Sinônimo de clássico, de histórico, de vintage: a empresa foi fundada na Califórnia por Nolan Bushnell e Ted Dabney no longínquo ano de 1972, época que computadores, circuitos eletrônicos e máquinas automáticas ainda soavam como produto de ficção científica e somente faziam parte da quotidiano de nerds, cientistas e engenheiros.
Partindo de uma simples simulação de pingue-pongue, até a o lançamento de grandes clássicos dos games, a Atari criou e apresentou o conceito de jogos eletrônicos, tanto domésticos como de salão, para gente do mundo inteiro, marcando assim seu nome na história dos entretenimento eletrônico.
Um alinhamento de ideias
A história da Atari começa ainda nos anos 1960, quando Nolan Bushnell, então estudante da Universidade de Utah, descobriu os protótipos de jogos do laboratório de computação da instituição. Criativo e amante de filosofia, Nolan ficou fascinado com a experiência e com o potencial desses jogos eletrônicos, ali restritos aos enormes e caríssimos computadores da universidade, e decidiu que era com isso que trabalharia.
Após se formar e trabalhar para algumas empresas de computação, Nolan Bushnell e seu colega Ted Debney investiram US$ 250 cada um para abrirem a própria companhia de jogos eletrônicos. A primeira ideia para nome foi a palavra "Syzygy", que de forma resumida, significa o alinhamento entre corpos celestes, mas para surpresa geral o nome já havia sido registrado por uma companhia que fabricava velas.
Nolan Bushnell então recorreu ao jogo de estratégia japonês GO, e escolheu o nome "Atari", o termo usado para o "check mate" do jogo. Começava aí a história da Atari Inc; e o mundo dos videogames nunca mais seria o mesmo.
Dois caras entram em um bar...
Assim que a Atari começou, Bushnell buscou clientes entre empresas de pinball, cujas máquinas podiam ser vendidas e/ou alugadas para parques, refeitórios de faculdades e bares. Ainda que a receita da empresa dependesse dessas encomendas, Bushnell, Debney e Al Alcorn, o primeiro engenheiro contratado, imaginavam que a Atari pudesse produzir suas próprias máquinas.
Inspirado por uma demonstração que viu do protótipo do Magnavox Odyssey, Bushnell pediu a Alcorn que desenvolvesse um jogo de bola e raquete. Após três semanas, Alcorn desenvolveu o esboço de um jogo em que o jogador usava um retângulo para rebater um quadrado, tal qual um pingue-pongue ou jogo de squash.
$escape.getH()uolbr_geraModulos('embed-foto','/2020/prototipo-do-pong-instalado-no-andy-capps-tavern-1593542166319.vm')O engenheiro então levou seu protótipo ao Andy Capp's Tavern, um bar próximo à sede da Atari, curioso para saber o que os frequentadores achariam do jogo. Dois dias depois, Bill Gattis, o gerente do bar, liga para Alcorn alegando que a máquina havia dado defeito, mas na verdade o que impedia o funcionamento do protótipo é que a caixa que guardava as moedas necessárias para iniciar as partidas havia lotado, sinal que o potencial do jogo em se tornar um grande sucesso era grande. Ainda sobre isso, Gattis contou para Alcorn que de repente pessoas começaram a fazer fila na porta do bar apenas para jogar o jogo, sem consumirem nada no local. O sinal era mais do que claro.
Inicialmente, a Atari não tinha capacidade para fabricar os próprios gabinetes, mas ciente que do potencial do jogo que tinha em mãos, Bushnell investiu tudo o que podia para poder construir a própria linha de produção. Assim, em novembro de 1972, a Atari lançou PONG, que em pouco tempo foi um fenômeno de vendas nos Estados Unidos e colocou o nome da empresa no mapa. PONG foi o primeiro game de uma linha de muitos sucessos que a Atari lançaria de 1972 em diante, lançando também em paralelo a ideia de salões com gabinetes com games eletrônicos, no lugar dos tradicionais pinballs e máquinas de jukebox. O game de pingue-pongue da Atari deu a luz ao arcade como conhecemos até hoje.
