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Legendado em português, "Mafia III" retrata racismo nos EUA dos anos 60

Victor Ferreira

Do Gamehall, em São Francisco*

19/04/2016 09h00

Há ideias com potencial em “Mafia III”.

Para alcançá-las, porém, o jogador deve navegar por um jogo de mundo aberto de molde bem genérico, oferecendo pouco que não tenha sido visto anteriormente em outros títulos - e até perdendo certas coisas em relação a “Mafia II”.

Ainda assim, há bastante a se apreciar no novo jogo da série, desde a ambientação diferente - uma versão fictícia de Nova Orleans nos anos 60 - até uma interessante mecânica de “divisão de espólios” com seus subalternos, que influencia seu relacionamento com outros e pode trazer consequências inesperadas.

À convite da 2K Games, UOL Jogos teve chance de testar um pouco da produção.

Mafia III - Tensão Racial - Divulgação - Divulgação
Passando-se em 1968, "Mafia III" promete mostrar as dificuldades e controvérsias da época
Imagem: Divulgação

Tempos difíceis

“Mafia III” acontece durante o ano de 1968, considerado por muitos um dos anos mais conturbados e icônicos do século XX - os EUA, especialmente, sofreram com assassinatos de figuras públicas importantes como Martin Luther King Jr. e o candidato para presidente Robert Kennedy.

É no meio deste cenário que a Hangar 13 criou a cidade de New Bordeaux, baseada principalmente em Nova Orleans. De acordo com o produtor Andy Wilson, a equipe não quis usar o local de verdade por questão de logística.

“O problema de trazer um mapa de uma cidade do mundo real é que ela foi criada para o propósito de andar e dirigir devagar, o que não é o queremos fazer com o nosso jogo”, explicou. “Em Nova Orleans, por exemplo, tudo é muito reto, e uma perseguição policial é muito mais excitante com elevações de terreno”.

Ainda assim, há aspectos que lembram a cidade americana, desde sua versão do bairro francês até o pântano que a cerca. Durante a sessão de testes porém, fiquei limitado ao centro comercial de New Bordeaux, que não é lá muito diferente de outros lugares vistos em outros jogos de mundo aberto neste estilo, de “GTA” aos primeiros “Saints Row”.

É neste mundo que vive Lincoln Clay, um órfão negro que foi criado pela máfia afro-americana de New Bordeaux, e que retorna da Guerra do Vietnã só para ver sua família adotiva ser traída e assassinada pelos italianos, liderados pelo vilão Sal Marcone.

“Quando começamos a elaborar o protagonista, pensamos ‘que personagem seria interessante neste período’, pois sabíamos que queríamos ir para os anos 60 e para o Sul dos EUA”, elaborou Wilson. “E pegar alguém que seja rejeitado seria interessante, pois ele é um órfão, e alguém de raça mista em um lugar e período onde isso não era algo bom. Então tudo isso mexe com sua personalidade”.

Mafia III - Vingança - Divulgação - Divulgação
Jogador pode escolher diferentes estratégias para derrotar inimigos
Imagem: Divulgação

Trilha de vingança

Querendo destruir Marcone, Lincoln toma como missão desestabilizar seu império criminoso, destruindo e tomando seu território ou eliminando ameaças como tenentes e “testas de ferro” espalhados por New Bordeaux.

Para isso, o jogador pode explorar a cidade e encontrar elementos que afetem o fluxo de grana dos tenentes de Marcone: Caminhões com objetos valiosos, esconderijos para lavagem de dinheiro e cagoetes com informações importantes para a operação.

Neste aspecto, a Hangar 13 conseguiu, ao menos, criar situações interessantes para tipos diferentes de jogadores, que tem diversas oportunidades de completar os objetivos de forma furtiva ou na base da violência direta.

Como é possível ver no vídeo acima, há uma série de situações de combate diferentes, algumas que se assemelham às minhas, e outras nem tanto. Em determinado momento, por exemplo, chamei a atenção de um possível informante enquanto estava no telhado.

Enquanto ele tentava ligar seu carro, me joguei para o asfalto e consegui entrar no veículo bem na hora que pegou no tranco, fugindo com o informante e deixando todos os seus capangas para trás.

