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Felipe Zmoginski

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

China toca superprojeto para se tornar o padrão de tecnologia do mundo

Denys Nevozhai/ Unsplash
Imagem: Denys Nevozhai/ Unsplash

17/07/2021 04h00

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O desempenho da economia chinesa no início de 2021 é simplesmente fabuloso. Segundo números oficiais, o PIB do 2º trimestre deste ano, frente a igual período de 2020, registrou expansão de 7,9%. Um trimestre antes, a expansão foi de 18%. O número, é claro, deve ser visto com reservas: a base de comparação é com o período de lockdown realizado no ano anterior, que resolveu a crise de covid-19 no país, mas golpeou duramente a economia naquele período.

A robustez dos números chineses, porém, impressiona mesmo quando feita esta ressalva. No período de abril/maio/junho, o país voltou a exportar com força (US$ 30,6 bi em vendas para o exterior) e importar com mais ímpeto (US$ 38 bilhões em compras). A meta para o ano completo de 2021 é que o país volte a crescer 6%. Em 2020, cresceu 1%.

O dado mais surpreendente da recuperação chinesa é que ela se dá, fortemente, puxada pela exportação de bens e serviços, sobretudo os de tecnologia. Ao longo dos últimos anos, acreditava-se que a China deveria sustentar sua nova fase de crescimento via consumo das famílias, já que vetores como exportações e investimento público pareciam esgotados.

O fato é que apesar dos pesares —como a guerra comercial e a pandemia— a China segue elevando o valor de suas exportações, puxadas sobretudo por itens de tecnologia, como infraestrutura para redes 5G, aplicações de inteligência artificial, projetos de trens de alta velocidade e equipamentos para geração de energia limpa.

Um estudo publicado esta semana pelo Instituto Nacional de Políticas Públicas do Japão, portanto uma fonte independente, indica que grande parte destes resultados positivos se dá em função do avanço do programa "Belt and Road", lançado em 2013.

A China, país com maior volume de reservas internacionais em todo o mundo, está usando parte deste dinheiro - antes parcialmente estocado em títulos da dívida americana— para financiar projetos de infraestrutura em países da Ásia e Europa, a chamada "nova rota da seda".

O superprojeto envolve acordos com 68 países que, somados, representam 40% do PIB mundial e prevê multibilionárias obras de infraestrutura de energia, transporte e telecomunicações. Na Europa, porém, as três maiores economias do continente (Alemanha, Inglaterra e França) evitaram assinar tratados definitivos com os chineses em torno do Belt and Road. O motivo: a disputa por padrões de tecnologia.

A China espera que as 68 nações beneficiadas pelo investimento de Pequim comprem, em contrapartida, produtos e serviços de alto valor agregado de empresas chinesas.

O projeto é o pilar central do programa "China Standards 2035", ano em que o país acredita que terá imposto seus "padrões" de tecnologia como os dominantes na maior parte das cadeias produtivas de mercado, como padrões de conectividade sem fio, padrões de arquitetura para semicondutores, padrões para plantas de energias limpas e carros elétricos, por exemplo.

O ambicioso projeto chinês é, por óbvio, criticado pelos Estados Unidos, que veem no investimento asiático uma forma de fazer... política.

Por mais que as críticas americanas possam ser vistas como suspeitas —e são— em um ponto os americanos têm razão: muitos projetos do Belt and Road não são sustentáveis e os países emergentes que tomam empréstimos para construir infraestrutura com capital chinês podem não conseguir arcar com os pagamentos no médio e longo prazo, gerando uma crise financeira que colocará em risco o crescimento da China, dos países tomadores de crédito e, por fim, a economia global.

Para a China, porém, estes riscos podem ser controlados e não são, digamos, muito maiores do que deixar seu capital estocado em títulos da dívida de um país (os Estados Unidos) que em quase tudo lhe tem sido hostil.