Diogo Cortiz

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Opinião

Por que brasileiros não deveriam topar escanear a íris em troca de dinheiro

Como provar que você não é um robô? Parece uma pergunta tirada de um conto de ficção científica, mas já movimenta um negócio bilionário. Em cidades ao redor mundo, uma pequena esfera metalizada está escaneando a íris das pessoas para gerar uma identificação digital e tentar resolver esse problema.

Chamado Orb, o aparelho faz a leitura da íris e gera a WorldID, uma espécie de passaporte descentralizado. Isso faz parte de um projeto da startup "Tools for Humanity", co-fundada por Sam Altman, CEO da OpenAI.

A missão da empresa é promover alguma forma de identificação de humanos em um futuro que será inundado por máquinas e agentes de IA.

Hoje mesmo sabemos que não está tão fácil separar o comportamento de uma pessoa de carne e osso da ação de um bot em um rede social, e a tendência é que esse problema se intensifique com uma IA que fica a cada dia mais sofisticada.

Diversas estratégias foram desenvolvidas para separar a ação de um humano da ação de uma máquina no ambiente digital. O Captcha é a técnica mais conhecida, mas sua eficácia passou a ser questionada com o avanço da inteligência artificial.

É nesse vácuo que a "Tools for Humanity" criou o projeto "World", uma plataforma que tenta criar uma espécie de ecossistema para humanos que seja imune a bots. A plataforma é composta por quatro principais serviços:

  • World ID: prova digital de humanos para a internet
  • World App: app utilizado para armazenar com segurança o World ID e trocar ativos digitais.
  • World Chain: blockchain projetado para ser usado por humanos
  • WorldCoin: criptomoeda que faz parte do ecossistema

Para acessar a plataforma é preciso gerar sua prova digital (World ID), e isso acontece pela Orb, que acaba de chegar em São Paulo.

São aproximadamente 10 postos de coleta espalhados por shoppings na cidade. Quem aceita ter a sua íris lida pela empresa, pode ser retribuído com até 25 WorldCoins - o que dá aproximadamente R$ 300.

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Embora a missão da World pareça interessante, é preciso discutir sobre as consequências que isso possa ter.

Do ponto de vista técnico, o projeto pode estar, de fato, criando uma rede de humanos para humanos. No entanto, a pergunta que fica é: a qual custo?

A privacidade é uma moeda que deixamos de entender bem o seu valor. Muitas pessoas não questionam mais sobre o que as empresas fazem com seus dados e quais as consequências para as suas vidas.

As imagens coletadas pela Orb são usadas para criar um código da íris que representa de maneira matemática as características mais importantes dos padrões da íris da pessoa.

De acordo com a empresa, as imagens são imediatamente deletadas. Mas mesmo que a foto de nossos olhos tenha sido excluída, a empresa ainda continua com um identificador único nosso em suas mãos —como se fosse uma digital sua, que pode estar sendo associada a outros dados pessoais e sensíveis que existem de você por aí.

A World está fazendo uma coleta em massa no mundo todo, usando como pano de fundo a solução de um potencial problema futuro e oferecendo em troca remuneração em uma moeda que ela mesmo emite. Não é por menos que a ANPD (Agência Nacional de Proteção de Dados) abriu um processo, na última quarta-feira (13), para buscar mais informações e verificar se o projeto está em conformidade com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

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É importante que a sociedade brasileira seja conscientizada sobre as consequências desse processo, entendendo também as questões éticas e de privacidade envolvidas.

Vale lembrar que "não existe almoço grátis", mesmo quando a empresa diz em seu site querer garantir um sistema econômico mais justo.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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