A franquia "Darksiders" oscila sempre em semitons. Não dá para dizer que o seu melhor momento está entre as melhores lembranças que tenho com jogos, e muito menos que seus piores me fizeram desejar quebrar o controle. O fato é que a série sempre fez jogos decentes, mas de conceitos muito confusos, sem muita originalidade tanto em narrativa quanto em gameplay.
Nesse cenário, "Darksiders Genesis" é mais uma tentativa de mudança de direção da franquia. É um spin-off que chuta de vez as principais convenções que os jogos anteriores tinham estabelecido em termos de jogabilidade. Com dois protagonistas conhecidos dos fãs, Guerra e Conflito, o jogo expande o lore da franquia e tenta surpreender novatos e veteranos com escolhas interessantes de design.
Do Éden ao Inferno
O jogo não se chama Genesis à toa. Aqui, o conselho e seus quatro cavaleiros do apocalipse vão viver uma história que se passa muito antes dos acontecimentos do primeiro jogo. Na busca - quase incansável - pelo equilíbrio, o conselho enviará Guerra e Conflito para investigar um possível desvio de Lúcifer, que parece fazer muita bagunça com a hierarquia do inferno.
Durante a jornada, os dois protagonistas vão visitar várias camadas do abismo e desafiar demônios enormes e poderosos. Dividido em 16 missões, o jogo ainda leva os jogadores a conhecerem mais sobre o Éden, a traição dos Nephilim e a criação do reino dos humanos, pontos importantes para tudo que foi criado na franquia até agora. A motivação é sempre bem bobinha: chegar ao final da fase e coletar um item para chegar mais próximo de Lúcifer. O ponto alto fica com os resultados, que geralmente adicionam novos personagens à história e garantem uma leva de novidades no gameplay.
Essa variedade de locais é muito bem representada na ambientação. Existem camadas frias do inferno, repletas de gelo e com demônios típicos do local. Desertos enormes onde demônios se escondem, e há fogo e lava, essenciais para esse tipo de abordagem. O número de inimigos é satisfatório: são mais de 60 tipos deles, mas alguns são repetidos à exaustão, já que muitos só fazem sentido em biomas específicos, como todos os insetos da floresta. Tudo é muito bonito, mas a interface poluída acaba atrapalhando boa parte do maravilhamento com os cenários. Limpe o máximo dela nas configurações.
Todo o design foi pensado para incentivar a exploração de cada canto dos mapas. Eles estão repletos de segredos, portas que guardam tesouros, histórias para serem contadas pelos personagens e inimigos escondidos. A exploração é bem recompensadora, e como existem locais que só podem ser visitados com habilidades específicas que são conquistadas mais para frente no enredo, o fator replay é um ponto alto do jogo, especialmente com um 'New Game +' com a dificuldade chamada 'Apocalíptica'. Uma pena que alguém na desenvolvedora do jogo, Airship Syndicate, teve a ideia horrível de não colocar um indicador de posição do jogador no mapa, tornando a navegação confusa, especialmente porque não é possível mover a câmera e se orientar por marcos do cenário.
Em cada um desses níveis, Guerra e Conflito aprofundam sua relação e contam mais sobre seu passado. Com uma personalidade dura e focada nos objetivos, Guerra é o par perfeito para o Conflito, que lembra muito o Deadpool dos quadrinhos, sempre fazendo piadas enquanto distribui bala nos seus inimigos. A narrativa alterna momentos de humor com outros mais emotivos e acaba desenvolvendo bem os personagens. Não é perfeita, já que alguns diálogos soam bem forçados, mas cumpre muito bem o papel para um jogo com essa proposta e escopo.
Vamos falar mais sobre o ótimo áudio do jogo mais a frente, mas já fica o destaque para as excelentes dublagens de ambos os protagonista e de vários personagens secundários, como o demônio Samael e o clássico Vulgrim. O jogo só conta a língua inglesa como opção de dublagem, mas pelo menos legendas em português estão disponíveis.
