Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Não é só iPhone: muitas inovações que usamos hoje lembram Steve Jobs
Essa terça-feira (5) marcou o aniversário de 10 anos da morte de Steve Jobs, um dos fundadores da Apple, que além de atuar como CEO também foi responsável por muitas das inovações que a empresa lançou no mercado.
Quando se trata de Apple, o primeiro produto que vem à mente da maioria das pessoas é o iPhone, sem dúvida o mais popular da empresa. O iPhone foi lançado em 2007, mas a história de Jobs e suas inovações na Apple começa nos anos 70 e vai muito além do smartphone.
Para celebrar o legado deixado por Jobs no mercado da tecnologia e aqueles que nele atuam, trago aqui um resumo das inovações que viram a luz do dia por sua visão e trabalho.
Já adianto que é muito difícil resumir uma vida profissional cheia de reviravoltas e inovações em poucas linhas, então senta que lá vem a história.
O primeiro computador pessoal
Em 1976, quando ainda trabalhava com seu amigo Steve Wozniak (conhecido como Woz), Steve Jobs viu uma oportunidade nos computadores, que na época consistiam em kits de eletrônica que você precisava montar. A ideia era que computadores poderiam ser produtos para as massas, uma "bicicleta para a mente", como Jobs iria comentar anos depois.
Dessa visão surgiu o primeiro produto da empresa, o Apple Computer, que depois passou a ser conhecido como Apple-1 (Apple One). Na época, Jobs teve que vender seu único veículo (uma Kombi) para poder financiar a fabricação do produto.
O Apple-1 foi o primeiro computador verdadeiramente pessoal no mercado. Mesmo assim, ainda exigia conhecimentos em programação, já que o "sistema operacional" dele era um editor de texto onde o usuário criava programas utilizando a linguagem BASIC.
Apesar de inovador para a época, o Apple-1 continuou sendo um produto de nicho. Foi com seu sucessor, o Apple II (Apple Two) que a empresa conseguiu emplacar o computador como um produto para se ter em casa.
Com o passar do tempo, os computadores foram se tornando cada vez mais acessíveis e deixaram de ser uma ferramenta presente apenas nas empresas, tornando-se um eletrodoméstico como outro qualquer.
Interface gráfica
Hoje em dia estamos acostumados a utilizar computadores e dispositivos móveis com interfaces gráficas, mas inicialmente todos os computadores utilizavam algum tipo de linha de comando, exigindo conhecimento técnico avançado do usuário.
O trabalho para desenvolver um computador com interface gráfica, com ícones e um cursor, já havia começado na Xerox, mas a empresa não via uma forma de colocar um produto no mercado com a inovação.
Foi então que a Apple de Jobs começou a trabalhar para tornar isso uma realidade, lançando no mercado em 1984 o Macintosh. Foi ele que introduziu o conceito de interface gráfica e mouse no mercado, o que viria a se tornar padrão em todos os computadores pessoais dali em diante.
Demitido da própria empresa
Em 1983, o próprio Steve Jobs convenceu o então CEO da PepsiCo, John Sculley, a aceitar o cargo de CEO da Apple. Jobs o fez com um questionamento que se tornou famoso: "quer continuar vendendo água com açúcar para o resto da sua vida? Ou quer vir mudar o mundo comigo?". Sculley aceitou.
A questão é que Jobs não era uma pessoa fácil de se lidar. Era extremamente detalhista e perfeccionista, a ponto de causar constrangimento com seus colegas de trabalho. Esse fato vinha desgastando sua reputação na Apple, incluindo com o conselho administrativo da empresa.
Em 1985, Jobs ainda trabalhava como gerente da divisão Macintosh, comandando o desenvolvimento do computador pessoal com interface gráfica que, apesar de bem-sucedido, não havia impactado significativamente a IBM, sua maior concorrente até então.
Além disso, Jobs tocava dois projetos de computador pessoal simultaneamente dentro da Apple: o Macintosh, que já comentei acima, além do Lisa, outro computador com interface gráfica, mais potente que o Macintosh, muito mais caro e que fez muito menos vendas.
Sculley, agora como CEO da Apple e desapontado, sugeriu tirar de Jobs o cargo de gerente da divisão Macintosh. Insatisfeito, Jobs procurou apoio no conselho administrativo, que preferiu ficar ao lado de Sculley.
A história não é clara sobre a tecnicalidade de Jobs ter sido de fato demitido da Apple após o ocorrido, ou se ele decidiu sair por conta própria. Independentemente disso, o fato é que a nova diretoria da empresa, fundada por Jobs, estava levando a Apple numa direção que ia contra sua visão.
NeXT
Após sua saída da Apple, Steve Jobs fundou uma nova empresa, a NeXT. Ela tinha em seu foco o mesmo trabalho que Jobs fazia na Apple até ser demitido: desenvolvimento de computadores pessoais com interface gráfica. Muita gente desconhece a história do trabalho feito por Jobs na nova empresa, mas é muito provável que a Apple que conhecemos hoje não existiria se não fosse pela NeXT.
