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Após ataque em escola, políticos podem ganhar superpoderes em redes sociais
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A falha do Twitter em moderar a hashtag #tcctwt, onde jovens postam glorificação de ataques nas escolas e ameaçam novos atos de violência, vai nos dar em 2023 um novo "momento baleia azul", bem quando o Congresso se prepara para votar uma nova regulação para a internet.
Em 2017 teve até Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o jogo que estaria levando crianças e adolescentes a se ferirem ou mesmo a cometer suicídio.
A CPI da Baleia Azul ganhou impulso com o pânico e o desconhecimento generalizado sobre como funcionava o suposto jogo. Vários casos começaram a ser atribuídos ao Baleia Azul e uma medida para punir os responsáveis precisava ser implementada.
Acontece que não havia quem centralizasse as ações do suposto jogo. Ele não era um aplicativo, um game instalado nos computadores, mas sim uma dinâmica que mais se assemelha aos atuais desafios, só que compartilhado em comunicações privadas e não através de vídeos públicos.
No meio das propostas sobre como aumentar a proteção de crianças na internet e criminalizar esse tipo de jogo, surgiram outras que buscavam acelerar a remoção de críticas a políticos nas redes.
Eu sei, parece que não tem nada a ver uma coisa com a outra, mas a CPI da Baleia Azul acabou expandindo os debates sobre regulação da internet e dali apareceram vários projetos.
Uns pretendiam alterar o Marco Civil da Internet para facilitar a remoção de conteúdos, outros mudavam o Código Penal. Acabou sendo aprovado um PL que criminalizava desafios que levassem a danos como automutilação, de olho em coisas como Momo e Baleia Azul.
Agora, se tem uma pauta que une as diferentes tribos políticas é a proteção de crianças na internet.
É só lembrar que tramitou na Câmara Municipal do Rio de Janeiro um projeto sobre ações de combate ao jogo Baleia Azul, de autoria de vereadores como Otoni de Paula (MDB), Cláudio Castro (PL) e Marielle Franco (PSOL).
Tempestade perfeita
Enquanto o Twitter não se mexe e um punhado de usuários combinam atos de violência para um certo dia, começam a aparecer mensagens de gente com medo de mandar os filhos para a escola e coordenador cancelando atividades.
É a tempestade perfeita para reviver o clima do Baleia Azul.
Agora que as atenções da mídia estão em cima das mensagens trocadas no Twitter, em canais do Discord ou do Telegram, é provável que exista até uma certa manipulação nesses ambientes para fazer parecer que ações têm proporções maiores ou que existe uma enorme rede de menores pronta a ser acionada para cometer atos violentos. Nada que algumas contas automatizadas não consigam fazer parecer verdade.
De toda forma, existe sim um processo perigoso de radicalização de menores voltado à glorificação de atiradores em escolas, que compartilha edits com fotos e cortes de vídeos romantizando os assassinos.
Esses grupos saíram das chans (fóruns de internet para os mais diversos assuntos, geralmente com pouca moderação) e passaram a atuar nas redes sociais mais populares.
Cabe às plataformas agirem para coibir o compartilhamento desse conteúdo, que é contra às suas próprias regras, por sinal.
Proteção das crianças ou dos políticos?
Uma atualização das regras sobre internet no Brasil pode ser positiva, mas se ela vier como resposta a episódios de violência nas escolas a emenda pode sair pior do que o soneto.
Lembra que a CPI da Baleia Azul flertou com a ideia de dar superpoderes aos políticos nas redes, fazendo com que eles tivessem acesso a um processo de remoção de conteúdo fast track?
O PL2630/2020, que procura ser o novo marco para a regulação da internet no Brasil, está prestes a ser votado na Câmara dos Deputados. Ele traz inovações importantes, mas também dá aos políticos imunidade nas redes sociais.
Se antes os políticos removeriam críticas rapidamente, agora eles poderiam falar o que bem entendessem sem correr o risco de ter postagens removidas ou moderadas.
Dado o papel central que contas de políticos em redes sociais tiveram em campanhas de desinformação recentes, de vacinas ao funcionamento das urnas, é de espantar que um projeto que foi pensado para combater as fake news acabe chancelando esse tipo de expediente.
De toda forma, também não espantaria se a adesão ao PL ganhasse um impulso com esse intuito de restringir mensagens que incentivam atos violentos na escola.
A regulação da internet no Brasil pode viver o seu segundo "momento Baleia Azul". Tanto no que diz respeito ao pânico generalizado levando a soluções emergenciais, como pelo aproveitamento das mudanças para se criar novas regras sobre como políticos falam (ou são falados) nas redes.
O Brasil se saiu bem do primeiro momento Baleia Azul. A legislação aprovada foi pontual e não passaram as propostas que davam aos políticos superpoderes nas redes sociais.
Mas agora, com a necessidade de reagir à violência de 8 de janeiro, combater a desinformação e pacificar as escolas, o desafio de se alcançar o equilíbrio é dobrado.
Enquanto isso, o Twitter, que deveria moderar os conteúdos ilícitos que jogam gasolina nesse debate, responde aos questionamentos da imprensa sobre esse e outros temas com emoji de cocô. Sem comentários.
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