Como montar um simulador de corrida ultrarrealista em casa? Veja dicas
Faça um teste: experimente dizer para qualquer pessoa aficionada por simuladores de automobilismo que títulos como Assetto Corsa Competizione e Automobilista 2 são apenas "games", para ver o que acontece. Geralmente, é o suficiente para começar um debate acalorado. O principal argumento de quem defende que eles são "mais do que jogos" está na alta fidelidade com que eles representam tudo que um piloto sente na pista ao pilotar um carro de corrida.
Mas será que isso é verdade? Para fazer essa comparação, START foi falar com alguém que tem experiência de sobra em corridas no mundo real: Felipe Massa, ex-piloto de Fórmula 1 e que atualmente corre na Stock Car pela equipe Lubrax Podium Stock Car Team.
Virtual ajuda no real
Durante sua carreira na principal categoria do automobilismo mundial, Massa disputou 15 temporadas e largou 269 vezes, tendo defendido três equipes: Sauber, Ferrari e Williams.
E essas duas últimas contavam com simuladores para o treino dos pilotos e também para o próprio desenvolvimento do carro.
"Na Ferrari, peguei o momento no qual estávamos começando a desenvolver o simulador", conta Massa. "Inicialmente, usávamos um da Fiat, que era bem rudimentar. Em seguida, a Ferrari comprou um bem avançado, inclusive capaz de se mexer para simular a força G [a aceleração relativa à gravidade da Terra]. Foi uma evolução bem grande", lembra. Ele também afirma que o equipamento da Ferrari foi o mais avançado que experimentou na F1.
Claro que, no automobilismo real, os simuladores são consideravelmente diferentes do que os disponíveis para PCs e consoles. Geralmente, são aparelhos feitos sob especificações pré-definidas. É como tentar comparar uma roupa vendida por uma grande varejista de shopping e outra feita, sob medida, por um alfaiate de alta costura.
O investimento também é maior. Massa estima que, na primeira década dos anos 2000, o aparelho da Ferrari tenha custado algo em torno de 2 milhões de euros [R$ 12 milhões na cotação atual]. "Não dá para saber ao certo, mas imagino que o atual passe dos 5 milhões de euros [em torno de R$ 31 milhões nos dias de hoje]".
"A principal utilidade dos simuladores é o desenvolvimento do carro, mas também é muito importante para os pilotos aprenderem um novo circuito antes de pilotar na realidade. Você consegue economizar o tempo e agilizar o aprendizado. Quando se usa o simulador, você não vai para a pista no zero", explica Massa.
Próximo, mas não igual
Na opinião de Massa, mesmo os simuladores mais avançados da Fórmula 1 ainda não conseguem replicar com perfeição o que acontece na realidade. "Para quem nunca correu em um carro de verdade, a impressão é que eles são uma experiência idêntica à vida real. Há muitos avanços, especialmente em termos de gráficos. Mas acho que 100% real é algo muito difícil de acontecer em um futuro próximo", diz.
Entre os principais pontos de diferença entre simuladores e vida real, o piloto cita variáveis como vento, temperatura e níveis de aderência, que variam o tempo todo em uma corrida de verdade. Há ainda o efeito da força G sobre o corpo. Ainda que simuladores mais avançados contem com um cockpit que se move de acordo com o movimento do carro, esse efeito fica muito longe do real. Para se ter uma ideia, em uma frenagem, o piloto de um carro de Fórmula 1 pode sentir até 5 G (cinco vezes a força da gravidade da Terra) sobre o corpo.
"A gente costuma falar que o piloto sente o carro 'com a bunda', porque é nessa parte do corpo que conseguimos notar detalhes referentes ao equilíbrio do carro. Em um simulador, não tem isso", explica.
Sem dúvida são pontos difíceis de serem traduzidos em um software, por mais que os simuladores tenham avançado consideravelmente. Além disso, há outro aspecto: o risco. Por mais seguros que sejam os carros hoje em dia, em corridas de verdade há sempre o risco de acidente e machucados, algo que passa longe da realidade de quem pilota na frente de uma tela.