Estes episódios são divertidos, mas é difícil saber pela sessão de testes se há muito mais disso em termos de atividades na região de New Bordeaux. Caso não, é difícil não imaginar em que momento estas atividades ficarão cansativas e repetitivas.

De fato, uma das minhas preocupações ao sair da demonstração foi a de que o mundo talvez não tivesse muito mais a oferecer - o jogador não pode customizar Lincoln como podia com Vito, por exemplo -, algo que já era um problema de “Mafia II”.

Quanto às mecânicas de combate são funcionais, mas nada muito além disso.  A sensação da maioria das armas, em particular, não trazem muito de especial (com a exceção das escopetas e algumas pistolas, que dão um tranco especial).

Mafia III - Divisão de Louros - Divulgação - Divulgação
Divisão de territórios traz novas habilidades e possíveis finais diferetnes
Imagem: Divulgação

Louros da vitória

Após desestabilizar seu alvo, o jogador deve enfim tomar o território do tenente de Marcone, e é aí que aparece o potencial de “Mafia III”.
Dependendo de suas ações anteriores - se livrando ou não de capangas mais perigosos, ou aprendendo mais sobre o tenente por meio de informantes - a missão final sofre algumas alterações, permitindo caminhos alternativos e aumentando ou diminuindo o número de adversários na invasão da base.

Isso também funciona com esconderijos, em que Lincoln pode usar escutas para saber mais sobre seu mapa e planejar uma estratégia de infiltração.

Ao derrotar os líderes de esconderijos e matar os tenentes, o jogador tem a opção de escolher qual de seus companheiros receberá o território.

No game, Lincoln tem três principais aliados: Vito, protagonista de “Mafia II” e exilado da máfia italiana em Nova York; Burke, um gângster irlandês com contas a pagar com Marcone; e Cassandra, que controla as gangues haitianas de New Bordeaux.

Ao dar um distrito para um de seus comparsas, o jogador recebe habilidades especiais - mas também recebe a ira de seus outros companheiros, que podem achar que estão sendo passados para trás.

O mais legal desta divisão de territórios é que o jogador tem total liberdade para escolher um colega favorito, e os outros reagirão de acordo com as preferências de Lincoln, se sentindo insultados ou até voltando-se contra você, caso a situação fuja do controle.

“Logo no começo do jogo você ve que, embora eles sejam tecnicamente aliados, nenhum se entende muito bem, ou tem paciência com os outros”, declarou Wilson.

“Meu desejo é que seja difícil para as pessoas escolher entre os três na hora de mandar nos esconderijos e especialmente os distritos, em que você é confrontado diretamente com estas figuras e tem que fazer a decisão”.

É possível, também, aliviar os relacionamentos ao fazer missões especiais com os três personagens, que revelam mais sobre seu passado e posição em New Bordeaux.

The Times They Are A-Changin

Embora a demonstração tenha sido mais focada na ação, um dos aspectos mais interessantes do jogo é justamente sua ambientação, ao mostrar uma área fascinante, mas pouco explorada, no mundo dos games.

Ao situar “Mafia III” no sul dos EUA na década de 60, a Hangar 13 quer explorar diversos aspectos do período, seja ligado ao crime organizado - já que a máfia italiana realmente operava em Nova Orleans, e estava sendo a ser considerada uma ameaça mais séria por policiais - até questões centrais do período.

Um dos exemplos disso é Burke, que de acordo com Wilson tem ideias racistas, e isso acaba influenciando seu relacionamento com Lincoln.

“Sabemos, é claro, que são assuntos delicados, e não podemos simplificar o problema”, disse o produtor. “Também não queremos fazer nenhuma declaração política com isso e mais que, seria estranho se eles reagissem a você naquele período como reagiriam se fosse em São Francisco de 2016".

Tudo isso, mais uma excelente trilha sonora que inclui músicas como “House of the Rising Son”, “Paint it Black” e “Fortunate Son”, dão a “Mafia III” ao menos o benefício da dúvida quando se considera seus elementos mais genéricos.

“Mafia III” sai em 7 de outubro para PC, PS4 e Xbox One.

*O jornalista viajou à convite da 2K Games

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