Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Brasil pode ser uma potência verde global. Mas tem um preço: US$ 2 trilhões
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Na história da humanidade, tivemos inúmeras crises, revoluções e transformações que resultaram em mudanças profundas na ordem geopolítica, no modo de vida e na dinâmica econômica das nações. Eventos como guerras, descobertas tecnológicas e a ascensão de novas lideranças produziram, ao mesmo tempo, abundância, desigualdade, devastação, conhecimento e riquezas.
No entanto, por mais profundos e transformadores, esses tantos eventos representaram mudanças para a vida humana; jamais uma ameaça à sua integridade e possibilidade de existência no planeta que chamamos de lar.
Hoje, em pleno século 21, estamos diante da séria possibilidade de que isso possa ser revertido.
A mudança climática, como alertam diversos cientistas, políticos e ativistas em todo o mundo, é uma ameaça existencial e pode representar o fim da vida como a conhecemos.
Não há outro tema que me aflija mais.
É fundamental reconhecermos a verdade de que somos a última geração a conseguir evitar a catástrofe climática iminente.
O nosso futuro e, especialmente, daqueles que ainda sequer nasceram, dependerá de nossa capacidade e vontade de agirmos agora para reverter o legado de destruição humana.
Com esse pano de fundo, na última semana, a Universidade de Columbia realizou o Brazil Climate Summit, em Nova York. Ao todo, 68 palestrantes de diferentes setores —privado, sociedade civil e público— debateram sobre a agenda de mudança climática, com a participação de 550 pessoas do Brasil e de todo o mundo.
Acompanhando a programação do evento, fica evidente a dimensão real do problema: temos menos de uma década para reduzir substancialmente a emissão de gases do efeito estufa para alcançar a meta traçada no Acordo de Paris, de que o aumento da temperatura terrestre não passe de 1,5 graus Celsius —limite máximo para evitar eventos climáticos extremos, como secas, alagamentos, perda de biodiversidade e piora das condições de vida em todo o planeta.
Diante dessa profecia, qualquer outro desafio econômico torna-se coadjuvante. Precisamos combater as causas-raiz do problema, criando condições de transição para as sociedades a partir de um novo modelo de existência no planeta Terra que seja sustentável e justo.
A propósito, ao fazer isso, é fundamental reconhecer que a mudança climática não afeta a todos de maneira igual. Países do sul global, regiões com alta vulnerabilidade socioeconômica e grupos de raça/gênero específicos devem sofrer mais pesadamente os efeitos da crise. Devemos garantir a eles a justiça climática.
Não há como suavizar a mensagem: a crise é grave, existencial e sistêmica.
Precisamos da contribuição de todas as nações, do contrário, todos padecerão.
O Brasil tem apresentado uma contribuição nefasta para esse desafio: nosso país é o 5º maior emissor de gases do efeito estufa mundialmente, fazendo parte das 10 nações responsáveis por 60% de todas as emissões globais.
E ao contrário da tendência global, 70% das emissões brasileiras são oriundas de atividades relacionadas ao AFOLU, ou seja, desmatamento, agricultura e uso predatório do solo.
Mas o desespero não leva à ação. Ao contrário, é preciso reconhecer a nossa contribuição para o desafio e refletir sobre as formas de combatê-lo.
A excelente notícia é que estarmos diante de uma grande oportunidade não pode ser uma desculpa para que não façamos nada. Há tempos questionamos qual a real vocação do Brasil e acredito que estamos prestes a encontrá-la: ser uma potência verde global.
As razões para acreditarmos na vocação verde e global de nosso país são muitas, como bem aponta o relatório "Brazil Climate Report" produzido pelo Boston Consulting Group (BCG), mas podem ser concentradas em três principais pontos:
1. O Brasil é uma liderança global na produção de combustíveis, sendo que 85% de sua matriz é composta por energias renováveis como eólica, solar, hidroelétrica, biomassa e o eficiente etanol —a média global é de, apenas, 26%.
Devemos, portanto, aproveitar esse longo histórico de produção de energia limpa, garantido a exportação do produto em larga escala, além de desenvolvermos novas tecnologias, como o hidrogênio verde.
2. Somos uma potência da agricultura, com uma produção capaz de alimentar 1,6 bilhão de pessoas em todo o mundo —como discuti aqui. A demanda global por alimentos deve crescer 30% até 2050 e, portanto, para sustentá-la será necessário investir em tecnologias de otimização e a garantia de uma cadeia positiva de produção de alimentos a serem consumidos pelos diferentes países, a partir da agricultura regenerativa, como os sistemas agroflorestais.
3. Finalmente, temos um tesouro inestimável chamado Amazônia, a maior floresta tropical do mundo e que abriga a maior biodiversidade do planeta Terra.
É imprescindível manter a floresta de pé, acabando com o desmatamento legal e, principalmente, ilegal, e garantindo um uso sustentável de seus valiosos recursos, naturais e humanos, a partir de inovações baseadas na bioeconomia e nas chamadas Nature-Based Solutions —ações de reflorestamento, restauração e uso sustentável de florestas e agricultura.
Com isso, o Brasil pode se tornar protagonista no chamado mercado de carbono, que tem um potencial de atingir até US$ 1 trilhão até 2028.
As oportunidades são estratégicas, mas só serão alcançadas com investimentos já que, para transformar o Brasil em uma potência verde, global e descarbonizada, serão necessários US$ 2 trilhões nos próximos 30 anos.
Os retornos desse investimento vão além do seu propósito inicial, de garantir a sobrevivência do planeta: uma economia verde pode gerar quase 2 milhões de empregos, um aumento no PIB de R$ 2,8 trilhões, a restauração de 12 milhões de hectares de terra e R$ 742 milhões captados a partir de arrecadação de impostos.
Já há evidências concretas de que uma economia sustentável, também traz retornos financeiros e compensatórios; não há mais espaço, tempo ou evidências para defender o contrário.
Estamos diante do maior desafio da humanidade e, como afirma Greta Thumberg, jovem ativista ambiental, a crise climática já está resolvida; todos os fatos, ferramentas e soluções já estão disponíveis; o que nos falta, ainda, é a escolha de agir.
O Brasil pode ser o grande protagonista desse desafio; estamos diante de uma janela de oportunidade para garantir a sobrevivência de todo o mundo e também construirmos uma nova história para a nossa nação.
Que possamos deixar de ser uma promessa do futuro; que sejamos um país do presente.
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