Fundador do Madmind Studios fala sobre censura e religião nos games
Em 2018, o jogo de terror "Agony" teve um lançamento extremamente tumultuado. Nos consoles, foi uma experiência intragável, cheia de problemas nos controles, gráficos e som. Sofreu censura, taxado como produto adulto, e acabou tendo muito conteúdo deixado de fora para que pudesse ser aceito nas lojas.
Longos meses depois, a coisa toda assentou. Hoje, "Agony" roda bem tanto no PS4 quanto no Xbox One, e uma versão "sem censura" encontra-se disponível no Steam. Mas as coisas não foram tão fáceis assim, como conta Tomasz Dutkiewicz, fundador do estúdio polonês Madmind.
No papo com o START, Dutkiewicz falou sobre as dores de cabeça de lançar um jogo e, claro, de censura em videogames. É ou não é brinquedo de criança?
START: A Madmind estava numa bela enrascada por conta de todos os problemas relacionados ao lançamento de "Agony". Como superar tudo isso?
Tomasz Dutkiewicz: Foi difícil para nós depois da onda de críticas que acompanhou o lançamento. O contrato com a publisher estava nos impedindo de atualizá-lo com conteúdo sem censura. Por causa disso, fomos forçados a retirar declarações anteriores várias vezes, sob pressão de penalidade financeira que provavelmente nos forçaria a fechar o estúdio. Foi por causa do contrato que tivemos que começar a trabalhar em uma versão melhorada do jogo – "Agony Unrated" – em total sigilo. Lançamos essa versão assim que o contrato antigo deixou de ter validade. Felizmente, muitos jogadores gostaram, e "Agony Unrated" não só foi recebido muito bem, mas também rendeu recursos para fazermos novos jogos.
START: Nos consoles, demorou uma eternidade para os patches chegarem, e todo o conteúdo "somente para adultos" estava limitado ao PC. Como lidar com esse tipo de censura?
Tomasz Dutkiewicz: Após o lançamento, focamos exclusivamente na versão sem censura do jogo. Adicionamos muitas novas mecânicas, muitas mudanças nas fases e muitas correções na IA e na iluminação. Quando decidimos atualizar as versões de console (e a versão básica de "Agony" no PC) com os principais patches da versão Unrated, lutamos com a otimização e as certificações dos jogos, mas conseguimos fazê-lo. Também tivemos ajuda adicional do estúdio que já havia nos ajudado a preparar a versão para console e que, mesmo com o contrato já expirado, foi primordial para nós. Todo processo foi muito demorado, mas estamos felizes por finalmente termos conseguido atualizar o jogo com novos conteúdos e correções, também em consoles.
START: Ainda sobre a censura, como vocês da Madmind encaram esse problema? Videogames ainda são vistos como brinquedo? Por que filmes, literatura ou mesmo quadrinhos podem se aprofundar em questões extremas e tabus, e os videogames, aparentemente, não?
Tomasz Dutkiewicz: Videogames ainda são vistos pela sociedade como um produto destinado, principalmente, às crianças e jovens. É seguro do ponto de vista dos fabricantes de console, porque assim é mais fácil vender seus equipamentos para um grupo maior de clientes. Os pais não precisam se preocupar com o fato de seus filhos serem expostos a cenas que não deveriam ver. É claro que esta solução é compreensível, mas acho que muitos jogadores apreciariam a oportunidade de jogar jogos direcionados apenas a adultos. Seria o suficiente para limitar sua visibilidade na loja e verificar o conteúdo do usuário. Tudo isso poderia ecoar na mídia convencional, e uma pequena quantidade de jogos apenas para adultos não recompensaria os fabricantes de consoles por uma solução tão arriscada. Tudo isso, em última análise, limita a liberdade criativa dos desenvolvedores e ignora deliberadamente tópicos controversos que a indústria cinematográfica não tem problemas em apresentar.
