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Como um post com poesia fez uma big tech chinesa perder US$ 16 bilhões
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Cometer gafes e falar bobagens em redes sociais já custou caro a muitas pessoas e empresas. No Brasil, por exemplo, muitos empresários sofreram críticas e boicotes dos consumidores por publicarem mensagens relativizando a importância das mortes na crise de covid-19. Entre famosos e anônimos, declarações infelizes já renderam desde o cancelamento de contratos de patrocínio até demissões sumárias, em função de mensagens consideradas ofensivas.
Não havia registro, no entanto, de alguém que tenha perdido US$ 16 bilhões (o equivalente a cerca de R$ 84 bilhões) por um único post. Agora, no entanto, há e seu autor é Wang Xing, o CEO e fundador da Meituan-Dianping, uma das mais importantes big techs do país.
Wang é considerado um pioneiro na digitalização da venda de serviços do mundo offline, como a compra de comida em restaurantes, reservas em hotéis, manicures, contratação de seguros online ou encomendas em supermercados. O app Meituan, desenvolvido sob sua orientação, integrou todos estes serviços em uma única plataforma, que transaciona milhões de dólares todos os dias.
Há um mês, a Meituan é alvo de uma investigação, movida por promotores chineses, que pedem que a empresa pague uma multa de US$ 800 milhões por supostas práticas monopolistas.
A pressão sobre a Meituan não é exclusiva, já que outras big techs do país são ameaçadas de multa, sempre pelo mesmo motivo: práticas desleais para suprimir novos competidores nos mercados em que atuam.
Wang Xing é um ativo membro do microblog Fanfou, plataforma que pode ser comparada ao Twitter, em que soma 200 mil seguidores. Nos últimos 14 anos, Wang manteve o hábito de postar, no mínimo, três vezes por semana.
No início deste mês, porém, em meio à crescente pressão regulatória, Wang reproduziu em seu microblog versos de um poema chinês escrito há mais de mil anos, durante a dinastia Tang.
O poema é uma crítica à censura praticada pelo primeiro imperador da China, Qin Shihuang, que ordenou a incineração de escritas "subversivas", há mais de mil anos.
No texto, o poeta diz:
Antes que as cinzas [da fogueira de livros] esfriem, revoltas surgirão ao leste das montanhas"
Em outro verso, o poeta critica aqueles que "consideram a cultura algo fútil e punem pessoas buscando suprimir ideias".
A mensagem, embora seja, em tese, apenas literatura, foi interpretada pelo mercado como uma provocação ao governo da China.
Como se sabe, o histórico de empresários que confrontam o governo local não é de sucesso econômico.
O post gerou imediata reação de investidores na bolsa de Hong Kong, onde a Meituan negocia seus papéis. Em um único pregão, os ativos da empresa perderam mais de US$ 16 bilhões em valor, indicando que o mercado local crê fortemente que a poesia de Wang deve gerar problemas financeiros à inovadora companhia chinesa.
O texto de Wang viralizou na web chinesa e, segundo a consultoria Enlightment, mais de 4,2 milhões de pessoas comentaram a mensagem, insinuando a indisposição do empresário com o governo local.
Ao se deparar com a estrondosa polêmica, Wang apagou o post e, em nova mensagem, disse que a poesia fazia referência às dificuldades de empreender em um ambiente muito competitivo, em que novas ideias (geradas por competidores) não podem ser suprimidas, desafiando constantemente os players dominantes (no caso, a Meituan, líder em seu segmento).
A queda multibilionária no valor dos papéis da empresa, no entanto, deixa clara a percepção do mercado sobre o assunto: para fazer dinheiro na China é preciso ter pleno alinhamento com o governo local.
E mesmo uma singela poesia, se publicada em contexto dúbio, pode causar enormes prejuízos.
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