síndrome de Burnout (que, desde 2019, é considerado transtorno mental) atinge youtubers. O médico Luiz Scocca, psiquiatra pelo Hospital das Clínicas da USP, atende muitos que trabalham na área:
O youtuber médio é um 'faz-tudo': planeja tudo, faz tudo, lida com haters e entra em exaustão.
Esse adorável pessoal que se dedica a criticar tudo o que você publica na internet e quer te fazer desistir de criar vídeos.
Em um belo dia, Malena sentiu fome e viu que precisava cozinhar.
Foi assim que ela começou a gravar vídeos cozinhando.
O público quer tudo mais mais rápido e fácil de digerir. Como produzir em grande escala um conteúdo original e transmitir todo o frescor criativo e orgânico que o YouTube tinha? - Mussoumano, rapper e youtuber
Alguns não abrem mão da qualidade do conteúdo.
Se eu me vendesse por dinheiro, seria melhor estar na empresa sentada, ganhando salário e vale, do que criando uma mentira. Não é o que eu faço - Gabi Xavier
Aos poucos, Malena vai lutando para recuperar o ânimo e o preparo psicológico que perdeu:
Sinto falta do que eu sentia, mas não sei se consigo sentir de novo. Acabei perdendo aquele brilhinho no olho. Mas nunca tive vontade de desistir, o YouTube é o meu plano A.
No vídeo de agosto, chamou atenção de Splash o fato de que Malena pediu desculpas aos seguidores por não ter trabalhado tão bem quanto gostaria.
Ela não é a única:
Cuidado com o perfeccionismo, tá?
Se vou regravar, peço desculpa por furar cronograma. Lido com uma culpa muito grande e preocupação com expectativas dos outros - Gabi Xavier
Pelo menos, Gabi está mais feliz hoje do que no trabalho anterior:
Não consigo me arrepender de forma alguma. Cada pequena conquista é uma grande felicidade e compensa muito o volume de trabalho.
No fim do dia, é importante ter uma relação saudável com o público, os likes e os dislikes.