Boa escola
Mesmo com limitações, Massa vê os simuladores como uma boa porta de entrada para o automobilismo. Até porque o custo da modalidade é praticamente inviável para quem não vem de família rica. "O talento do piloto conta, claro, e pode ajudar a conseguir investidores, mas o começo é complicado até mesmo no kart", reforça.
Para ele, os simuladores são ótimas formas de se ganhar experiência e ter um bom primeiro contato. "É uma forma de começar a aprender e dá muita noção mesmo para quem nunca andou em um carro de corrida. Ajuda muito, especialmente com os fundamentos mais básicos, como a forma de fazer curvas", completa.
Além de servir de "escola", as disputas virtuais podem ser um caminho para chamar a atenção de empresas e equipes reais. Entre 2008 e 2016, uma parceria entre a Nissan e a Polyphony Digital, empresa por trás de Gran Turismo, realizou a GT Academy, uma competição na qual os melhores colocados tinham a chance de se tornarem pilotos profissionais.
Outro exemplo é a McLaren. A equipe de Fórmula 1 (e que também compete em outras categorias) é parceira da Logitech no Logitech G Challenge, competição que premia os melhores colocados com experiências nos carros da marca.
Como começar?
Caso você tenha se interessado, o primeiro passo é obter um equipamento. E, por mais que disputar corridas em um simulador seja mais barato do que na vida real, o investimento não é baixo.
Seu computador precisa ser minimamente potente para rodar simuladores como Assetto Corsa Competizione e iRacing a pelo menos 60 quadros por segundo. Aqui, falamos de uma máquina com processadores de pelo menos seis núcleos e uma boa placa de vídeo.
O motivo para a escolha do PC é que a maior parte da comunidade desses jogos se concentra nessa plataforma. É claro que PlayStation e Xbox tem seus exemplos de simuladores, mas tanto Gran Turismo quanto Forza, respectivamente, se enquadram na categoria de "sim-cade", jogos com elementos de simulação, porém mais permissivos em termos de realidade.
Depois do PC, vem o conjunto de volante e pedais. Marcas como Logitech e Thrustmaster oferecem bons produtos a preços mais acessíveis, enquanto fabricantes como Fanatec têm modelos de melhor desempenho, mas a um preço consideravelmente mais alto. Para se ter uma ideia, só o aro de voltante modelo CSL Elite McLaren GT3 chega a R$ 2.217; além dessa peça, você precisaria também comprar a central do conjunto e os pedais separadamente.
Por fim, há os cockpits. Por mais que você possa jogar com o volante preso a uma mesa, ter um cockpit dedicado a esse fim costuma ser mais confortável para sessões mais longas e também dão mais firmeza aos movimentos, o que se traduz em um desempenho melhor. Além disso, diversos modelos contam com suporte para TV ou monitor, o que garante uma posição de pilotagem mais realista.
Quanto investir? É um daqueles casos em que, havendo recursos, "o céu é o limite". Dá para incluir até cockpit com sistema que simula os movimentos dos carros. É seguro estimar que, para montar esse setup mais básico (e considerando a alta no preço dos PCs no último ano), você vai gastar em torno de R$ 15 mil. Ainda assim, é um valor consideravelmente inferior às centenas de milhares de reais necessários para se correr uma temporada de kart profissionalmente.
Com o equipamento em mãos, o restante se resume a dedicação, treino e vontade de aprender. Ao contrário de games de corrida arcade ou até mesmo "sim-cade", jogos focados em simulação costumam ter uma curva de aprendizado bastante íngreme tanto em termos de pilotagem quanto na exigência de conhecimento técnico, algo útil para personalizar configurações dos carros e conseguir aquela fração de segundo que pode fazer a diferença entre uma vitória e uma derrota.
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