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Opinião

Volta do X/Twitter abre novo round e expõe fragilidade de ordem de bloqueio

Na manhã da quarta-feira (18), o X voltou a funcionar no Brasil. Teve gente que correu para matar as saudades, enquanto outros questionaram no BlueSky e no Threads se era mesmo o caso de retornar, avaliando as vantagens e as desvantagens das novas redes.

Acontece que - juridicamente - nada mudou. A ordem de bloqueio, emitida pelo Supremo Tribunal Federal, continua válida após por diversas falhas da empresa em cumprir a legislação nacional. A Anatel continua determinando que as operadoras suspendam o acesso à plataforma.

Tudo indica que o repentino acesso ao X decorre de uma mudança pela qual a empresa é acessada na rede, deixando de se valer dos IPs (internet protocol) próprios da Twitter Network, que foram bloqueados no Brasil, e passando a contratar os serviços da Cloudflare, que não apenas usa um endereçamento diferente, como também atende uma série de sites importantes no país.

De olho na Cloudflare

A Cloudflare oferece uma série de serviços que aumentam a segurança e a eficiência no acesso a conteúdo de empresas na internet, desde a proteção de servidores contra ataques de negação de serviço até a disponibilização do conteúdo do cliente em servidores que estejam mais próximos dos usuários, tornando assim o acesso mais rápido.

A Cloudflare não existe para servir de "escudo" para maus atores na internet, como pode ficar parecendo a partir de algumas caracterizações que começam a aparecer. O risco aqui é que se comece a condenar um serviço ou uma tecnologia como um todo por conta do uso eventualmente ilícito que pode ser feito dela.

É o mesmo debate que vimos com as VPNs (redes virtuais privadas), que chegaram a ser proibidas de existirem nas lojas de aplicativos brasileiras por força da primeira versão da ordem de bloqueio do X emitida pelo ministro Alexandre de Moraes.

O próprio ministro acabou voltando atrás, talvez por ter percebido que VPNs não servem apenas para mascarar o acesso a sites como vindo de um outro país, mas que são ferramentas importantes para conferir mais segurança e privacidade à navegação na internet.

Uma questão que vale acompanhar é como a Cloudflare vai se comportar uma vez ciente de que a sua cliente X, através dos seus serviços, passou a ser acessível no Brasil e que isso viola uma ordem judicial de bloqueio em âmbito nacional.

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Cloudflare já removeu site com conteúdo neonazista

Em 2017, a Cloudflare encerrou unilateralmente a prestação de serviços ao site The Daily Stormer, que apoiou uma manifestação de supremacistas brancos em Charlottesville, nos Estados Unidos, resultando na morte de uma pessoa.

O presidente-executivo da empresa, Mathew Prince, afirmou que a decisão era "perigosa", mas que os "termos de serviço nos reservam o direito de encerrar usuários de nossa rede a nosso exclusivo critério. O ponto de inflexão para tomarmos essa decisão foi que a equipe por trás do Daily Stormer afirmou que nós éramos secretamente apoiadores de sua ideologia."

E complementou: "Nossa equipe tem sido minuciosa e realizado discussões profundas por anos sobre qual seria a política correta em relação à censura. Como muitas pessoas, sentimos raiva dessas pessoas odiosas por muito tempo, mas seguimos a lei e permanecemos neutros em relação ao conteúdo em nossa rede. Não podíamos permanecer neutros após essas alegações de apoio secreto pela Cloudflare."

Cloudflare vai adotar medidas para impedir acesso ao X?

Vale a pena acompanhar como a empresa vai agir com relação ao bloqueio do X no Brasil. Parece improvável que ela tome a mesma solução adotada no caso Daily Stormer, já que não se trata de rompimento unilateral do contrato, mas talvez de algum ajuste para oferecer o serviço ao X em outros países, mas não no Brasil.

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Por outro lado, caso a empresa resolva comprar a briga e não mexer em qualquer configuração, permanecendo o X acessível através dos seus serviços no Brasil, corremos o risco de ver os seus endereços sendo bloqueados no país. Esse cenário poderia gerar impactos que vão muito além da relação entre X e Cloudflare, já que diversos outros sites que usam os serviços da empresa poderiam apresentar instabilidades ou mesmo se tornar inacessíveis. E não estamos falando de sites pequenos.

Vamos acompanhar as próximas cenas de mais esse round na novela sobre o bloqueio do X no Brasil. A entrada em cena da Cloudflare traz uma série de complexidades à dinâmica do bloqueio que, se não endereçadas com a devida cautela, podem acabar ampliando o impacto da medida, atraindo mais críticas à forma pela qual o STF tratou de questões técnicas (como o bloqueio de VPNs) na edição da ordem de bloqueio do X.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

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