Gameplay familiar e recompensador
"Darksiders Genesis" aposta em uma orientação de câmera totalmente não-convencional para a franquia. Em vez da clássica visão pelas costas do personagem, como em "Darksiders 3", o jogo elevou a câmera para a posição chamada de "Top Down", quando o protagonista é visto de cima no melhor estilo Diablo.
Além da câmera, as semelhanças com o jogo da Blizzard ficam só no tema mesmo. O jogo não foca no loot, nem sequer é possível modificar o equipamento do seu personagem. A progressão flui de maneira bem familiar para quem está acostumado com jogos de ação como os antecessores de Gênesis, com ganho de habilidades no decorrer da aventura e aprimoramento por meio de certos itens encontrados no cenário ou comprado de vendedores.
O combate também lembra bastante o que já conhecemos da franquia. O Guerra, por exemplo, parece vir direto do primeiro Darksiders, e colocado aqui para ser controlado por outra visão. Os seus combos, habilidades e velocidade são muito parecidos com o que já vimos na franquia. Já o Conflito funciona de duas maneiras, dependendo de como o jogador escolher fazer a build: pode ser o clássico canhão de vidro, com ataques a distância, ou focar nos ataques velozes de perto para acumular dano por segundo ao mesmo tempo em que se cura. Ambos, claro, também contam com transformações para mostrar todo seu potencial apocalíptico para anjos e demônios.
Algumas missões são apenas uma batalha com um chefe poderoso. Na dificuldade normal, elas se tornam bem simples e bobas com o passar do tempo, especialmente se o jogador explorar bem os cenários em busca de recursos. Já nos modos mais difíceis é preciso colocar à prova sua habilidade de desviar e curar a tempo. No design elas são bem competentes e variadas, com um apelo visual interessante e que não compromete a proposta.
É possível personalizar bastante o estilo de ambos os personagens graças ao Cernes de Criaturas. Esses itens são pedras que você consegue ao derrubar inimigos. Cada inimigo tem uma pedra com o seu nome, e elas podem ser acumuladas para ganhar nível. Cada uma dessas Cernes pode ser alocada em um espaço da sua árvore de habilidades, concedendo algum bônus. Existem espaços específicos para inimigos comuns e outros para pedras de chefes. Como existem mais inimigos que espaço disponível, e cada um dos espaços limita o nível das Cernes, a forma como você constrói a sua árvore faz toda a diferença na hora do combate. É possível construir uma árvore focada no especial do Conflito, com ganho de munição por abate e aumento de dispersão de dano. Também é possível focar no Guerra e sua vida ou habilidades. Fica a seu critério.
"Darksiders Genesis" recomenda utilizar um controle para jogar, provavelmente por conta das constantes sessões de saltos por plataformas que são pouco precisas e ficam como ponto mais baixo do game. No entanto, em todo o resto, senti muito mais conforto jogando com teclado e mouse, principalmente no combate, quando é possível alterar as habilidades dos protagonistas com apenas um botão, sem pausar a ação. No controle, é preciso segurar um gatilho, que abre um menu que não é o que você quer, e girar o analógico para chegar em uma segunda aba, com todo o combate pausado para executar uma ação simples.
Já que chegamos no momento de falar dos problemas, um ponto a se destacar é a quantidade de pequenos bugs irritantes. Nenhum deles chega a quebrar o jogo e fazer você ter que recomeçar ou perder o seu progresso, mas ficam o tempo todo fazendo com que você erre ações. Eu acredito que o problema seja nas caixas de colisão dos personagens, que por vezes travam em alguns cantinhos e precisam de esforço para sair do lugar. Em outros momentos, o personagem desliza, e nas sessões de plataformas a imprecisão fica quase insuportável por conta da indefinição de auxiliar ou não o jogador na hora de pular.