Bolinha pra cá, bolinha pra lá
Ainda que a Atari tenha se estabelecido como a referência para jogos de arcades graças a jogos como Space Race, Tank, Gran Trak 10 e Breakout, a concorrência de grandes empresas como Midway e Taito era pesada. Ainda por cima, o sucesso excepcional de PONG compreensivelmente gerou uma torrente de clones e imitadores, ávidos por surfar na onda gerada pelo clássico da Atari. Percebendo a dificuldade crescente do mercado de arcades, Bushnell então pensou como levar PONG para os lares. Al Alcorn e Harold Lee tiveram o desafio de desenvolver um circuito que pudesse conter um chip que pudesse rodar PONG e fosse pequeno o suficiente para caber em um produto doméstico. Batizado de "Home Pong", Alcorn e Lee finalizaram o protótipo em 1974, e Bushnell o exibiu em uma feira de brinquedos.
Apesar de a Atari já ser uma empresa internacionalmente conhecida e com vários games de sucesso para arcades, incrivelmente nenhuma empresa se interessou pelo Home Pong e Bushnell saiu da feira de mãos abanando.
Apesar de todas as negativas, meses depois, já em 1975, Bushnell conseguiu demonstrar o protótipo para executivos da Sears, uma mais maiores e mais tradicionais redes de varejo dos Estados Unidos. Impressionados com console, os executivos fecharam um acordo com a Atari e encomendaram 150.000 unidades para vender na época do natal. Rebatizado de "Tele Games", a versão final do Home Pong foi um gigantesco sucesso , e a grande estrela do disputadíssimo catálogo da Sears. Assim como havia acontecido com a versão arcade de PONG, o Tele Games foi copiado e clonado por empresas do mundo inteiro (mesmo a Nintendo lançou um clone chamado "Color TV Game").
Projeto Stella
Por conta dos inúmeras imitações e do avanço tecnológico que progredia cada vez mais rapidamente, o Tele Games perdeu fôlego já no ano seguinte. Em 1976 também foi lançado o console Fairchild Channel F, que embora não tenha feito sucesso, apresentou o conceito de um console que podia rodar vários jogos, estes impressos em cartuchos. Dessa forma, aparelhos como o Tele Game, que continham apenas um jogo (no máximo variações do mesmo programa), perderam o apelo junto ao consumidor.
A Atari não perdeu tempo, e Bushnell, Alcorn e os demais engenheiros da Atari já trabalhavam em um projeto de console capaz de rodar versões dos games que a Atari fazia para os arcades.
Batizado de projeto Stella - que era o apelido da bicicleta de Joe Decuir, um dos engenheiros responsáveis pelo desenvolvimento do console(foto acima) - , o console foi projetado com processador, memória e recursos gráficos dignos de um computador 8-bits. Foi o projeto mais difícil e complexo que a Atari encarou até então, cujo custo de desenvolvimento e pesquisa era mais alto do que a companhia podia bancar.
Foi então que Nolan Bushnell tomou uma decisão que mudaria sua vida: após meses de reuniões e negociações, ele vendeu a Atari para a Warner Communications por 28 milhões de dólares (valores da época), com a corporação injetando mais 100 milhões em investimentos. Assim, graças a essa injeção de capital, mais todo o trabalho de desenvolvimento, o projeto Stella evoluiu para o Atari Video Computer System, ou Atari VCS, como ficaria conhecido para a posteridade.
O Atari VCS foi lançado no fim de 1977 com o jogo Tank na caixa mais nove jogos disponíveis nas lojas: Combat, Air-Sea, Battle, Basic Math, Blackjack, Indy 500, Star Ship, Street Racer, Surround e Video Olympics. O console obteve boas vendas, mas não foi o sucesso fulgurante como o do Tele Games. O console continuou recebendo novos games no ano seguinte e vendendo bem, mas o VCS não tinha o desempenho esperado pelos executivos da Warner, sobretudo pelo grande investimento que havia sido feito na Atari.
