Twitter x Bolsonaro: quem define o que é verdade na internet?
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Com Donald Trump fora de cena, Jair Bolsonaro entra com folgas na disputa pelo posto de mandatário mais controverso das redes sociais. Nos últimos dias, posts do presidente e de pastas de sua gestão foram confrontados pelo Twitter, que classificou-os como disseminadores de "informação enganosa e potencialmente prejudicial".
Assim como Trump, Bolsonaro usou como ninguém o alcance dessas plataformas quando era candidato e, uma vez no poder, tem esbarrado nas regras de convivência delas. Para além das controvérsias em torno das últimas decisões dessas redes, poucas vezes entra em discussão a inconveniente verdade de que, no fim das contas, são elas que decidem sozinhas o que bilhões de pessoas podem dizer.
Na semana em que Manaus passou a enfrentar uma crise sanitária por falta de oxigênio, que levou doentes de covid-19 morrerem asfixiados, algumas figuras centrais do governo federal foram constrangidas pelo Twitter. Isso rolou devido a:
- Ministério da Saúde e Bolsonaro defenderam que o paciente, já nos primeiros sintomas, peçam o que chamam de "tratamento precoce". Só que...
- ... O tal procedimento consiste em prescrever o "kit covid", formado, entre outros, por hidroxicloroquina ou cloroquina. No entanto...
- ... Estudos apontam que esses remédios não têm eficácia comprovada no combate ao coronavírus. Por isso, o Twitter tascou o aviso de "informação enganosa e potencialmente prejudicial", mas deixou o conteúdo no ar. A partir daí...
- ... Apoiadores do presidente classificaram a atitude como censura. Na reclamação, eles se uniram, ora vejam, a...
- ... Nicolás Maduro, o presidente da Venezuela, que reclamou porque a rede suspendeu perfis de funcionários de seu governo. Ainda detentor de uma conta no Twitter, ele também chiou pela presença da nova Assembleia Nacional do país ter sido bloqueada.
Dado o tamanho que assumiram, as empresas de internet viraram alvo de investigações mundo afora sobre a forma como usam seu domínio de mercado para afastar a concorrência ou diminuir a capacidade de os rivais crescerem.
As análises, no entanto, deixam de lado o poder que essas empresas têm de moldar o debate público, seja por meio das regras que implementam ou por meio dos mecanismos que criam para alavancar ou frear um assunto. É claro que atos ilícitos fora da internet continuam sendo ilícitos nas plataformas dessas empresas. Mas as diretrizes traçadas unilateralmente por elas têm a força de criar um universo paralelo do qual é difícil escapar, mas que não abre brechas para ser alterado.
Sempre que a ação de uma rede social é contestada, surge o papo de que, em um bar, você é obrigado a respeitar as regras do dono. Do contrário, é rua. Okay, mas dificilmente encontramos um botequim com mais de 2 bilhões de pessoas como o Facebook, que, por seu tamanho e a capilaridade de seus apps, como Instagram e WhatsApp, já ganhou status de comunicação oficial.
Aqui e ali, até surgem esforços para questionar esse poder. Em resposta à reprimenda ao post de Bolsonaro, por exemplo, o Ministério Público de Goiás abriu um inquérito para que o Twitter explique "os fundamentos fáticos e jurídicos" de sua decisão.
O autor da ação, o procurador Ailton Benedito, um notório defensor de Bolsonaro, parece, porém, fazer isso menos para contestar se uma rede social deveria ter o poder sobre o que é verdade e mais para manifestar suas afinidades políticas.
Até há iniciativas que indivíduos de fora das redes sociais revisarem as regras delas. Curiosamente, as propostas partem das próprias empresas, como é o caso do Comitê de Supervisão do Facebook. Difícil não concluir que, na internet, até este processo é monopólio das empresas. Afinal, elas formulam a política em vigor, aplicam-na quando querem e até são mantenedoras de ações para alterar a regra do jogo.
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