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Em meio a controvérsias, E3 mostra avanço das mulheres no mundo dos games

Victor Ferreira

Do UOL, em São Paulo

17/06/2015 13h30

Nos últimos anos, a indústria de games passou a ser criticada duramente por sua falta de representatividade nos games. Afinal, uma das principais diferenças entre os videogames e outras mídias é a possibilidade do controle direto de seus protagonistas, e em sociedades que ao menos tentam valorizar cada vez mais a diversidade, ter essencialmente o mesmo molde de um homem branco como herói em quase todos os jogos no mercado não agradam uma parte significativa do público.

O problema não se limita aos games – é só ver o número de filmes pipoca com protagonistas femininas produzidos nos últimos anos, ou comparar o abismo entre os salários dos atores e atrizes mais bem pagos de Hollywood –, mas acabou se tornando um dos maiores tópicos de discussão dentro e fora deste mundo após a controvérsia envolvendo o movimento GamerGate, que surgiu após detalhes da vida pessoal de uma desenvolvedora independente darem espaço a supostas críticas sobre falta de transparência na cobertura de jogos, mas que logo se mostrou como um veículo para atacar críticos e desenvolvedores com maior interesse em representatividade de mulheres na mídia.

Ironicamente, estes ataques só aumentaram o alcance e reconhecimento destes críticos, como Anita Sarkeesian, e seja como resposta a este movimento ou uma progressão natural de produtos criados para chamar a atenção de uma maior parte do público, a E3 2015 mostrou que heróis e heroínas podem dividir o palco facilmente.

A escolha é sua

Nesta E3, uma tendência fácil de se ver entre grandes títulos envolve a possibilidade de escolher entre homens ou mulheres como personagens jogáveis. Antes algo possível de se ver apenas em determinados tipos de jogo, principalmente RPGs ocidentais, agora empresas como a Bethesda, Microsoft e Ubisoft expandiram este conceitos para diversos gêneros.

Antes mesmo da feira começar, a Electronic Arts anunciou que "FIFA 16" traria seleções femininas ao game – certamente uma das maiores novidades na história da franquia, ou mesmo no gênero de jogos de esporte como um todo.

Já em "Dishonored 2", por exemplo, jogadores poderão controlar tanto o herói do jogo original, Corvo Attano, quanto Emily Kaldwin, que passou da jovem donzela em perigo do primeiro game para uma assassina tão capaz quanto sua contraparte masculina. Já em "Assassin's Creed: Syndicate", é possível escolher entre os gêmeos Jacob e Evie Frye.

Até mesmo "Call of Duty", uma das franquias mais lucrativas de qualquer coisa no mundo, dará a opção para o jogador customizar seu protagonista em "Black Ops III", incluindo a possibilidade de escolher entre um homem ou mulher. Já "Halo 5", mesmo sendo protagonizado por dois homens - Master Chief e o agente Locke – terá duas personagens femininas em cada esquadrão do game, que poderão ser utilizadas no modo cooperativo.

"For Honor", o recém-anunciado jogo de combate medieval da Ubisoft, também não se limitou apenas a homens como guerreiros, e será possível escolher um avatar feminino para lutar com espadas – o que não era tão incomum quanto se imagina, a julgar por exemplos como Joana D'Arc ou mulheres vikings.

Os RPGs também continuam a manter esta forte tradição, com o diretor Todd Howard deixando claro durante a conferência da Bethesda que "Fallout 4" poderá ter uma mulher como protagonista – mesmo que isto seja possível desde o primeiro jogo da série, na década de 90. E, embora ainda não se saiba muito sobre "Mass Effect Andromeda", a Bioware já confirmou que será possível escolher uma mulher como personagem jogável.

Futuro promissor

Além destes jogos, também se viu uma confiança maior por parte das produtoras nos jogos ao discutir e revelar mais sobre títulos protagonizados exclusivamente por mulheres.

Durante a campanha de marketing para o reboot de "Tomb Raider", por exemplo, representantes da Square Enix por muitas vezes não souberam como vender a nova versão de Lara Croft como heroína de ação, dando maior foco aos trechos iniciais do jogo, em que ela se mostra mais indefesa, e com declarações infelizes por parte dos desenvolvedores.

"Quando pessoas jogam como a Lara, elas não se projetam na personagem", disse o produtor Ron Rosenberg ao site Kotaku em 2012. "Sua reação é mais no sentido de 'eu tenho que protegê-la'. Há um tipo de dinâmica de 'Eu estou nesta aventura com ela e vou tentar protegê-la'".

A realidade do jogo, porém, era bem diferente, e agora com "Rise of the Tomb Raider" a Crystal Dynamics e a Square Enix parecem estar bem mais confortáveis ao mostrar Lara como uma protagonista destemida, inteligente e capaz de lidar com grupos de inimigos.

Já a DICE prometeu que pretende expandir a narrativa envolvendo a protagonista Faith em "Mirror's Edge Catalyst", com a produtora Sara Jansson declarando que o jogo mostrará a evolução de sua personagem durante o game.

Mesmo não sendo uma personagem jogável, "Rainbow Six: Siege" trará uma figura de autoridade feminina no papel de Six, diretora do esquadrão interpretada pela atriz Angela Bassett.

Essa confiança parece não estar só em heroínas já conhecidas nos games: Na conferência da Microsoft, a empresa revelou "Recore", novo jogo de Keiji Inafune (de "Mega Man") e o estúdio Armature (de veteranos do Retro Studios, de "Metroid Prime"). Já a Sony anunciou "Horizon: Zero Dawn", novo jogo da Guerrilla Games ("Killzone") que acabou se tornando uma das maiores atrações da feira.

Em ambos os casos, os jogos tinham mulheres como protagonistas.

Genevieve Forget - Reprodução - Reprodução
Produtora na Ubisoft, Geneviève Forget apresentou detalhes de "Rainbow Six Siege"
Imagem: Reprodução

Em cima do palco

A representatividade feminina não ficou limitada apenas aos jogos, com várias publishers utilizando produtoras e desenvolvedoras em apresentações e demonstrações de novos títulos.

A Microsoft, por exemplo, escalou a chefe da 343 Industries, Bonnie Ross, para apresentar o gameplay de "Halo 5", e a desenvolvedora Sherida Halatoe revelou seu game independente "Beyond Eyes". Na EA, Sara Jansson e Sigurlina Ingvasdottir, da DICE, mostraram ao público "Mirror's Edge" e "Star Wars: Battlefront".

Já a Ubisoft usou, novamente, a atriz Aisha Tyler como mestre de cerimônias para sua conferência, e a gerente de comunidade Genevive Forget apresentou a demonstração de "Rainbow Six: Siege". A Square Enix, por sua vez, deixou a diretor de design narrativo de "Deus Ex: Mankind Divided", Marie DeMarle, descrever um pouco do jogo.

A Bethesda e a Sony acabaram não incluindo desenvolvedoras ou produtoras nas apresentações – e o fato de suas conferências terem sido apresentadas pelo alto escalão de executivos destas empresas mostra que ainda há um longo caminho a ser percorrido –, mas é um passo na direção certa ao mostrar que a indústria é convidativa a mulheres profissionais.