Jogo Rápido
- Jogo exclusivo de PS4 tem lindas paisagens de uma ilha no século XIII
- Jogador é Jin Sakai, que luta contra a invasão mongol em sua terra natal
- Do combate impecável às inspirações artísticas, a experiência é envolvente mas exige paciência
Ghost of Tsushima, provavelmente o último exclusivo do PlayStation 4, está ao alcance dos dedinhos sujos de Doritos dos jogadores. Depois de alguns atrasos e dúvidas se ele realmente seria lançado nesta geração, finalmente podemos acompanhar a saga de Jin Sakai e sua luta contra a invasão mongol liderada por Khotun Khan na ilha de Tsushima.
Quando peguei o jogo, parecia uma tarefa fácil e divertida: jogar antecipadamente o promissor Ghost of Tsushima e escrever uma crítica sobre um jogo de samurais num mundo aberto. Se a primeira impressão do jogo fosse a minha única, diria para vocês passarem longe. A sensação era de jogar um game de 2014, com expressões faciais péssimas, personagens sem graça e um combate que não conseguia mostrar potencial. A boa notícia é que eu nunca me senti tão feliz de estar enganado.
Mundo aberto cuidadosamente montado
Ghost of Tsushima não reinventa o conceito de mundo aberto, pelo contrário. Ele explora tudo que há de bom no gênero, agregando qualidades e construindo uma experiência digna de elogios. Nada é novo, e tudo que já foi visto anteriormente é adotado para se encaixar da forma mais homogênea possível na experiência.
Daí a sensação, nas primeiras horas de jogo, que estaríamos diante de uma jornada cansativa e repetitiva; mas à medida que a história se desenvolve, novos elementos são adicionados ao pacote, seja na parte narrativa ou nas mecânicas de jogo. E essa é a maior qualidade de Tsushima: o discernimento para dosar seu conteúdo e deixar o jogador envolvido até o final.
GHOST OF TSUSHIMA NÃO REINVENTA O CONCEITO DE MUNDO ABERTO, PELO CONTRÁRIO. ELE EXPLORA TUDO QUE HÁ BOM NO GÊNERO, AGREGANDO QUALIDADES E CONSTRUINDO UMA EXPERIÊNCIA DIGNA DE ELOGIOS
A jornada é longa, mas não é cansativa. Ao lado do seu cavalo samurai —escolhido logo no começo da aventura— o jogador tem acesso a praticamente tudo que Tsushima tem a oferecer. A narrativa, porém, impõe restrições: o jogo é dividido em três atos, e cada ato libera uma parte da ilha.
Durante a exploração, Jin Sakai cavalga pelos campos floridos da ilha, se esconde na vegetação para invadir acampamentos mongóis, atravessa lagoas a nado e escala montanhas e construções locais. É possível fazer praticamente tudo que um dia já apareceu em algum tipo de mundo aberto, de forma completamente natural e homogênea dentro da proposta do jogo. Na concepção dos desenvolvedores, "se você vê um lugar no cenário, provavelmente conseguirá alcançá-lo".
Boas vindas a Tsushima
É muito difícil não se impressionar com a paisagem de Ghost of Tsushima. Cores vibrantes, variedade na vegetação, o horizonte infinito e, principalmente, o tempo gasto na criação de partículas espalhadas pelo cenário. É um negócio doido. Já reserve um espaço para suas screenshots no PS4, porque você vai precisar.
É como se todo o dinheiro do game tivesse sido todo investido em como fazer a folhagem das árvores cair de forma mais natural, preenchendo completamente o ambiente. Não só isso, mas o gramado, os vaga-lumes, a névoa que cobre o chão de certas florestas ou toda a neve da região mais ao norte da ilha: tudo isso preenche o ambiente. A Floresta Dourada vai te deixar de queixo caído, não importa quantas vezes você passe por ela. O impacto só não é maior porque parece que todo o resto do jogo não teve a mesma atenção.
