iPhone 16: as 4 armas da Apple para brilhar na corrida sem líder da IA
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Quem viu o lançamento do iPhone 16 tem razões para acreditar que a Apple chegou atrasada na festa da inteligência artificial nos celulares (o Galaxy S24 Ultra é de janeiro), surrupiou dos concorrentes uma série de funções espertas (transcrever áudio, apagar itens de fotos, criar imagens é algo nativo de vários sistemas) e até admitiu que as ferramentas de terceiros são melhores que as dela (integrado ao sistema, o ChatGPT é da OpenAI, empresa financiada pela Microsoft).
Agora que o brilho da apresentação já passou e muita gente não comentou no X como não mudou nada, dá para ver que a estratégia da Apple possui quatro bons pontos para mostrar que, se há uma festa da IA, ela começa agora. Eles são tão bons que, se floparem, a Apple pode fingir que nunca existiram —quem apostou tudo na IA não pode fazer o mesmo.
Há, porém, um revés. Se ele não for solucionado, vai fazer a dona da maçã pagar micos similares ao que o Google engoliu neste ano —lembra quando a IA criou vikings indígenas ou oficiais nazistas negros? ou quando mandou tascar cola na pizza? E pior: os cinco pontos passam pela China.
O que rolou?
Nesta semana, a Apple lançou quatro versões do iPhone 16. No hardware, mudanças pouco sensacionais (novo processador, disposição diferente para as câmeras, um novo botão/sensor, bateria mais duradoura). Já em matéria de software:
- A nova linha da marca é a primeira criada do zero para rodar recursos de IA. É o...
- ... Apple Intelligence que, encurtado, fica AI, uma jogada de marketing bem Apple da Apple. E...
- ... Ele vai fazer desde tarefas profissionais (editar textos; gravar e transcrever áudios, além de resumir as transcrições) até...
- ... Agilizar funções do celular (garantir integrações espertas entre apps e listar notificações prioritárias e emails mais relevantes), passando por...
- ... Ações que sejam muito pessoais (executar tarefas diárias com base na vida dos usuários e resumir em tópicos o conteúdo de ligações telefônicas). Além disso...
- ... A Siri, primeira assistente pessoal dos smartphones, vai ficar mais sagaz (entederá texto e voz e achará fotos com base na descrição por voz) e integrada ao sistema (dará respostas com base nas experiências de vida registradas pelo usuário no iPhone).
Por que é importante?
1) Integração ao sistema para colar no usuário
O primeiro trunfo da Apple foi criar um ecossistema inteligente que envolve sistema operacional, apps da empresa e de terceiros. Além disso, não há pirotecnia. As funções com IA foram adicionadas ao fluxo de uso de serviços já conhecidos pelas pessoas, como a transcrição de áudio no bloco de notas ou a edição de fotos.
Até para mirar o cotidiano dos usuários, a Apple dá outro passo importante: sua IA vai ser craque em lidar com coisas do contexto pessoal de quem usa seus aparelhos, não uma especialista em generalidades como os sistemas de outras empresas.
2) Siri finalmente mais esperta
Se Apple Intelligence é algo que fica sublimado sob a abreviação genérica da AI, a Siri é um elemento que tem nome e identidade. E a Apple quer que as pessoas lembrem dela. Mais esperta, respondendo por voz e texto e compreendendo a vida do dono do iPhone, a assistente pessoal tem tudo para transformar a forma como as pessoas interagem com o smartphone. Se vingar, você deixará de bater os dedos furiosamente na tela e passará a conversar com o celular quando quiser fazer qualquer coisa.
3) Botão para controlar câmera e trazer parcerias
A Apple inventou um novo botão, o Camera Control, para agilizar a captura de fotos e vídeos. Na lateral direita do iPhone e abaixo do botão liga/desliga, ele abre a câmera, controla zoom e desfoca as imagens.
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Quero receberO lado prático esconde a estratégia: ele é uma porta aberta para a Apple entabular parcerias com quaisquer aplicativos que usem imagens, do Snapchat ao ChatGPT. A própria Apple já prepara um recurso que combinará botão e IA para o iPhone dar informações sobre objetos captados pela câmera. Quando a parceria com a OpenAI sair do papel, algo previsto para o fim do ano, o botão poderá ser acionado para resolver problemas de matemática escritos em uma folha de papel, por exemplo.
4) IA fica no aparelho
Ter um sistema vasculhando suas memórias e as informações mais íntimas para responder um singelo 'quando foi a última vez que minha mãe esteve em casa?' pode parecer um pesadelo da privacidade. Ainda mais porque, em outros sistemas de IA, a requisição seria processada na nuvem da empresa dona do modelo. Mas, no iPhone, consultas simples serão solucionadas internamente. Pedidos complexo até irão para a nuvem, mas para um pedaço privado.
Não é bem assim, mas está quase lá
Nem tudo é brilho. Já de saída, a Apple demonstra quais serão os principais obstáculos. Parte dos poderes do Apple Intelligence chegam em outubro, ainda em beta, e só para os iPhones 15 e 16 —são os únicos aparelhos que a empresa entende terem processamento suficiente para lidar com sua IA.
Ainda assim, será apenas para aparelhos e com Siri configurados em inglês dos EUA. Chinês, francês, japonês e espanhol só no ano que vem. Português do Brasil nem tem previsão.
Eis a primeira parte do problema: a implementação das várias funções de IA dependem da adaptação do sistema não só para a língua, mas para a cultura em que está imerso o dono do iPhone. É quase como se a Apple tivesse que criar um modelo de linguagem que compreendesse a diversidade cultural de cada país. Baita trabalho.
Já a segunda é elaborar parcerias com desenvolvedores de aplicativos relevantes, que topem integrar suas plataformas à IA do iPhone. Aqui entra o fator China, maior mercado do mundo. Fazer o Control Camera funcionar, por exemplo, com o superapp WeChat, central na vida do chinês, seria um golaço. Aliás, desculpe o golpe à auto-estima ocidental, mas boa parte do sucesso depende de todo aparato de IA cair no gosto do consumidor do mercado chinês, onde a Apple vem perdendo espaço para o Android.
Se nada disso funcionar, ainda que seja uma vergonha para a Apple, dificilmente será um desastre completo. O iPhone e o iOS continuarão competentes produtos de tecnologia sem IA. Dura vai ser a vida de quem apostou todas as fichas na tecnologia que até agora não tem se pagado.
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