A pressão e os desentendimentos entre a gerência da Atari e a Warner começaram a crescer conforme o tempo passava. Ainda que o Atari VCS tenha vendido por volta de 6 milhões de unidades até 1979, o console sofria dificuldades internas. Executivos da Warner queriam descontinuar o VCS sob a alegação que o console havia saturado o mercado, enquanto que Bushnell propunha cortar seu preço e lucrar mais sobre o software. O desentendimento chegou a tal ponto que Nolan Bushnell foi forçado a assinar acordo para deixar a companhia, e então Ray Kassar, executivo ligado à indústria textil na maior parte de sua carreira, assumiu o posto de CEO e começou uma nova era na empresa.
Invasores Espaciais do Japão
A volta por cima da Atari veio do outro lado mundo, graças a um game sobre invasores espaciais. Space Invaders, fenômeno dos arcades japoneses, desembarcou na América do Norte também com enorme sucesso e virou mania em salões de arcades de todo território Americano. De olho em todo esse sucesso, executivos da Atari assinaram um acordo com a Taito para a produção de uma conversão doméstica de Space Invaders.
Space Invaders para Atari VCS foi lançado em 1980 e os cartuchos simplesmente sumiam das prateleiras. Space Invaders fez um sucesso tal que chegou a dobrar as vendas do Atari VCS. Dois anos mais tarde, em 1982, a Atari repete a dose com a conversão do mega-sucesso e fenômeno cultural Pac Man.
Ainda que essas conversões fossem bastante inferiores aos originais de arcade, esses games tinham o suficiente para divertir e manter o Atari VCS líder frente a concorrentes como o Mattel Intellivision.
Vai Kassar sapo
Se por um lado a abertura da década de 1980 fez o Atari VCS renascer e a companhia lucrar como nunca, por outro, problemas internos e insatisfações se acumulavam. O já mencionado Ray Kassar desprezava o trabalho de designers e programadores, impedindo-os de serem creditados pelos jogos, e na cabeça do CEO, nem deveriam saber quanto um jogo vendeu. Por conta do sucesso do console Atari VCS, as divisões de arcades e pinball eram subestimadas, e seus membros se sentiam alienados das decisões importantes da companhia. Assim, os programadores David Crane, Larry Kaplan, Alan Miller, Bob Whitehead e Jim Levy deixaram a Atari para fundar a Activison, a primeira companhia terceirizada de jogos do Atari VCS.
Diferente de hoje, em que companhias produtoras de consoles vendem licenças de produção de jogos para produtoras terceirizadas, a Atari adotava um modelo de monopólio, em que só ela mesma podia produzir os jogos do seu console. Dessa forma, se uma empresa quisesse ter seu jogo no VCS, ela vendia os direitos para a Atari, que desenvolveria o jogo - exatamente como fez com Space Invaders e Pac Man, por exemplo. Por conta disso, Ray Kassar considerou a Activision como uma competidora ilegal e tentou proibi-la de produzir jogos para o VCS. Uma batalha nos tribunais se seguiu por meses, com vitória da Activision.
Além de ter lançado alguns dos melhores games do Atari, como River Raid, Enduro e Pitfall!, a vitória da Activision abriu caminho para que outras companhias terceirizadas pudessem lançar games para o Atari.
E.T vai para casa
Em 1982, líder de mercado e embalado pelos sucessos de games licenciados, Ray Kassar assinou contrato para a produção de um jogo sobre o filme E.T, de Steven Spielberg. Assinado poucos meses antes do lançamento do filme, o acordo previa que o jogo seria lançado junto do longa metragem, tornando o prazo de desenvolvimento impossível. Apesar dos esforços de Howard Scott Warshaw, desenvolvedor do game Yar's Revenge, E.T, o jogo, era péssimo e se mostrou um desastre de proporções históricas.