É COMO SE TODO O DINHEIRO DO GAME TIVESSE SIDO TODO INVESTIDO EM COMO FAZER A FOLHAGEM DAS ÁRVORES CAIR DE FORMA MAIS NATURAL, PREENCHENDO COMPLETAMENTE O AMBIENTE
Ao mesmo tempo, a morte é sempre um lembrete de que aquele mundo não está bem, mesmo que as flores espalhadas pelo horizonte passem uma mensagem de paz. A guerra contra o exército mongol é cruel, e aflige demais a população da ilha. Uma população necessitada, com a violência sendo representada pela pobreza dos seus moradores, os gritos de socorro ou as vilas abandonadas e os templos repletos de refugiados.
Deixe o vento te levar
O Vento Guia é o artifício mais bem disfarçado nas mecânicas de Ghost of Tsushima: uma linha-guia que leva o jogador pelo mapa do jogo em busca do seu objetivo, como já vimos em tantos outros games. Aqui, porém, ela se apresenta como uma lufada de vento, bastante natural e não-invasiva, que pode ser ativada a qualquer momento do jogo.
O uso do touchpad para algumas funções, como tocar flauta, cumprimentar, embainhar a espada, também é usado para evocar o vento que guiará você por toda a ilha. A ideia aqui é manter a interface do jogo com o mínimo de interferências. Inclusive, no menu do jogo é possível desligar os demais itens de "sujeira", como barra de vida dos adversários e indicações do cenário, dificultando um pouco a experiência, mas tornando-a mais imersiva.
Navegar com o auxílio do Vento Guia faz a gente esquecer que um dia precisamos de minimapas para nos guiar.
Uma questão de honra
Através da história do game, experimentamos o que é ser um samurai e o peso do seu código de conduta. A proposta do jogo é clara: criar um conflito entre a tradição passada de geração a geração e a escolha de fazer a coisa certa, independentemente das consquências.
O problema é que a narrativa do jogo é linear o suficiente para eliminar qualquer dúvida ao longo da aventura. É como acompanhar o desenvolvimento do personagem de um filme, com roteiro previamente escrito, sem a interação do jogador para decidir absolutamente nada.
ATRAVÉS DA HISTÓRIA DO GAME, EXPERIMENTAMOS O QUE É SER UM SAMURAI E O PESO DO SEU CÓDIGO DE CONDUTA. A PROPOSTA DO JOGO É CLARA: CRIAR UM CONFLITO ENTRE A TRADIÇÃO PASSADA DE GERAÇÃO A GERAÇÃO
As cutscenes que exploram emocionalmente alguns desses conflitos, principalmente no início do jogo, são vergonhosas. Jin Sakai criança é uma daquelas crianças feias sem carisma algum, e seu tio, o Lorde Shimura, não ajuda muito na situação, principalmente quando clama por uma luta 'honrada', ao mesmo tempo em que leva todo o seu exército ao extermínio.
No final das contas trata-se de uma jornada mais assistida que participativa, mas não menos interessante de se acompanhar. O crescimento de Jin Sakai como guerreiro e ser humano é digna de nossa atenção, mesmo que um tanto brega em certos momentos.
Mirando Kurosawa e acertando o Último Samurai
Um jogo de samurais feito por americanos, mesmo que rodeados de consultores japoneses, não poderia escapar de certos clichês. Clichês que chegaram a comprometer o meu divertimento no início, mas que melhoraram no decorrer da aventura e se tornaram prazerosos de algum modo.
Um dos minigames do jogo, por exemplo, nos obriga a escrever um Haiku, uma das formas de poesia mais clássicas do Japão. Três frases escolhidas aleatoriamente, música de fundo e quase nenhum sentido aos que nunca ouviram falar desse tipo de literatura. De início não me pareceu a melhor forma de criar interesse na cultura, e com o passar do tempo a única coisa que mudou foi que deixei de dar importância para isso.
Não faz mal ao jogo, mas não instiga a curiosidade que jogos mais "autênticos" como Sekiro ou Nioh tendem a criar. O mesmo vale para alguns dos rituais envolvidos nos duelos de espadas. Eles não são ruins, mas por alguma razão são introduzidos no game como um recurso cinematográfico e não uma questão cultural. Dessa forma, samurais, mongóis, ronins ou simples fazendeiros compartilham do "costume".
