Diogo Cortiz

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Opinião

Zuck jurou proteger, mas fez pacto secreto com Google que atinge crianças

Em uma sala de audiência no Congresso americano, Mark Zuckerberg virou-se para as famílias de crianças vítimas de violência nas redes sociais, pediu desculpas pelos acontecimentos e afirmou que a Meta estava comprometida em transformar as suas plataformas em um ambiente seguro para os jovens.

A cena que ganhou o mundo aconteceu em janeiro deste ano, durante uma audiência no Senado dos EUA sobre a exploração sexual infantil no mundo online. Mas, enquanto Zuckerberg fazia esse gesto, sua empresa colocava em prática, na surdina, uma ação nada ética que mirava justamente os menores de idade no universo digital.

O jornal inglês Financial Times revelou nesta semana que Google e Meta fizeram um acordo secreto para impulsionar anúncios do Instagram para jovens e adolescentes no Youtube, contrariando as próprias regras das plataformas que proíbem o direcionamento de propaganda para menores de 18 anos.

O Google teria usado uma brecha para não dar na cara que estavam fazendo algo que violava as suas políticas.

Como não é permitido segmentar propagandas para menores de idade, os anúncios foram configurados para atingirem um grupo de usuários rotulados como "desconhecidos", que a plataforma sabia contemplar uma grande quantidade de menores de 18 anos.

E para garantir ainda mais assertividade, os outros grupos etários foram desativados nestas mesmas campanhas.

O Google respondeu ao Financial Times com a seguinte nota:

"Proibimos anúncios personalizados para pessoas menores de 18 anos, ponto final. Essas políticas vão muito além do que é exigido e são respaldadas por exigências técnicas. Confirmamos que essas garantias funcionaram corretamente aqui."

A empresa não comentou nada sobre o uso do grupo "desconhecido". É aí que mora o detalhe.

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Essa é uma técnica conhecida como classificação por proxy (ou por procuração), que identifica pessoas ou grupos de pessoas por meio de características indiretas.

Por exemplo, é possível inferir a faixa etária de um usuário sem usar a informação da idade, mas a partir dos dados do seu comportamento e preferências.

Esse é um tipo de coisa que os algoritmos de inteligência artificial conseguem fazer muito bem e, por consequência, deixam as pessoas ainda mais vulneráveis e vira uma grande ameaça para a privacidade.

O projeto teria começado no fim de 2023. Uma empresa chamada Sparky Foundry, subsidiária americana do grupo francês Publicis, foi contratada pela Meta para conseguir mais usuários da geração Z para o Instagram, que tem perdido a atenção dos mais jovens para o TikTok.

A ideia era encontrar formas de atrair esse público a partir de outras plataformas, inclusive o YouTube, para dentro do Instagram.

Além dos questionamentos éticos, a parceria parece estranha até do ponto de vista de negócios, pelo menos em um primeiro momento. Por que o YouTube topou um projeto especial de propaganda para uma plataforma concorrente?

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A questão se justifica do ponto de vista econômico. Enquanto o Google via a oportunidade de promover anúncios lucrativos, a Meta colocava em prática uma ação para evitar o sangramento da perda de usuários mais jovens.

Foi um jogo de ganha-ganha para as duas big techs, e quem perdeu mais uma vez foi a sociedade com a manipulação e falta de transparência.

O momento é de total preocupação dos impactos que as redes sociais causam para os mais jovens.

escrevi sobre isso em outra coluna. Esse tipo de comportamento das plataformas escancaram que muitas vezes os usuários, inclusive os mais vulneráveis, são tratados como uma presa fácil ou uma mercadoria.

As big techs promovem uma narrativa de autorregulação. Defendem que não precisam de leis específicas porque são capazes de trazer regras para o jogo a partir de suas políticas de uso e mecanismos próprios de governança.

Porém, essa situação cria evidências para quem argumenta que a autorregulação pode não ser suficiente, afinal, as plataformas criam regras que elas podem facilmente contornar.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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