Por que times de eSports treinam em outros países? START explica Bootcamp
Até onde você iria para ser o melhor na sua carreira? No cenário de eSport, equipes investem tempo e dinheiro para atravessar oceanos só para treinar durante horas com os melhores jogadores de regiões mais fortes. Esse é o bootcamp, o treinamento imersivo e intensivos que jogadores se submetem para se aprimorarem no jogo.
Alguns pro players chegam a investir sozinhos cerca de R$20 mil para jogar nas ranqueadas mais insanas de "League of Legends" (LoL) da Coreia do Sul e, para entender melhor como e por que essa prática acontece, conversamos com treinadores e jogadores brasileiros que realizaram esse treinamento.
Dos campos militares para as lan houses
O termo bootcamp vem do inglês e significa "campo de treinamento". A prática surgiu no meio militar e não tinha nada a ver com videogames. Os soldados faziam um circuito de exercícios de alta intensidade, atravessando o limite da capacidade física para obter o melhor desempenho no menor tempo possível.
Atualmente exercício físicos assim são praticados também em academias para quem busca melhor performance, além de ser usado em cursos e workshops de diferentes áreas com o propósito de aprender a maior quantidade de conteúdo em períodos curtos.
Agora, o bootcamp passou também a ser usado por pro-players em lan houses, gaming houses e PC bang (as lan houses coreana).
O que define o bootcamp e o difere de outros métodos de treinamento é a imersão. Os exercícios exigem mais do corpo e da mente e é extremamente importante ser uma atividade coletiva, por incentivarem as partes a não desistirem e seguir adiante com os exercícios, assim como um time de pro players que se apoiam para alcançar o topo do pódio.
Os países favoritos para o Bootcamp
No período próximo de campeonatos, equipes brasileiras costumam realizar bootcamps para melhorar o desempenho. A escolha da região para viajar depende de vários fatores. Equipes de "Counter Strike: Global Offensive" (CS:GO) miram Estados Unidos e países da Europa, por serem o foco de grandes torneios, como a Starladder Berlim Major 2019, o mundial do jogo que acontece na capital alemã.
Já no "League of Legends", os países que atendem melhor as expectativas estão também na Europa e na Ásia, especificamente a Coreia do Sul, onde estão as rankeadas mais intensas e engajadas. Esse foi o caso da equipe de "LoL" da Falkol, que disputa o Circuito Desafiante, uma espécie de segunda divisão do CBLoL. Eles viajaram até a capital Seoul entre outubro e novembro de 2018, período em que estava acontecendo o Campeonato Mundial do MOBA.
O treinador Ednilson "Jukaah" Vargas explicou os motivos para realizar o bootcamp há 17,6 mil quilômetros de distância do Brasil. "Melhor nível de soloQ (partidas ranqueadas) do mundo, somado com época de mundial na região, isso implica em todos os melhores times do mundo em um mesmo lugar, o que facilita tanto os treinos como melhora a qualidade da rankeada." diz em entrevista para o START.
A ideia da viagem partiu do próprio "Jukaah" e foi feito todo um planejamento para a viagem e que o investimento não foi baixo. O valor gasto para um bootcamp foi do nível com o que é gasto por grandes equipes ao contratar jogadores para as temporadas.
Hotel de alta qualidade, quartos para dormir e para treinar separada, alimentação, tudo no mesmo nível que times americanos e europeus. A mesma estrutura que tivemos é IDÊNTICA a bootcamps da C9, Fnatic, Liquid, TSM etc
Ednilson "Jukaah" Vargas
Por estarem treinando em meio a craques de alto nível e com uma cultura de jogabilidade e estratégia distintas com que os brasileiros são acostumados, os players da Falkol precisaram pegar o ritmo das partidas. "Os jogadores da Coreia são muito mais disciplinados dentro de jogo. Isso dificulta muito punir erros."
Jukaah ainda conta que, depois da viagem, a equipe sentiu melhor desempenho tanto dentro do jogo quanto fora. "Durante nossa split, após o bootcamp, o time estava todo focado, com rotina de treino muito puxada. Uma rotina quase três vezes maior que qualquer outra na região."
E isso só foi possível pelo choque de realidade que tivemos lá [Coreia do Sul]. O time ficou mais ´'cascudo' e isso nos ajudou muito
Ednilson "Jukaah" Vargas
Coréia do Sul: a pátria dos eSports
A Coreia do Sul não é considerada o berço dos eSports à toa, o governo coreano investe para que os games como "Starcraft II", "Overwatch" e "League of Legends" sejam tratados como um esporte oficial e iniciativas como a Associação Coreana dos eSports (KeSPA), fundada nos anos 2000, seja alinhado ao Ministério da Cultura, Esportes e Turismo do país.
Por isso, lá é um dos mais visitados por profissionais do esporte eletrônicos e ser referência por possuir uma cultura de lan houses desde o final da década de 80. Hoje, estima-se que existam mais de 20 mil PC Bangs na Coreia do Sul. Além da estrutura com melhores equipamentos e internet. O que também atrai jogadores casuais, pro players e equipes é o preço baixo para jogar por hora: pode variar de US$1 a US$1,50 dólar o que equivale R$4 à R$6 em média.