Como Ray Kassar havia mandado fabricar uma quantidade absurda de cartuchos (maior, inclusive, que a base instalada presumida do Atari VCS), e a absoluta ruindade do título ficou rapidamente conhecida entre consumidores e varejistas, milhões de cartuchos foram rejeitados e devolvidos, o que fez com que fossem enterrados em um deserto no estado do Novo México.
E.T acabou capitaneando o evento histórico conhecido como "o crash dos videogames", a grande crise que quebrou a indústria de videogames nos Estados Unidos, maior mercado do mundo. A Atari foi profundamente afetada por esse evento, terminando o ano de 1983 com assombrosos US$ 536 milhões em prejuízos. No ano seguinte, a Warner Communications vendeu a Atari para um grupo de investidores. A empresa nunca mais foi a mesma.
A oportunidade perdida
Além do desastre, a Atari ainda perdeu uma chance de ouro que poderia mudar a história dos video games: após lançar o Famicom no Japão em 1983, a Nintendo ainda reticente sobre sua capacidade em entrar no combalido mercado de consoles domésticos dos Estados Unidos, buscava um parceiro para lançar seu console em território americano. Os executivos da Nintendo buscaram um acordo com a Atari, oferecendo um contrato vantajoso que permitia à companhia americana lançar o Famicom em todos os países exceto o Japão. Mas duas razões fizeram a Atari desistir do negócio, a primeira é que é o Atari 7800, sucessor do VCS (que foi rebatizado de 2600 em 1982), já estava em desenvolvimento, e a segunda razão foi que executivos da Atari ficaram irritados quando souberam que o Colecovision, console concorrente do Atari VCS, recebeu uma conversão de Donkey Kong, sucesso da Nintendo para arcades. No fim das contas, o negócio não foi feito, a Nintendo lançou ela própria o Nintendo Entertaiment System, console que mudou a história dos video games.
Ecos do passado
Pós-crash de 1983, a Atari foi lentamente transicionando de uma empresa focada em video games para uma focada em computadores pessoais. Após o sucesso estrondoso do Atari VCS/2600, seus sucessores 5200 e 7800 ficaram bastante atrás da concorrência e nem chegaram perto de repetir o sucesso do primeiro modelo. Em 1989, a Atari tentou entrar no mercado de consoles portáteis com o lançamento do Atari Lynx, que a despeito das configurações avançadas para a época, ficou atrás do Sega Game Gear e sobretudo do Game Boy, líder desse seguimento até os anos 2000 com o Game Boy Advance.
Em 1993 a Atari lançou seu último console proprietário, o Atari Jaguar. Embora tenha sido lançado com o objetivo de superar os consoles 16-bits da época, no caso o Super Nintendo e o Mega Drive, seu alto preço aliado a arquitetura truncada, documentação de desenvolvimento incompleta e biblioteca de jogos raquítica, levaram o console a um rápido fracasso. Com a descontinuação do Jaguar em 1996, a Atari foi desmembrada e se transformou posteriormente em Atari Interactive, nome com que opera até os dias de hoje.
Por fim, um novo modelo do Atari VCS foi anunciado para ser lançado ainda em 2020. Seguindo os moldes dos consoles mini iniciado pela Nintendo com o NES Mini em 2016, o novo VCS promete conter tanto os games clássicos do console original de 1977 quanto novos games e recursos típicos de consoles atuais, tudo rodando sobre sistema Linux.
Hoje o nome Atari é um eco do passado, cujo legado à indústria dos video games é incalculável. Seus jogos e consoles marcaram gerações de jogadores, e títulos como River Raid, Space Invaders, Adventure, H.E.R.O, Pitfall!, Keystone Keepers (lançado no Brasil com o nome de Polícia e Ladrão), Enduro e Mario Bros são lembrados com carinho por trintões e quarentões do mundo inteiro.
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