Topo

Felipe Zmoginski

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Restrições contra a covid-19 na China já ameaçam produção do iPhone 14

Produção do novo iPhone sofre os impactos do lockdown na China para conter a covid-19 - Laura Chouette/ Unsplash
Produção do novo iPhone sofre os impactos do lockdown na China para conter a covid-19 Imagem: Laura Chouette/ Unsplash

06/05/2022 04h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

A política "covid zero" determinada em toda a China é a responsável pelo país ter um dos mais baixos níveis de morte per capta por esta doença no mundo. E também pela rápida recuperação econômica do país no pós-pandemia. Graças a uma política de isolamento efetiva, a população chinesa passou a maior parte do biênio 2020-21 em clima de quase normalidade, enquanto o resto do mundo, com triste destaque para o Brasil, registrava milhares de mortes diárias.

Agora que há vacinas e medicamentos comprovadamente eficazes contra o vírus, há muitos questionamentos se faz sentido a manutenção de uma política "covid zero". Afinal, alertam muitos especialistas, é improvável que o vírus "desapareça", mas sim que tenhamos que conviver com ele por muitos anos, porém não mais em níveis endêmicos como antes —já que há, por exemplo, ampla vacinação contra a enfermidade.

Ocorre que, na China, a regra de ouro é bloquear a transmissão do vírus e testar, permanentemente, sua população. As regras são tão rigorosas que, no entorno de Xangai, o recente lockdown afetou restaurantes e centros de distribuição de alimentos. Com fome, a população "quebrou" as regras e foi às ruas protestar.

Esta semana, a província de Zhengzhou, no centro-norte do país, registrou quatro novos casos de covid e mais dez "suspeitos". Os números são mínimos, mas, mesmo assim, o governo local determinou um lockdown de uma semana. Ninguém entra, ninguém sai.

Além do drama particular de quem vive sob tais restrições, há também desdobramentos econômicos: a província é responsável, sozinha, por entre 60% e 80% de todos os iPhones montados na China.

Isto ocorre porque, nesta região, foram instaladas as fábricas da Foxconn, maior integradora mundial de produtos da Apple.

Há uma semana, a empresa oferecia salários de 8.500 yuans para recrutar trabalhadores. As vagas, no entanto, foram "congeladas" e, agora, há dúvidas sobre se a Foxconn, sem poder contratar ou trazer novos operários para suas linhas de montagem, conseguirá cumprir as metas de produção necessárias para as vendas do lançamento do iPhone 14.

Note que, há tempos, a Foxconn transfere suas plantas de montagem de iPhones das regiões mais ricas da China, como Shenzhen e outras cidades litorâneas para o interior do país, como Zhengzhou. E, mesmo assim, veja o custo do trabalhador: 8500 yuans... ou algo como R$ 6.200.

Estes números são muito interessantes para avaliar a evolução econômica da China e dão um banho de realidade naqueles que insistem em dizer que o país asiático enriquece graças ao "trabalho escravo". Se não, vejamos.

Para efeito de comparação, segundo o site Glassdoor, um operador de fábrica em São Paulo —estado mais rico do país— ganha entre R$ 2 mil e R$ 4 mil. Bem menos que seu equivalente chinês.

Se tomarmos como medida a Bahia, por exemplo, estes números caem para entre R$ 1.500 e R$ 3.500.

Em outras palavras, um operário de fábrica do interior da China conseguiria, com o salário de um mês, comprar um iPhone 13 que, na sua configuração com 128 GB custa 5.199 yuans. E ainda sobrariam 2.300 yuans para outros gastos.

Já um trabalhador brasileiro, que ganhe R$ 4 mil, o valor mais alto para um operador de fábrica no Brasil, não consegue o mesmo feito. Em promoção, com sorte, um brasileiro encontrará um iPhone 13 de 128 GB por cerca de R$ 5 mil em lojas online.