Às vezes o jogo te ajuda, mas nem sempre. Inclusive, terminei o jogo com a impressão de que nessa orientação de câmera, plataformas são uma péssima escolha, mesmo com o uso das sombras para indicar onde você irá cair. Há também probleminhas de resposta do controle em algumas sequências de ação. Quando você desce do cavalo, precisa soltar o direcional antes de continuar, porque ele simplesmente embaralha as direções se você já estiver pressionando para alguma direção. Todos esses pequenos incômodos tornam algumas partes muito mais frustrantes do que deveriam ser e tiram bastante o brilho do jogo, que acaba passando por mal polido.
Se você está se perguntando sobre os puzzles, um dos clássicos elementos da franquia, pode ficar despreocupado. Todas as fases contam com eles, que vão ficando mais complexos conforme você vai conseguindo novas habilidades e equipamentos que permitem acessar novos locais. Bem pensados, eles trazem um frescor necessário entre sessões com hordas de inimigos.
Endgame tem bom conteúdo
Após terminar "Darksiders Genesis", você poderá revisitar as fases na dificuldade apocalíptica, que exige muito mais precisão no combate e deixa os inimigos bem mais fortes. Existe, inclusive, uma conquista para quem conseguir terminar todos os níveis nessa dificuldade.
Além da campanha, os jogadores podem dedicar tempo no modo Arena. Ele já fica disponível ainda durante a campanha, conta com vinte fases e o jogador precisa sobreviver a dez ondas de inimigos em cada uma delas para receber recompensas muito boas. Na última fase, a Arena é infinita e o jogador fica por quanto tempo aguentar. Existe uma conquista para quem fizer mais de 70 mil pontos.
No PC, a matemática é boa: um preço modesto de R$ 57,99 no Steam, o que garante umas 15 horas de campanha, mais o tempo de exploração, mais o conteúdo endgame. No entanto, o jogo custa R$ 149 nos consoles.
Áudio soberbo
A minha maior surpresa com o jogo foi em relação ao áudio. A trilha sonora é muito impactante e bem aplicada, com composições que tornam algumas batalhas memoráveis. Em uma das minhas batalhas com um anjo de alto escalão, a música fez uma das piores batalhas de chefe do jogo se tornar uma das mais hype, graças aos arrepios que os comandos do anjo bem dublados em conjunto com a música épica trouxeram.
Em outros momentos, se nota uma influência muito grande de "NieR: Automata" na composição, com alguns corais agudos encaixados de forma muito agradável aos ouvidos. Por vezes a música nem parecia fazer muito sentido com a ambientação, mas era tão boa que compensava.
Toda a mixagem no geral soa bem, com os efeitos sonoros também fazendo bonito e a dublagem um show à parte. Foi uma experiência muito positiva que agregou bastante ao jogo.
Diversão em dose dupla
Um último ponto relevante é a presença do multiplayer cooperativo. É possível que dois jogadores dividam o comando dos cavaleiros, cada um com um deles. O resultado são inimigos mais fortes, mas com uma possibilidade de combos e estratégias muito mais amplos.
A jogatina pode ser feita de modo online ou local com a tela dividida, algo que é bastante raro, nos dias atuais, no PC. Seja qual for a forma da sua preferência, jogar com um amigo torna o Darksiders Genesis ainda mais interessante.
Resumo
Darksiders Genesis é mais um jogo competente da franquia, que não é um marco da indústria, mas também passa bem longe de ser ruim. Com um combate familiar e divertido mesmo com a nova orientação de câmera, uma ambientação competente e diversa, protagonistas carismáticos e bem desenvolvidos e bom conteúdo, é uma ótima pedida para o fim de ano, mesmo com os pequenos probleminhas de bugs que devem ser corrigidos com o tempo. Por conta do preço acessível, fica ainda mais fácil recomendá-lo.
Lançamento: 05/12/2019
Plataformas: Stadia e PC; em 2020 para Switch, PS4 e Xbox One
Preço sugerido: R$ 57,99 (Steam)
Classificação indicativa: 14 anos (Linguagem Imprópria, Violência)
Desenvolvimento: Airship Syndicate
Publicação: THQ Nordic
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