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Journey

Claudio Prandoni

Do UOL, em São Paulo

28/03/2012 15h45

"Journey" é uma produção incrível e rara, do tipo que dispensa qualquer apelo comercial e cativa com simplicidade e elegância, tocando os sentimentos mais simples e profundos. Tecnicamente, é um jogo de beleza sem igual e uma mecânica tão bem pensada que transforma limitações em vitórias e elementos de narrativa.

Por fim, ainda há o elemento online, que proporciona momentos de solidão e companheirismo verdadeiramente únicos, tornando cada partida uma aventura diferente.

Não importa se você prefere jogos de tiro, ação, RPG, aventura, corrida ou o que for: "Journey" é obrigatório, ao menos uma vez. Você pode acabar odiando e deixar de lado, ficar sem entender ou se encantar a ponto de embarcar mais vezes nesta jornada, mas no mínimo esta viagem única terá algo a lhe dizer.

Introdução

No embalo dos sucessos de "Flow" e "Flower", a produtora thatgamecompany dá conta de um projeto ainda mais ambicioso em "Journey". De fato, o título transita na fina linha entre jogo e mostra artística interativa, oferecendo poucos perigos de falhar e perder, mas apresentando muitas oportunidades de evoluir e conquistar mais.

Você é uma figura envolta em panos que acorda no meio do deserto, sem ninguém à vista. Conforme avança, descobre os poderes de gritar e planar, fundamentais para progredir e alcançar seu objetivo: chegar a uma montanha distante e iluminada.

Eventualmente, um ou mais viajantes podem aparecer pelo caminho, sendo que todos são outros jogadores online e a única maneira de se comunicar é pelos gritos e movimentos do personagem - nada de chat por voz ou texto.

Com partidas que duram cerca de uma a duas horas, "Journey" é o tipo de obra que pede para ser apreciada de uma vez, em uma tacada só.

Pontos Positivos

Cativante

Não é todo dia que aparece um jogo como "Journey". Ainda mais rara é a ocasião de um estúdio ter a chance de fazer um jogo assim e se dar tão bem.

Formada por ex-estudantes de game design, a produtora thatgamecompany tem a rara condição de trabalhar em jogos com fins filosóficos. Mais importante do que conseguir lucros monstruosos ou cenas de ação eletrizantes, os trabalhos desse estúdio procuram discutir sentimentos, tocar o intangível, representar em gráficos o que sentimos e pensamos enquanto seres humanos - não apenas como jogadores de videogame.

"Journey" faz isso de forma minimalista e, diferente de "Flow" e "Flower", com figuras que lembram pessoas, com pernas, rostos e, principalmente, interações entre si.

Cada fase de "Journey" evoca sentimentos e sensações que variam da curiosidade e alegria suprema até medo, submissão e redenção. De cara, a metáfora com fases da vida é a que mais grita, mas aí está um dos grandes trunfos do game: menos é mais, e os cenários simplórios abrem espaço para diversas interpretações. A jornada é sua, e você a entende de forma única.

O toque de mestre vem com o multiplayer online, sutil e decisivo. A qualquer momento, meio que "do nada", outros viajantes podem aparecer no seu caminho e você dispõe apenas de gritos e movimentos para se comunicar. Um detalhe: ao ficarem perto um do outro, os viajantes renovam o poder de voar, o que permite explorar ainda mais do mundo.

Assim, quase que naturalmente, criam-se laços de carinho e amizade. Jogadores novatos encaram perigos juntos, veteranos ensinam o caminho das pedras - e dos tesouros! - para os novinhos. De forma brilhante, o cachecol de cada personagem (que indica o poder de voar e aumenta conforme se coleta símbolos brilhantes) reflete a experiência e conhecimento de cada viajante no mundo quase abandonado de "Journey".

O passeio é curto, com cerca de 1 a 2 horas para terminar, mas marcante. O caráter subjetivo das fases, a beleza da direção de arte contemplativa e linda trilha sonora, que convida à contemplação com temas graves e lentos, se combinam para criar uma experiência única. Os controles, simples e precisos, ajudam a tornar "Journey" acessível e atraente mesmo para quem não é muito fã de aventuras plataforma.

O impacto do final e, principalmente, de toda a travessia encarada em "Journey" depende muito de cada um, da interpretação dada aos fatos. Mas uma coisa é certa: é um convite irrecusável para fazer essa reflexão.

Pontos Negativos

Poucos colecionáveis

No decorrer da jornada é possível encontrar itens luminosos para aumentar seu cachecol (e seu poder de voar) e murais que contam a  história das misteriosas figuras do game - entre outras surpresas para fãs antigos da thatgamecompany.

Porém, jogando com atenção é possível encontrar tudo em uma ou duas partidas completas, tirando boa parte do incentivo para jogar novamente.

De fato, quem for fisgado por "Journey" não vai precisar disso: a imprevisibilidade do elemento multiplayer e a beleza da aventura em si já são o bastante para incentivar a jogar de novo por várias e várias vezes.

Talvez, a presença de mais itens e outros extras para abrir criassem oportunidades de mais jogadores se encantarem com o universo de "Journey" - se não for na primeira, quem sabe na segunda, terceira, quarta ou outra jogada.

Nota: 10 (Imperdível)