Em 22 de março de 2005 Kratos partiu em uma jornada para vingar sua família, lutar contra os deuses gregos e suas criaturas míticas e entrar para a história dos videogames. Controverso, polêmico e muito influente, God of War também alçou à fama o estúdio Santa Monica, hoje uma referência de desenvolvimento de jogos exclusivos da plataforma Playstation.
Cortando o caminho
Os jogos de ação, com foco em bater a maior quantidade de inimigos pelo caminho, popularmente conhecidos pela alcunha "beat 'em up" foram os reis dos arcades e consoles domésticos nos anos 1980, sobretudo graças a sucessos como Double Dragon, Streets of Rage, Teenage Mutant Ninja Turtles e Final Fight. Já nos anos 90, apesar do lançamento de jogos como Dungeons and Dragons: Tower of Doom e Cadillacs & Dinosaurs, essa categoria de jogos foi sumindo do mapa e parecia não se adaptar à mudança do padrão de desenvolvimento dos videogames, que deixavam os antigos esquemas bidimensionais para progressivamente se tornarem tridimensionais. O lançamento de "beat em ups" pavorosos como Fighting Force só contribuiu com essa impressão.
A virada veio somente na década seguinte, com o lançamento do seminal Devil May Cry, sucesso da Capcom que revitalizou o gênero, rebatizando-o como "hack and slash", já que o grosso da ação rolava com armas brancas. Três anos depois, em 2004, foi a vez de Ninja Gaiden fazer sucesso utilizando os mesmos princípios de Devil May Cry. De olho nessa tendência, David Jaffe, experiente game designer conhecido por seus trabalhos em jogos como Mickey Mania e Twisted Metal, iniciou ainda em 2002 o desenvolvimento de um jogo inspirado em Devil May Cry e também em Onimusha. Entretanto, para se difenciar dos concorrentes e não terminar entregando um jogo genérico, Jaffe explicou ao site Eurogamer o conceito do que viria a ser God of War:
"Eu adorava mitologia grega na época da escola, eu adorava o filme "Furia de Titãs" e tudo do Ray Harryhausen. O verdadeiro high concept pra mim foi pegar Fúria de Titãs e misturar com a revista Heavy Metal. O que eu gostava era o material infantil que você tem com mitologia grega; monstros, sequências de ação e a fantasia. Mas aí eu curti a ideia de pegar isso e meio que misturar com sexo, violência e coisas mais adultas."
De fato, mitologia grega não era um tema comum em video games até então. Na geração 8-bits, raros títulos como The Battle of Olympus e Kid Icarus se aventuraram nesse tema, essa tendência prosseguiu nas gerações seguintes. Assim, God of War foi lançado em 22 de março de 2005, e de cara chamou a atenção justamente pelas altas doses de violência e pela presença de sexo e nudez no jogo.
Quebrando o vaso
Embora a violência esteja presente nos videogames praticamente desde o início, e controvérsias sobre o tema existissem por conta de jogos como Death Race, Night Trap e Mortal Kombat, a presença de sexo era mais rara em jogos, e mesmo considerado como tabu por muitas produtoras de games. Na mesma entrevista ao Eurogamer, David Jaffe contou que a incorreção política fazia parte de seu conceito de jogo:
"Eu não tinha visto muito dessa vibe, não apenas em games, mas isso costumava ser um tema em livros dos anos 70 e 80 e nos filmes e tal. Mas ultimamente - pelo menos nos Estados unidos - as coisas ficaram tão politicamente corretas que eu fiquei realmente animado em fazer uma coisa que fosse mais um retorno à aquela vibe mais animalesca, tipo a brutalidade de Conan o Bárbaro."
Dessa forma, além da presença de mulheres semi-nuas, God of War apresentou um ousado e inusitado mini-game de sexo que ficou célebre pela ceninha do vaso quebrando assim que Kratos encerrava sua performance, por assim dizer. Apesar as polêmicas e da desaprovação de alguns, o mini-game de sexo se tornou uma tradição nos jogos da franquia God of War, estando presente em todos os games exceto a última edição, lançado em 2018 para Playstation 4.
Kratos, o bárbaro
Questões sexuais a parte, God of War também marcou por seu game design refinado e muito bem planejado. Encadeando sequências de ação, plataforma, quebra-cabeças e batalhas épicas contra tradicionais monstros da mitologia grega, o jogo levava o jogador em uma jornada brutal e intensa. Nas sequências de ação, de posse da Blades of Chaos, o jogador dispunha de um sofisticado sistema de combos com ataques de curta e longa distância. Já no caso dos chefes, criaturas gigantes ou de monstros mais fortes que os inimigos comuns, o jogo mesclava os combos com um uso inteligente dos sempre questionados "quick time events" (QTEs), de forma a fazer Kratos atigir o ponto fraco dos monstros e também finalizá-los do modo mais sanguinolento possível.
Mas se Kratos era brutal, seus inimigos também eram, e mesmo na dificuldade padrão, não dão moleza ao anti-herói grego. Bastante agressivos, costumavam cercar o jogador e atacar sem dó. Além do já mencionado sistema de combos, o jogador também podia contar com quatro magias suplementares que davam habilidades extras a Kratos, como o Medusa's Gaze, que petrificava inimigos e o Poseidon's Rage, que atirava raios em múltiplos oponentes.
Por outro lado, a apresentação impecável também contribuiu para o sucesso de God of War. Seus gráficos eram bastante acima da média dos jogos de PlayStation 2 da época, apresentando grande detalhismo geral, muitos efeitos e uma (na época) bem realizada representação da Grécia mitológica que tanto encantava David Jaffe. Além disso, as cenas animadas buscaram ao máximo apresentar um ar cinematográfico e dramático à campanha de Kratos em sua busca por vingança.
Por fim
Violento, ousado, politicamente incorreto, marcante; muitos são os adjetivos que podem definir God of War. Figura cativa em qualquer lista dos melhores jogos de Playstation 2 que queira ser lavada a sério, God of War também está entre os jogos mais vendidos do console, e por bons motivos. Os deuses que se cuidem, pois para Kratos o céu não é o limite e ninguém que cruze seu caminho está a salvo.
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