Voltando a falar de iPhone, o produto certamente não existiria, ou seria no mínimo muito diferente do que conhecemos hoje, se não fosse o trabalho feito pela empresa de Jobs enquanto estava fora da Apple.
Foi lá que ele e sua equipe desenvolveriam um sistema operacional com fundação Unix (mesma do Linux) e com uma linguagem de programação inovadora, baseada no envio de mensagens entre componentes: a linguagem Objective-C.
Você provavelmente nunca ouviu falar nesse sistema ou nessa linguagem de programação, mas foram essas inovações que eventualmente dariam vida ao MacOS X, que foi a base para a criação do iPhoneOS, hoje conhecido como iOS.
Um computador da NeXT também teve papel histórico na criação da web. Tim Berners-Lee, inventor da World Wide Web (o que conhecemos hoje como "internet"), utilizou um computador NeXTcube da faculdade para criar o primeiro navegador e o primeiro programa de criação de páginas na web.
O mesmo computador, que pode ser visto no Science Museum de Londres, também serviu como servidor para hospedar o primeiro site da história. A página inicial deste site pode ser vista até hoje neste link.
Talvez seja um exagero afirmar que a web como conhecemos hoje não existira se não fosse o trabalho de Jobs na NeXT, afinal Bernees-Lee poderia ter utilizado outro computador para dar vida à sua invenção. Mas a empresa sem dúvida teve um papel importante nos primórdios desta tecnologia que foi tão disruptiva para a humanidade quanto a revolução industrial.
Apple à beira da falência
Enquanto Jobs tocava seus projetos na NeXT, Sculley continuou atuando como CEO da Apple. Foi nessa fase da empresa, no início dos anos 90, que as coisas começaram a degringolar.
No comando de Sculley e sem a visão e direção de Jobs, a empresa começou a perder o foco, lançando produtos em diversas categorias e enfrentando fracassos como o Newton, uma espécie de computador de mão com reconhecimento de escrita. Apesar de ambicioso e à frente do seu tempo, o Newton não entregava o que prometia e foi um fracasso de vendas.
Foi durante o reinado de Sculley que a Apple tomou a decisão de mudar todos os seus computadores para o processador PowerPC, um processo muito custoso. Ao mesmo tempo, os processadores da Intel (utilizados na maioria dos PCs) se tornavam cada vez melhores, mais populares e mais baratos.
Após essas falhas, o conselho demitiu Sculley, que foi substituído por Michael Spindler. A Apple estava passando por sérios problemas financeiros, a ponto de explorar aquisições pela IBM, Philips e Sun.
Já pensou se a Apple tivesse sido comprada por uma empresa como a Philips?
O mundo como conhecemos hoje seria completamente diferente e eu provavelmente não estaria escrevendo este texto para vocês agora.
O retorno à Apple
Spindler foi substituído por Gil Amelio em 1996. No ano seguinte, Amelio resolveu adquirir a NeXT, por US$ 429 milhões, valor que nos dias de hoje chegaria perto dos US$ 800 milhões. Com a aquisição, Steve Jobs voltou a ser parte da Apple.
Insatisfeito em ser apenas um membro integrante da equipe, Jobs fez uma jogada traiçoeira. Em junho do mesmo ano, alguém vendeu 1,5 milhão de ações da Apple de uma só vez, causando uma desvalorização recorde do papel. Jobs usou o fato como argumento para tentar convencer o conselho a nomeá-lo CEO interino e demitir Amelio.
Pouco tempo depois, ele confessou ter sido o responsável por aquela venda de ações. Amelio acabou se demitindo da Apple e Jobs assumiu o cargo de CEO interino.
Jobs começou a mudar as coisas muito rapidamente, simplificando a linha de produtos da Apple e cancelando inúmeros projetos que considerava dispensáveis.
Também fez as pazes com Bill Gates, que anunciou um investimento de US$ 150 milhões na Apple através da Microsoft. O público fanático que assistia ao evento ao vivo não foi muito receptivo e inclusive vaiou o então diretor da Microsoft.
De onde vem o "i" do iPhone?
O mundo veria em 1998 o primeiro produto da segunda era Jobs na Apple. É preciso lembrar que naquela época os computadores eram grandes gabinetes beges, com portas serial, paralela e drive de disquete (para quem nasceu nos anos 2000: um disquete é tipo o ícone de "salvar", só que em 3D).
Trabalhando com o designer Jony Ive, Jobs imaginou o computador como um eletrodoméstico e uma peça de design. Dessa colaboração surgiu o iMac, um computador totalmente integrado, com um design arredondado, plástico translúcido colorido na parte traseira e diversas opções em cores vivas.
Olhando para o iMac original hoje, é evidente que se trata de um produto antigo. Ainda assim, é impossível ignorar a beleza e a atenção aos detalhes no seu design, tanto é que muitos entusiastas da tecnologia e do design buscam comprar esses produtos hoje em dia para utilizá-los como peça de decoração.
Mas o iMac não era só bonito. O produto foi o primeiro computador a remover o drive de disquete, algo que para muitos era impensável na época, mas a Apple estava visando o futuro.
A coragem de abandonar tecnologias ultrapassadas, mesmo que populares, acabaria virando uma característica da empresa.