Absolutamente tudo melhora no decorrer do jogo, e mesmo esses duelos ficam espetaculares em determinados momentos, mas essa questão cultural é passada mais de uma forma caricata, como se Quentin Tarantino resolvesse regravar alguma coisa do Kurosawa.
Falando de Kurosawa, é fácil encontrar referências dos seus filmes aqui e ali dentro do jogo. Das artes de capa dos filmes clássicos japoneses estampando animações de certas missões às construções de certos castelos e enquadramentos de combates entre exércitos, Akira Kurosawa foi bem representado aqui.
Uma prova concreta disso é colocar lado a lado a paleta de cores vistas em Ran, um dos filmes mais conceituados do diretor, com o que é visto em Ghost of Tsushima. O cinza dos castelos e o verde da grama rala dos campos de batalha contrastando com o amarelo e vermelho das bandeiras e armaduras samurais dos guerreiros: o jogo brinca com esse tipo de contraste o tempo todo. Novamente, em termos de cenários Tsushima é perfeito.
ABSOLUTAMENTE TUDO MELHORA NO DECORRER DO JOGO, E MESMO ESSES DUELOS FICAM ESPETACULARES EM DETERMINADOS MOMENTOS, MAS ESSA QUESTÃO CULTURAL É PASSADA MAIS DE UMA FORMA CARICATA, COMO SE QUENTIN TARANTINO RESOLVESSE REGRAVAR ALGUMA COISA DO KUROSAWA
"I am a samurai!"
O discurso dos personagens em inglês é ligeiramente diferente do texto apresentado nos diálogos japoneses. Apesar de as cutscenes serem produzidas em cima da dublagem americana, o tom do diálogo japonês soa diferente. É menos a autoafirmação do "Eu, como samurai devo fazer isso" para "Precisamos fazer tal coisa", deixando implícita a condição de nobre / guerreiro no seu jeito de falar.
A versão japonesa de Jin Sakai é interpretada por Kazuya Nakai, que tem pelo menos três personagens bem famosos dublados por ele (Zoro Roronoa, Masamune Date, Mugen), e consegue impor nobreza e força ao personagem. Em inglês, Jin parece mais um daqueles nobres mimados que finge ser guerreiro nas horas vagas. A versão americana de Jin se torna mais consciente de suas obrigações como guerreiro com o passar do tempo, mas fica difícil abandonar a voz do Zoro quando acostumamos com ela.
Uma pena que a versão japonesa de Khotun Khan não chegue aos pés da americana. Tanto o rosto quanto a voz foram emprestadas de Patrick Gallagher, que, entre outros papéis menores, era "Átila, o Huno" do filme Uma Noite no Museu. É como se o personagem tivesse pronto desde 2014, mas agora em sua versão séria.
No período de testes, apenas os idiomas inglês, japonês e francês estavam disponíveis. O português brasileiro estará disponível na atualização 1.03, segundo a Sony.
Samurai ou Fantasma?
O combate de Ghost of Tsushima é impecável. Da esgrima japonesa dividida em posturas até a liberação de todas as técnicas realizadas pelo fantasma, o jogador aproveita absolutamente tudo e não abandona nenhuma tática sequer.
Como samurai, temos à nossa disposição o kenjutsu, as tradicionais técnicas de espada japonesa. Elas são distribuídas em posturas de combate, cada uma levando vantagem sobre um tipo específico de inimigo. As quatro posturas são liberadas à medida que você derrota generais do exército mongol e podem ser utilizadas livremente durante o combate.
Além da espada, o arco e flecha tradicional (um curto e outro longo) também é bastante importante para o combate, e pode ser utilizado da forma que o jogador achar melhor, seja para manter o combate à distância, ou para liberar uma multidão de uma vez —com flechas explosivas, claro.
