Atenção, médico, preocupado com o Dr. Google? Espere até ver o Dr. YouTube
"Dr. YouTube, eu amei isso", diz o cardiologista norte-americano Garth Graham, diretor da área de saúde pública do YouTube.
Durante anos, médicos trataram como afronta à sua autoridade a possibilidade de pacientes obterem na internet informações sobre suas condições de saúde —algumas delas fornecidas pelo Dr. Google, é bom dizer, nem sempre eram confiáveis.
De passagem nesta semana pelo Brasil, Graham conversou com a coluna sobre o plano do Google para transformar o YouTube em um disseminador de informação de qualidade sobre saúde e respaldada em ciência. Nessa linha, foram lançadas no país duas iniciativas —uma delas, alias, exigiu alterações na tecnologia da plataforma de vídeos. Após entrarem em operação nos últimos dias, elas fazem do Brasil apenas a terceiro região a recebê-las.
O Brasil tem alguns dos melhores clínicas do mundo, e queremos que a população brasileira tenha acesso a essas informações de forma gratuita e disponível no YouTube, para então aprender. Portanto, também se trata de democratizar a informação sobre saúde para todos
Garth Graham
Membro da Academia Nacional de Medicina dos EUA desde 2020, Graham é professor e ainda atende pacientes. Está no Google há três anos. Ele não esconde que já teve suas questões com o Dr. Google.
Quando eu era muito mais jovem, costumava falar sobre o Dr. Google: 'oh meu Deus, os pacientes estão chegando e não têm olhado todas as informações. O que isso significa?' E você aprende com o tempo que é muito bom pacientes obterem informações e se educarem sobre sua própria saúde. É bom também para você como médico, porque agora tem um paciente engajado nessa conversa
Garth Graham
Nem todo mundo, no entanto, fica tão confortável com a proatividade dentro do consultório. Em artigo publicado em 2018 pelo site do Conselho Federal de Medicina, o médico Alexandre Ruschi, à época presidente da Central Nacional Unimed, disparou:
Alguns pacientes avançam os limites e se julgam aptos a discutir o tratamento para seus males com base em informações genéricas, nem sempre obtidas em páginas com suporte científico. (...) Não adianta reclamar do dr. Google. Temos de nos adaptar aos novos tempos
Alexandre Ruschi
Se antes o Google era o alvo dos queixumes, agora o YouTube quer assumir —ou ao menos dividir— o posto de central de disseminação rápida de informação sobre saúde.
O Brasil já é um grande produtor e consumidor de vídeos focados em saúde. Só em 2023, o YouTube recebeu 1,3 milhões de vídeos sobre saúde. Os conteúdos dessa categoria receberam 4 bilhões de visualizações dos cerca de 120 milhões de usuários brasileiros da plataforma.
Agora, a plataforma mexeu em seus sistemas para evidenciar um tipo específico de vídeo de saúde, aqueles que tratam de primeiros socorros. Quando alguém fizer buscas que remetam a esses cuidados para lá de emergenciais, as produções que possam trazer uma reposta imediata serão exibidas em formato de carrossel logo no topo da pesquisa.
O YouTube vai começar com assuntos como:
- reanimação cardiopulmonar,
- manobra de Heimlich para engasgo,
- sangramento,
- ataque cardíaco,
- AVC ou derrame,
- picada de cobra,
- psicose,
- envenenamento.
"O que queríamos garantir é que, quando procurassem esse tipo urgente de informação, as pessoas obtivessem todas as maneiras relevantes de como reagir, de forma visual, curta e resumida. E isso não tem estado presente no ecossistema da internet em geral", diz Graham.
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Quero receberEsse conteúdo traz um passo-a-passo para situações emergenciais e é produzido por parceiros do YouTube como Ministério da Saúde, Instituto Butantan e hospitais de ponta como o Albert Einstein, Hcor, Sírio Libanês e Oswaldo Cruz.
Ver um vídeo é apenas um ponto de partida. Por isso, haverá alertas sobre a importância de acionar o Samu pelo telefone 192. O YouTube garante ainda que anúncios não estarão nessa área nem no meio dos vídeos.
Antes de catapultar esses conteúdos para os postos mais nobres de sua busca interna, o YouTube fez outro trabalho de ordem tecnológica: rotulou o material que vinha de fontes médicas de confiança, o que exigiu pedir credencias a hospitais, clínicas e médicos que se aventuravam a produzir vídeos.
Ainda assim, há muita boa informação de saúde que vem de provedores de saúde não licenciados. Mas, assim como quando você vai ao médico, você quer saber: 'essa pessoa tem licença? ela sabe o que está fazendo?'. Esse é o ponto ao rotular essa informação. Não é para dissuadir todas as outras pessoas que podem produzir informação de saúde de forma ampla no YouTube
Garth Graham
Segundo o diretor do YouTube, a iniciativa não é necessariamente uma forma de atacar a desinformação sobre práticas de saúde, mas, de certa forma, contribui para combatê-la.
"O que você começa a ver nesse esforço geral são maneiras de preencher o vazio em termos de combater a desinformação e garantir que obtenhamos informações de qualidade."
Graham diz que, para a iniciativa focada em primeiros socorros, os próximos passos são ampliar a quantidade de produtores de conteúdo qualificado de saúde, aumentar a diversidade de vozes e abordar mais temas relacionados à saúde mental.
Além disso, o YouTube também deu início a uma parceria com o Instituto Vita Alere, que irá capacitar durante 6 meses especialistas, instituições e criadores de saúde para produzirem vídeos sobre saúde mental e bem-estar para adolescentes.
Com todo esse esforço, não é descartável o risco de o Dr. Google dar lugar ao Dr. YouTube. Seja junto aos pacientes. Seja nas reclamações de médicos. Quanto a isso, Graham já tem uma resposta.
Para mim, a evolução tem sido fazer os pacientes buscarem informações corretas para se sentirem empoderados. Não para tentar sentir que eu, como médico, devo ter todas as informações e, em seguida, transmiti-las a você. Isso deve ser parte da sua jornada como paciente e com a informação de saúde. Acho que nós, como médicos, precisamos continuar a apreciar e aceitar o fato de um paciente empoderado ser um paciente mais forte
Garth Graham
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