Videogames ainda são vistos pela sociedade como um produto destinado, principalmente, às crianças e jovens. É seguro do ponto de vista dos fabricantes de console, porque assim é mais fácil vender seus equipamentos para um grupo maior de clientes
Tomasz Dutkiewicz
START: É realmente lamentável que fãs de horror extremo não tiveram acesso a "Agony Unrated" nos consoles. Como lidar com esse tipo de frustração?
Tomasz Dutkiewicz: Infelizmente, no momento, é impossível lançar "Agony Unrated" nos consoles, mas com os patches lançados, tentamos atualizar o jogo básico com o maior número possível de novas funcionalidades. Adicionamos um mapa, melhores modelos de personagens e iluminação, além de mais opções de defesa contra os inimigos. É claro que "Agony Unrated" é mais rico, com muitas cenas brutais, principalmente eróticas, do que a versão básica do jogo, mas em termos de jogabilidade e mundo apresentado, as duas versões são basicamente a mesma experiência.
START: Vamos falar sobre violência nos videogames, já que os gráficos estão se tornando cada vez mais realistas. Ainda estou sonhando com Manhunt 3, mas sei que nossa sociedade não está pronta para isso...
Tomasz Dutkiewicz: Na verdade, acho que nada atrapalha esse tipo de jogo de ser criado. Os desenvolvedores podem, basicamente, se superar na representação criativa da violência em suas produções. Se apenas o assunto do jogo não tocar em conteúdo erótico de maneira exagerada, ou não tocar conscientemente em outros tabus, você poderá mostrar tudo. Você pode ter um homem nu construindo um muro usando crianças vivas como material, esmagando seus crânios para que o cérebro escorra, e ninguém vai dar a mínima... A reação seria diferente se uma mulher nua com órgãos genitais expostos fizesse isso. Definitivamente, isso seria muito forte para os jogadores.
START: E o que dizer de temas religiosos? Os videogames ainda são um lugar problemático para lidar com esse tipo de assunto?
Tomasz Dutkiewicz: Conteúdo religioso polêmico nos jogos geralmente é ignorado devido ao fato de que uma determinada produção pode ser banida se um grande número de jogadores se sentir ofendido. É por isso que a maioria dos desenvolvedores não quer se arriscar a ter esse tipo de desastre financeiro, ações judiciais e publicidade negativa desnecessária. No entanto, nada impede que você faça esse jogo, isso se não tiver medo das consequências.
START: Sobre o novo jogo da Madmind: "Paranoid" parece muito mais realista, pé no chão, do que "Agony". São opostos nesse sentido?
Tomasz Dutkiewicz: "Paranoid" apresenta uma abordagem completamente diferente do horror de "Agony". Estamos tentando mostrar a situação do herói de uma maneira mais confiável e realista. Os jogadores não verão cadáveres e oceanos de sangue a cada esquina. Isso é algo novo para nós e tentamos abordar a produção deste jogo de maneira ponderada. Até contratamos um especialista em esquizofrenia paranoica para nos mostrar como lidar com esse problema de uma maneira mais crível. Ao contrário de "Agony", o herói não é um personagem sem nome, mas um homem muito complexo que se viu em uma situação muito difícil. Apesar disso, Patrick - o personagem principal de "Paranoid" - é capaz de se defender dos inimigos e não é apenas um observador indefeso dos eventos.
Até contratamos um especialista em esquizofrenia paranoica para nos mostrar como lidar com esse problema de uma maneira mais crível
Tomasz Dutkiewicz, sobre "Paranoid"
START: Quando podemos esperar mais informações sobre "Paranoid"? E "Succubus"?
Tomasz Dutkiewicz: Tentamos dosar informações sobre os dois jogos para não revelarmos todas as nossas cartas de uma só vez. Este ano, planejamos mostrar o gameplay de "Succubus" e anunciar algumas informações importantes relacionadas ao jogo. E para nossos fãs do Brasil, preparamos uma foto exclusiva apresentando um novo tipo de oponente com quem terão batalhas difíceis enquanto jogam "Succubus"!
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