Parceria Espanhola
Além da Coreia, vários países da Europa também estão entre as rotas de viagens para bootcamps, como Alemanha, Reino Unido e Polônia. No começo de 2019, o Campeonato Brasileiro de League of Legends (CBLoL) fez uma pausa durante o Carnaval e, enquanto alguns pegavam o fôlego para a volta da competição, a Vivo Keyd realizou um bootcamp em Madrid, capital da Espanha.
Na ocasião, o treinamento intensivo foi também uma oportunidade de intercâmbio cultural, porque os brasileiros ficaram nove dias nas instalações da equipe espanhola Movistar Riders, que disputava a SuperLiga Orange na época.
Ambos os times pertencem ao mesmo grupo da empresa Telefônica e essa foi a primeira vez que a VK foi para Espanha, mas não foi o primeiro bootcamps. Antes, eles já tinham ido para a Coreia do Sul e Portugal.
Jonas "Caos" Vriesman, da VK, confessa ao START que, apesar da oportunidade de poder viajar e os momentos de descontração da equipe, o bootcamp não é moleza, a maior parte do tempo é dedicada para treinos que podem durar mais de 6 horas.
"A rotina deles consistia em acordar às 8h30, fazer treinamento individuais (SoloQ) ou assistir VODs (replays de jogos internacionais de diferentes ligas ou BRs), mas era depois do almoço que começava a parte mais brutal: o primeiro bloco de treino durava em torno de 3 horas intensas. Depois havia uma pausa de uma hora e logo em seguida outro bloco de tempo similar. O resto do dia era composto ou por um terceiro bloco ou treinos individuais que iam até à meia-noite".
Os fãs podem não perceber o quão puxado e intenso os períodos de bootcamp podem ser
Jonas "Caos" Vriesman
Apesar da dura jornada, Caos conta que se espantou ao sentir o progresso individual e da equipe melhorarem rapidamente. "Não imaginei que o processo de evolução e adaptação do bootcamp seria tão rápido. Era muito engraçado quando o pessoal via o nosso histórico de partidas. Por conta dos nossos resultados e picks, pensavam que éramos pro players da Europa!".
Treinamento Furioso
Agora no mês de agosto, a equipe de CS:GO da FURIA, que vem ganhado cada vez mais atenção no cenário, realizou um bootcamp em Katowice, na Polônia. Durante 10 dias, eles tiveram uma rotina de treinamento intenso por lá e, logo depois, seguiram direto para a capital da Alemanha para competir no StarLadder Major Berlin 2019, mas infelizmente foram eliminados do torneio.
O rifler da equipe, Kaike ''KSCERATO'' Cerato conta que, apesar da rotina puxada, sente que aprendeu bastante durante os exercícios e aplicou como player e em equipe. "Em jogo, preciso me reinventar toda hora e me adaptar mais rápido ao outro time. Já out-game aprendi a lidar mais com minhas emoções e dos meus amigos de time." Explica em entrevista para o START.
Agora, engana-se quem pensa que depois do Major a equipe voltará ao Brasil: Os panteras, como são conhecidos, ainda jogarão campeonatos na Finlândia, Suécia, entre outros países da Europa.
Choque Cultural
Durante o bootcamp no exterior, os jogadores estão sujeitos a enfrentar diversos fatores que podem prejudicar o desempenho: jet leg (distúrbio que afeta o sono devido à troca de fuso horário), adaptação de rotina intensa de exercícios e aprender a criar táticas no server local.
Ao serem questionados sobre as diferenças culturais das jogatinas do server brasileiro comparado aos europeus ou asiático, a resposta dos jogadores e técnicos tanto de "LoL" quanto de "CS:GO" é unânime: a rapidez. O pensamento, jogadas e as estratégias são mais intensas e chegam a ser mais violentas do que os brazucas estão acostumados.
O jogo deles [europeus] é muito mais agressivo e eles confiam mais na própria mecânica individual, o que ajuda muito na hora de executar o plano de jogo. Eles estão sempre buscando lutar e contestar os objetivos
Jonas "Caos" Cardoso sobre as partidas na Europa durante o bootcamp na Espanha
Quanto mais longe, maior será a diferença cultural, como sentiu "Jukaah" quando esteve em Seoul. "Parece que o mundo é outro em todos os sentidos possíveis (risos)". O técnico da Falkol também conta que a comida, em particular, foi o mais sentiu de diferente por ser muito apimentada.
Quanto custa fazer um Bootcamp?
As equipes não revelam o valor da viagem para fazer o treinamento no exterior, mas sabe-se que é um alto investimento. Se jogadores individuais chegam à casa dos R$20 mil, esse valor pode mais que dobrar em se tratando de time.
Segundo o eSports Camps, site especializado em busca e reserva de gaming houses da Europa e Taiwan para fazer bootcamp, se uma equipe - composta por 7 pessoas considerando os jogadores e o técnico - solicitar no período de uma semana com tudo incluso (cama, computadores, cozinha, studio e wi-fi) os valores podem variar em torno de R$6 mil até R$ 18 mil (referente a cotação do euro à R$ 4,59)
Se for o período de um mês o preço aumenta, podem chega à R$28 mil até R$80 mil. Isso sem considerar passagens, estadias (se forem treinar em lan houses), alimentação, etc.
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