A partir do momento que Jin Sakai descobre formas mais eficientes de enfrentar exércitos sozinhos, somos apresentados às técnicas fantasma do jogo. Kunais, explosivos de arremesso, bombas de fumaça, tudo funciona em prol do ataque surpresa, algo que o samurai honrado nunca deveria usar.
Mesclar as duas formas de combate cria um dinamismo raramente visto em confrontos de mundo aberto. Tudo acontece muito rápido e cada golpe de espada é mortal, principalmente quando apostamos numa investida mais sorrateira. Mas nada impede o jogador de bradar o nome dos comandantes na porta de um acampamento e enfrentar todos de uma vez, de "maneira honrada".
O pior do jogo, sem dúvida, é a falta de variedade nos tipos de inimigos. Mongóis, ronins e mesmo a fauna da ilha mereciam uma maior variedade. Do segundo ato em diante não existem mais surpresas, e mesmo alguns generais inimigos com nome próprio não passam de versões de bonecos que já vimos anteriormente.
Dresscode samurai
Não existem lojas de equipamentos em Ghost of Tsushima. A espada do clã Sakai é sua companheira até o final da aventura, e o restante das suas armas e armaduras são adquiridas durante a história principal.
Cada uma das armaduras lhe concede vantagens específicas, seja para o combate ou exploração. É possível adquirir novas cores para elas ao custo de flores coletadas pelos cenários, mas é uma atualização apenas estética. A troca de peças de um conjunto vale somente para capacetes e máscaras.
Visitando um ferreiro você consegue deixar seu equipamento mais forte, e como consequência disso, mudar o visual da peça em questão. E mesmo depois de atualizados, é possível manter o visual antigo se o jogador preferir, sem perder os status adquiridos pelo upgrade.
Com a sua espada não é diferente na questão de upgrades. Já no caso do seu visual, é preciso encontrar os kits de espadas espalhados pelo mundo, mas não há mudanças nas suas características de combate —o lance é puramente estético.
Junto de tudo isso existem amuletos especiais que concedem certas vantagens ao estilo de jogo que cada um preferir. Os amuletos são adquiridos como recompensas tanto das missões principais quanto nas paralelas, e também na descoberta dos templos xintoístas. Vale muito a pena testar diversas combinações e sempre que possível, principalmente porque os menus de equipamento praticamente não tem tempo de carregamento algum e deixam tudo bastante prático.
O desenvolvimento de uma boa história
Ghost of Tsushima divide a experiência do jogador em atos definidos. Cada um deles reserva uma surpresa e cria um ponto de transição na narrativa, mas não impede o retorno do jogador em pontos já visitados. Ou seja, não precisa correr como um louco e realizar todas as missões paralelas de uma vez.
Ao lado da campanha principal e das missões paralelas, existem as missões específicas de alguns NPCs e os Contos Míticos. No caso dos NPCs, é quase como assistir a uma aventura fechada com dramas pessoais intensos e nem sempre com finais felizes. Já os Contos Míticos, sem a menor sombra de dúvida são as melhores missões que o jogo vai apresentar durante a sua campanha. Recomendadíssimo.
A história principal, apesar de começar meio mal das pernas, tem excelentes transições entre os atos e se mantém na crescente até o seu final. Poucos personagens são introduzidos na trama, deixando tudo muito focado em Jin, seu tio e o mongol Khotun Khan.
Confesso que as primeiras horas de The Ghost of Tsushima não me impressionaram em nada, o que me deixou bastante preocupado com o compromisso que havia me submetido a escrever sobre o game. Aos poucos ele foi me cativando e sem nem ao menos perceber, já estava há dias naquela ilha, enfrentando mongóis, ronins, resolvendo problemas dos moradores da ilha como se vivesse lá desde sempre.
Confira imagens de Ghost of Tsushima (PS4)
Lançamento: 17/07/2020
Plataforma: PS4
Preço sugerido: R$ 249,90
Classificação indicativa: 18 anos (Violência Extrema)
Desenvolvimento: Sucker Punch Productions
Publicação: Sony Interactive Entertainment
Jogue também: Sekiro, Nioh 2, Remnant: From The Ashes
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