O primeiro modelo de iMac da Apple também foi o primeiro computador lançado no mercado com um novo tipo de porta para conexão de acessórios, uma tal porta USB, que talvez você já tenha ouvido falar.
Além do design e das inovações tecnológicas, o iMac trouxe algo que se tornaria um ícone da Apple: os produtos e serviços cujos nomes começam com um "i" minúsculo. Alguns deles continuam em uso até hoje: iMac, iPod, iPhone, iPad, iCloud, iWork, iMessage, iOS...
Quando perguntado sobre o significado por trás do "i", Steve Jobs respondeu que ele veio do motivo número um mencionado pelos consumidores para se ter um computador: "internet". O principal foco do iMac era ser um produto que ajudasse o usuário a se conectar na internet de um jeito simples e rápido.
Apesar desse ser o motivo principal, Jobs afirmava que o "i" também carregaria outros significados, como "inspirar", "instruir", "informar" e "individual". Independentemente do significado, o "i" acabou se tornou inseparável da Apple, servindo como um indicador de que determinado produto foi feito pela empresa.
iTunes, iPod e os fones de ouvido brancos
Em 2001, a Apple lançou o iTunes, um software que permitia a reprodução de músicas no Mac com uma interface amigável. Outro recurso importante para a época era a possibilidade de extrair as músicas de CDs para poder escutá-las no computador sem precisar da mídia física.
Mas o real motivo por trás do investimento da empresa neste software ainda estava por vir.
Em outubro do mesmo ano, Steve Jobs apresentou o primeiro iPod. O reprodutor de músicas portátil era capaz de armazenar até mil músicas e tinha uma interface de navegação ágil, graças à click wheel, um controle circular para navegar nos menus.
Talvez mais que o iPod propriamente dito, o acessório que o acompanhava — fones de ouvido brancos — se tornaria icônico. Bastava ver alguém na rua ou no transporte público com aqueles fios brancos saindo de dentro do bolso para saber que ela estava usando um iPod.
Como colocar músicas no iPod? Simples: bastava conectá-lo no Mac e você poderia gerenciar toda a sua biblioteca através do iTunes, transferindo músicas para ouvir no iPod.
Naquela época, a pirataria de músicas estava em alta e as vendas de CDs estavam em baixa. Muitos acreditavam ser impossível competir com a pirataria, já que os usuários adoravam baixar centenas de músicas sem precisar gastar um centavo.
Apesar desse cenário desfavorável, a Apple conseguiu após negociações com gravadoras e distribuidoras criar sua própria loja online de músicas: a iTunes Store. A loja introduziu um modelo revolucionário para a época, que permitia a compra de álbuns completos ou de músicas individuais.
O iPod foi um sucesso e acabou completamente com o mercado de CD players portáteis, como o walkman.
iPhone e App Store
Finalmente, chegamos ao ano de 2007, quando Steve Jobs anunciou o primeiro iPhone.
A história do iPhone poderia ser um livro inteiro, mas resumidamente, a empresa uniu sua experiência em produtos portáteis como notebooks e o próprio iPod, o sistema operacional que na época era usado nos Macs (o Mac OS X) e uma tecnologia nova de touch screen chamada de MultiTouch e com isso criou um smartphone totalmente diferente de qualquer produto que se tinha na época.
Foi essa combinação de iPod, telefone, câmera, navegador de internet avançado, tudo isso num produto compacto com uma tela que para a época era enorme, além da "magia" do multitouch que permitia gestos como pinça para dar zoom nos conteúdos da tela que garantiu o sucesso do iPhone.
O produto foi tão inovador e inesperado que algumas empresas consolidadas de telefones celulares acabaram saindo completamente do mercado alguns anos depois. Todos os smartphones lançados após o iPhone original adotaram um design similar, sem teclado físico e com uma touch screen cobrindo a maior parte da frente do aparelho.
Cerca de um ano depois, a Apple lançou a App Store. Com isso, desenvolvedores do mundo inteiro poderiam vender seus apps para usuários de iPhone, número que crescia rapidamente.
A loja de aplicativos foi uma segunda revolução, que mudou a forma como as pessoas adquirem software e criou um mercado bilionário.
O papel de Steve Jobs
Quando se trata de Apple e Steve Jobs, muito se discute sobre qual papel ele teria desempenhado nas inovações da empresa.
É evidente que Jobs não teria êxito se não estivesse cercado de pessoas muito capazes, mas a quantidade e o nível de inovação que a empresa trouxe durante seu comando foram resultado da sua visão de produto, bom gosto e capacidade de extrair o melhor daqueles que o cercavam.
Infelizmente, não tive a oportunidade de me encontrar com Steve Jobs, mas tive a felicidade de conhecer através do meu trabalho algumas pessoas que trabalharam diretamente com ele.
O que essas pessoas contam sobre como era trabalhar com Steve Jobs está alinhado com os relatos de muitos: ele não era uma pessoa fácil de lidar, mas as pessoas queriam estar perto dele e trabalhar em seus projetos porque ele tinha a capacidade de inspirá-las a fazerem o seu melhor.
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