O que é alienação digital e como evitar que ela influencie estas eleições
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Uma interpretação genérica sugere uma sobreposição histórica entre disponibilidade de acesso à linguagem digital e ascensão de formas autocráticas de governo. Isso pode decorrer da tensão entre lógica comunitária e horizontal, predominante nas redes sociais com os dispositivos tradicionais da política, de natureza institucional e verticalizado.
Ou seja, o atraso em traduzir a velocidade, a flexibilidade e o "participacionismo" das redes em termos de renovação de nossas estruturas representativas ofereceu a oportunidade ideal para o ressurgimento de movimentos antipolíticos, que ao final mostraram-se apenas formas mais regressivas de política. De toda forma, nos vimos diante de um novo tipo de alienação, de corte digital, associada com a guerra híbrida e com a parasitagem de instituições jurídicas e midiáticas.
Democracia e liberalismo sempre tiveram um casamento conturbado, desde que a aurora da modernidade colocou no centro da preocupação política a ideia de representação.
Com ela esperava-se que líderes carismáticos, feitores personalistas e indivíduos notáveis cedessem espaço para administradores anônimos, projetos coletivos e políticas públicas capazes de sobreviver às variações entre governos.
Contra a soberania da representação ergueu-se outro princípio digital baseado na expressão. A cada transformação nos nossos modos de trabalhar, desejar e usar a linguagem equivale uma nova forma de ideologia, necessária para negar e inverter relações de privilégio e poder.
O estilo expressivo rapidamente transformou-se em critério monetizável, produzindo uma popularidade sem equivalente formal fora da rede.
Poder sem representação é o caminho mais simples para revolta e turbulência política.
De forma inédita este processo parecia colocar a direita como motor de popa para a transformação exigida por nossa época: líderes que dispensam mediações, que desrespeitam autoridades científicas ou sanitárias, que instrumentalizam preconceitos e nacionalismos para defender identidades majoritárias.
A alienação na identidade digital trouxe novidades formais importantes: uso de pseudônimos, fake news, retóricas de cancelamento, robôs e algoritmos de distorção.
Lembremos que a noção de alienação ressurgiu, simultaneamente, na filosofia de Hegel e no alienismo de Pinel, precursor das formas modernas de psicopatologia.
Alienar-se quer dizer perder a capacidade de reconhecer-se nos efeitos de nossos atos e palavras, mas também ser incapaz de reconhecer o estrangeiro que nos habita, bem como o outro como representante de nossa própria divisão subjetiva. Ou seja, alienar-se é negar as contradições da realidade e inverter o sentido de sua determinação.
Isso vale também para a concepção de alienação, trazida por Pinel, para redefinir a loucura como perda temporária da razão e processo de sua recuperação por atos de reconhecimento (o que ele chamava de terapia moral).
É possível que o que se vem enfrentando como negacionismo não seja mais do que uma combinação entre novas formas de alienação com novas maneiras de sofrer, com déficits ou distorções em experiências de reconhecimento.
Contudo, agora parece emergir uma série de dispositivos e práticas que criam uma espécie de estabilização da ideologia, ou seja, que sejamos capazes de perceber a presença da ideologia ou de ilusões delirantes em nós mesmos e nos outros. Isso não significa que sejamos capazes de prescindir delas.
Situação diferente de quando o coeficiente de distorção ainda não é aplicado. Por exemplo, durante os primórdios da propaganda, na sociedade de consumo de massa era preciso esclarecer as pessoas de que a propaganda "mente", que ela não era a expressão real de promessas e predicados de um produto. Nossa relação com ilusões e imagens segue o mesmo processo, pensemos por exemplo nas pessoas saindo correndo dos teatros onde os irmãos Lumière projetavam imagens de um trem chegando, nos primórdios do cinema.
Primeiro nos alienamos em imagens, depois descobrimos a realidade simbólica destas imagens e finalmente nos separamos destas imagens ao percebermos que elas são apenas suportes para localizarmos o desejo do outro.
Separar-se, portanto, é o antídoto básico contra a alienação. Deixar-se entrar em dúvida, inverter perspectivas, lembrar-se do processo ou das condições de produção de um determinado estado de mundo são procedimentos críticos que costumam compor esta vacina.
Levando em conta a noção de alienação digital, organizei esta pequena lista de procedimentos preventivos para a hora do voto que se aproxima:
1. 72 Horas - Verifica a forma como o partido do seu candidato distribui o dinheiro de campanha, com especial atenção à busca de equidade para mulheres, negros e indígenas :
2. Tribunal Superior Eleitoral - recursos para apuração, denúncia e legislação eleitoral
3. Ranking de popularidade digital - mapeia a preferência digital das candidaturas em São Paulo, BH, Rio, Salvador e Curitiba
4. Sleeping GIants Brasil - monitora empresas que financiam discursos de ódio e fake news
5. Agência Lupa - checadora de fatos
6. Agora é que são Elas - sobre a participação de mulheres na política
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