Há quem diga que todos temos um monstro interior, e é na natureza das aberrações onde reside Carrion, game em que controlamos uma biomassa disforme em fuga de seu cativeiro, lançado para Xbox One (disponível no Game Pass), PC (Steam) e Nintendo Switch. Eu só penso em dois nomes para criar obra tão nefasta e mirabolante: Devolver Digital e Phobia Game Studio.
O monstro do jogo precisa escapar. E é o monstro que há em você quem vai ajudar. Antes, eu só peço que ouça o relato a seguir.
Dia zero: gênese
Pode parecer um tanto estranho escapar de um tubo de laboratório e pedir por domínio no controle de meus vastos tentáculos. Mas é fácil. Tão fácil, que é quase natural, uma extensão de seus dedos, ansiando destruição.
Como um títere de carne e ventosas, eu os projeto para todos os lados. A força descomunal abre espaço para a liberdade de movimentos. Sinto-me livre, e pela primeira vez desde que saí de uma hibernação de séculos. Talvez de milhares de anos.
Mesmo sem qualquer tipo de compaixão para quem me confinou, para quem fez de mim estudo e experimento, ainda consigo manter conexões mentais com aquele ou aquilo que me despertou. Curiosamente, compartilham a mesma espécie e mesmo lugar na cadeia alimentar. Para saber até onde vou, preciso saber de onde vim. E porque faço o que faço.
Gritos de desespero ecoam por onde me projeto, pedaços de corpos pavimentam meu caminho, com sangue servindo de via e vísceras, de fio condutor. A fome é quase insaciável, mas você, como parte do meu ser, sabe muito bem disso e não vai me deixar padecer.
Dia 19: os sentimentos de um monstro
Obstáculos diversos me separam de meus objetivos. É hora de usar os experimentos dos cientistas contra eles próprios. Crio ninhos, deixo a minha marca, de dentes, garras e carne, e comunico-me. Somos todos um, e sem a menor compaixão pelos bípedes com quem cruzo, sejam bolsas de sangue ambulantes, sejam mecânicos e frios.
A realidade aqui é uma selvagem. Mas é bem pior para quem não é monstro. Quando encorpo, destruo paredes metálicas, quando definho, arremesso teias pegajosas. Crio formas de interagir com o mundo deles, para alcançar os meus próprios fins. Comer e fugir.
Dia 451: evolução e putrefação
Sem espaço para excessos, minhas idas e vindas acabam limitadas ao meu único objetivo naquele exato momento. Agora, sei das minhas capacidades, porém, ainda não é fácil controlar a mente complexa dos bípedes verborrágicos.
Sei que não sobrevivem muito tempo submersos, sei também que fazem uso de outros corpos (ou seriam exoesqueletos?) para protegerem a si mesmos, além dos patéticos projéteis de metal e pólvora que insistem em depositar em minha biomassa pulsante, sempre sedenta por sangue.
Tiro suas vidas como quem tira pétalas de flores, mas eles também são um exército. E estão ficando raivosos.
Não tenho mais tempo para brincar com suas carcaças, pois suas formas de defesa pedem por artimanhas mais e mais difíceis de executar. E, por mais absurdo que soe, quanto mais descubro sobre minhas origens, mais tenho dúvidas sobre o futuro. Sobre o meu real papel nisso tudo.
Dia ???: apocalipse
Quando as cordas, tão estridentes quanto belas, e que serviram de orquestra para o meu caminho de destruição, param de súbito, também paro e reflito. O amanhã está em minhas mãos e minha escapatória inevitável será uma nova e caótica alvorada.
De lá até aqui, sinto que me refestelei na hipocrisia de toda uma indústria, que alterei muito mais que a forma de meu próprio corpo, mas o propósito em estender a si mesmo a fim de agradar quem tateia na escuridão de um contentamento sem propósito.
Meus tentáculos e dentes afiados causaram pânico e pavor, sim, em tudo aquilo que fez de mim experimento e cobaia, e muito mais ainda em tudo aquilo que nega e retrocede minha própria existência.
A semente foi incubada e germinada. Nasceu, cresceu e morreu um monstro.
Carrion
Lançamento: 23/07/2020
Plataforma: PC, Xbox One, Nintendo Switch
Preço sugerido: R$ 37,99 (Steam)
Classificação indicativa: 16 anos (Violência Extrema, Violência, Medo)
Desenvolvimento: Phobia Game Studio
Publicação: Devolver Digital
*A cópia do jogo para o texto foi cedida ao START pela Devolver Digital
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